Promessa de Dilma, reforma política ainda é amontoado de ideias

Ricardo Galhardo e Nara Alves, iG São Paulo

Até agora, nem mesmo os partidos da base concordam na hora de reestruturar as regras do sistema eleitoral brasileiro

Promessa feita e reiterada pela presidenta Dilma Rousseff, a reforma política é motivo de divergência entre os partidos da própria base aliada do governo. O iG ouviu os líderes das principais bancadas na Câmara e apurou que até agora a reforma – na verdade um conjunto de medidas para aprimorar o sistema eleitoral — não passa de um amontoado de projetos partidários ou pessoais.

Embora Dilma tenha prometido duas vezes priorizar a reforma, na posse e na abertura do ano legislativo, o governo não fez até agora qualquer esforço para articular os partidos da base governista no Congresso. PT e PMDB, principais partidos governistas, discordam nas questões centrais da reforma: voto em lista fechada para o Legislativo e financiamento público exclusivo de campanha.

 

O PT defende o voto em lista fechada, por meio do qual o eleitor vota apenas na legenda, que indica uma lista de candidatos organizada por ordem de preferência para o preenchimento das vagas.

A sigla prega ainda o financiamento público, em que as doações privadas deixam de existir e o poder público arca com os custos do processo eleitoral. Já o PMDB propõe um sistema ape
lidado de “distritão”, em que o modelo de voto majoritário é aplicado na eleição parlamentar. Além disso, a sigla diz que o financiamento público só funcionaria no caso da lista fechada.

A divisão não é privilégio da situação. Enquanto a proposta de reforma do DEM se aproxima da do PT em favor do voto em lista, o PSDB está mais perto do PMDB e defende o “distritão”. Embora o PSDB esteja “imobilizado”, nas palavras do ex-deputado tucano Arnaldo Madeira, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) diz que pretende unir seu partido, o DEM e o PPS em torno de um projeto único para, assim, se cacifar como líder da oposição.

Confusão

A maioria dos partidos não tem proposta fechada sobre os temas centrais, no máximo opiniões pessoais deste ou daquele líder. De acordo com os líderes ouvidos pelo iG, também não existe consenso em temas como a proibição de coligações proporcionais, cláusula de barreira, proibição de parentes ou doadores de campanha como suplentes de senadores, fim da obrigatoriedade do voto, mandato de cinco anos e fim da reeleição.

Não existe acordo nem sobre a forma como a reforma será encaminhada no Congresso. Na terça-feira, o presidente do Senado José Sarney (PMDB-AC) nomeou uma comissão especial para tratar do assunto. Mas a Câmara não quer ficar fora do debate e alguns deputados sugerem a criação de uma comissão mista.

Segundo parlamentares com experiência no assunto, a reforma só vai sair do papel se o governo se empenhar e cobrar união da base aliada. “Se não existir uma ação do Executivo para orientar sua base no Congresso e assumir seu papel não vai ter reforma política”, disse o deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO), relator da comissão especial que elaborou um projeto de reforma rejeitado duas vezes pelo Congresso.

Caiado lembrou que nas duas ocasiões foram partidos da base do governo (PP, PR, PTB e setores do PMDB) os maiores responsáveis pela derrota. “Existe um discurso para dentro e outro para fora”, disse Caiado.

 

Duarte Nogueira
(PSDB)
Rubens Bueno (PPS) ACM Neto (DEM) Paulo Teixeira PT) Henrique Eduardo Alves (PMDB) Linconl Portela (PR) Osmar Júnior 
(PC do B)
Financiamento público exclusivo não não sim sim indefinido não sim
Eleição parlamentar majoritária lista e distrital lista e proporcional sim não não sim
Fidelidade pardiária sim sim sim sim sim sim sim
Proibição de coligações nas proporcionais sim sim sim sim sim não indefinido
Cláusula de barreira sim não sim não sim indefinido não
Proibição de parentes na suplência no Senado sim sim indefinido sim sim sim indefinido
Fim da obrigatoriedade do voto não não não não indefinido sim indefinido
Ampliação do mandato não não sim indefinido indefinido não indefinido
Fim da reeleição não não sim indefinido indefinido indefinido indefinido


Vácuo estratégico

Mas tudo indica que Dilma, embora tenha se comprometido publicamente com a reforma, não está disposta a meter a mão neste vespeiro. O líder do governo na Câmara, Candido Vacarezza (PT-SP), disse na sexta-feira que o governo ainda não tinha uma estratégia. A própria Dilma tem afirmado a interlocutores que a reforma é assunto do Congresso e não do Executivo.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que em agosto passado prometeu se empenhar na reforma política depois que deixasse o governo, também recuou. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o presidente nacional do PT, José Eduardo Dutra, sugeriu que as mudanças só entrem em vigor no longínquo ano de 2018.

Não é de hoje que a reforma tem sido apresentada à população como a cura para os males da política nacional. De Sarney a Lula, todos os presidentes prometeram ou cobraram mudanças profundas no sistema político. Todas tentativas naufragaram.

Estudo realizado pela Câmara Federal mostra que entre 1991 e 2009 foram apresentadas nada menos do que 283 propostas de mudança na legislação eleitoral, entre projetos de lei e alterações constitucionais. A maior parte nunca chegou a ser apreciada e repousa em gavetas e escaninhos do Congresso.

O resultado é um sistema político sem regras definidas, com partidos frágeis, sem representatividade, no qual o poder financeiro vale mais do que os atributos pessoais ou posições ideológicas dos candidatos, o que segundo os próprios políticos acentua a corrupção e a mediocridade.

“O sistema eleitoral brasileiro tem que ter maior racionalidade, fortalecer os partidos, favorecer a governabilidade e reduzir a judicialização”, disse o líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira.

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