Josias de Souza – Folha de S.Paulo
Entidades acusam presidenciáveis de ‘fugir’ do tema. Declaram que Serra, Dilma e Marina ‘lavam as mãos’
Tratado pelos principais candidatos à Presidência a golpes de desconversa, o aborto frequenta a cena eleitoral de 2010 como tema marginal.
As organizações que defendem a legalização do aborto no Brasil decidiram reagir. Divulgaram uma “carta aberta”.
Eis o título: “Sobre o direito ao aborto no Brasil”. O documento é endossado por 67 organizações –ONGs, fóruns, redes e grupos de pesquisa.
Estão articuladas num movimento chamado “Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro”. Veja os nomes das principais entidades lá no rodapé.
A carta menciona os nomes dos três principais candidatos ao Planalto: José Serra (PSDB), Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV).
O texto os qualifica: “Nenhum deles é considerado um candidato ou candidata de ideias retrógradas, de direita, ou atrasado…”
“…Todos os três representam siglas que, distantes do poder, atuaram ativamente na defesa dos direitos humanos, das minorias e das questões de gênero”.
Em seguida, a carta, por assim dizer, desqualifica a trinca: “Nenhum dos três ousa enfrentar o tema aborto quando confrontado, diante de um microfone ou gravador”.
Anota que, inquiridos sobre a matéria, os candidatos “tentam sair pela tangente ou negar seu próprio passado”.
Um passado em que se mostravam a favor do “atendimento humanitário e digno das mulheres que precisaram recorrer a um aborto”.
Ocorrem no Brasil, anualmente, algo como 750 mil abortos em condições inseguras. No texto da carta, as entidades realçam uma das consequências do flagelo.
Anotam que os abortos clandestinos guindaram a curetagem à condição de “procedimento mais realizado pelo SUS”.
Foram “3,1 milhões de internações” na rede hospitalar pública num período de 12 anos –de 1995 a 2007.
Daí a “inquietude” das entidades signatárias da carta. Repudiam o fato de os candidatos permitirem que “líderes religiosos dêem o tom do debate sobre a legalidade do aborto”.
Recordam que, no Brasil, o Estado é “democrático e laico”. Acham que não cabe às igrejas capitanear a discussão.
Atribuem a tarefa às autoridades –as que estão “no poder” e as que se encontram “em disputa pelo poder”.
E lamentam: “Fogem da responsabilidade para a qual foram eleitas (ou tentam ser eleitas) pelo voto…”
“…Lavam as mãos diante da realidade do país, aferida em sucessivas pesquisas e retratada de maneira perversa, até mesmo em telenovela global…”
“…Jogam para debaixo do tapete a dramática estatística do aborto e todas as suas mazelas no país”.
Nos primeiros parágrafos, o documento empilha algumas das “mazelas”. Por exemplo: mortes de mulheres após abortos clandestinos…
…Hemorragias e infecções causadas pelo uso de agulhas, mulheres que recorrem a receitas caseiras e venenos…
…E a “indústria que faz prosperar as clínicas de aborto clandestino, que enriquecem à custa da vergonha, do drama e, muitas vezes, da morte de mulheres”.
– Serviço: Aqui, a íntegra da carta aberta das entidades pró-legalização do aborto.
– Em tempo: Entre as signatárias do texto, reunidas no movimento Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, estão as seguintes ONGs: Católicas pelo Direito de Decidir, CFemea, Comissão de Cidadania e Reprodução, Grupo Curumim, Ipas, Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Sexuais Reprodutivos e União de Mulheres Brasileiras.
fonte: http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2010-07-01_2010-07-31.html#2010_07-30_05_54_49-10045644-27