Luciano Cerqueira*
As próximas eleições presidenciais podem trazer uma novidade ao Brasil: uma presidenta. Dilma ou Marina podem se juntar a Michelle Bachelet (Chile), Angela Merkel (Alemanha), Indira Gandhi (Índia), Helen Sirleaf (Libéria), Cristina Kirchner (Argentina) e outras que comandam, ou comandaram, um país. Contudo, precisamos fazer umas perguntas: será que nossa democracia amadureceu a tal ponto? Será que o Brasil está aberto para mulheres em postos de comando?
Desde de 2004, a rede internacional Social Watch publica o Índice de Igualdade de Gênero (IEG), que avalia a situação da igualdade entre homens e mulheres em mais de 150 países. As categorias avaliadas são: educação (taxa de alfabetização feminina é uma variável), atividade econômica (diferencial entre a renda feminina e masculina) e empoderamento. A taxa de alfabetização feminina, a diferença entre a renda feminina e a masculina, e a quantidade de mulheres que ocupa vagas no Legislativo e Executivo são apenas algumas das variáveis utilizadas para compor o IEG.
No último relatório divulgado (2008), o Brasil ocupa uma posição entre os países de IEG médio. Estamos a frente de Grécia e Itália, mas perdemos para Ruanda e Vietnã. A Suécia ocupa a primeira colocação (www.socialwatch.org).
O IEG põe em evidência que a diferença de renda entre os países não é justificativa para a desigualdade de gênero. Muitas nações pobres alcançaram altos níveis de igualdade (Filipinas e Letônia, por exemplo). E acontece também o oposto, países considerados ricos apresentam baixo IEG (Japão é um caso) e nos mostram que, por trás do desenvolvimento e da riqueza, existe uma brutal desigualdade de gênero.
No Brasil, o Ibase, que integra a rede Social Watch, está iniciando o trabalho de construção de um IEG brasileiro, utilizando a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2006. Embora o trabalho esteja no início, já temos algumas pistas. Já observamos que, apesar de estarmos em um nível médio no IEG mundial, o país oculta uma situação distributiva não uniforme, em que vemos, na maioria das vezes, que as regiões Norte e Nordeste apresentam os piores resultados e os estados do Sul e Sudeste destacam-se nas primeiras colocações.
As primeiras impressões mostram também que, apesar da superioridade das mulheres no âmbito educacional, elas não conseguem eliminar a defasagem em relação aos homens nas dimensões de atividade econômica e, especialmente, de empoderamento. Apesar de serem mais qualificadas, as mulheres possuem os piores indicadores de atividade econômica, um diferencial de quase 25%, ou seja, o rendimento das mulheres corresponde, em média, a 75% do rendimento dos homens.
Para refutar essa afirmação, alguns estudos já mostraram que, em média,
as mulheres trabalham menos horas do que os homens. Aproximadamente 85% dos homens ocupados trabalham 40 horas ou mais por semana. No caso das mulheres, esse percentual cai para 65%. No entanto, aqui vale uma pergunta: quem cuida da casa, dos(as) filhos(as) ou do parente doente? Quem trabalha mais afinal?
Por que que as mulheres não ocupam tantos cargos legislativos, ou por que ocupam poucos cargos de dirigentes em empresas privadas? Essa ainda é uma pregunta sem resposta. Sendo as mulheres mais escolarizadas, a resposta pode ser a forte discriminação que ainda existe no Brasil e no mundo.
As mulheres brasileiras estão prontas para comandar. Sejam empresas, cidades, estados ou países. Se formos capazes de romper as barreiras socioculturais, teremos milhares de Heloísas, Carolinas, Marinas, Fabianas, Vanessas, Joanas, Andreas, Telmas, Lisetes, Martas, Karinas etc no comando. Mas, para isso, precisamos deixar de lado o machismo e o preconceito e reconhecer o valor, a garra, a dedicação, a paixão, a ternura, o espírito de luta de todas as filhas do Brasil.
*Cientista político e colaborador do Ibase.
Publicado em 26/02/2010 no portal do Ibase