Nara A. Peruzzo [1]
Eliza está morta! Foi cruelmente assassinada pelo seu amante, segundo inquérito da Delegacia Civil. Infelizmente, essa é a realidade de muitas mulheres em nosso país. Talvez o caso de Eliza tenha se tornado público por seu algoz ser o goleiro do Flamengo, mas existem milhares de elizas espalhadas por aí.
A violência contra a mulher acontece diariamente apesar de não ganhar espaço na grande mídia. Violência dentro da sua casa, na rua, no local de trabalho, na sociedade. Historicamente a mulher tornou-se um estereótipo de propriedade masculina: de submissão, de manipulação. E quando tenta romper com esse círculo de violência é surpreendida por atos cruéis, como espancamento, tentativa de assassinatos e até a morte. Ainda estão muito presente, em nossa cultura, os resquícios do patriarcado. Tanto é que logo no início das investigações do sumiço de Eliza Samudio houve a tentativa de torná-la vilã, descaracterizando-a com divulgação de participação em orgias, fotos “moralmente” não aceitas, comentários como: “tentou dar o golpe da barriga e se deu mal”, “Maria-chuteira”… No entanto, em nenhum momento se falou dos promotores das orgias, não se questionou a participação do Goleiro Bruno na concepção do filho, não se condenou Bruno por ter relações extraconjugais. Para eles permitido, para elas, moralmente inaceitável.
Sem querer adentrar nas possíveis causas dessas relações desiguais, pretendemos questionar a forma como a rede de atenção à mulher vítima de violência se constitui, especificamente no caso de Elisa.
Ora sabemos que Eliza registrou ocorrência na Delegacia sobre agressão sofrida e também por ter sido vítima de tentativa forçada de aborto. No entanto como se investigou essa denúncia? Talvez, se essa denúncia tivesse sido levada a sério como deveria, o assassinato teria sido evitado.
É de conhecimento de todos que no Brasil, desde 2006, existe a Lei Maria da Penha, que cria mecanismos para coibir e prevenir a violência contra a mulher, estabelece medidas de assistência e proteção para elas. A lei ainda deixa claro que os agressores responderão por processo cível e criminal. Outro aspecto importante da lei é a criação dos juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher, com competência cível e criminal. No entanto, nesse caso, como se aplicou a lei Maria da Penha, se é que se aplicou? A justiça foi omissa, deveria ter oferecido proteção à Eliza com base na Lei Maria da Penha. Ao mesmo tempo em que a lei é um grande avanço na luta contra a violência à mulher, o caso de Eliza nos mostra o quanto a rede de atendimento à mulher vítima de violência precisa ser qualificada e aperfeiçoada. Como uma mulher fará a denúncia, se muitos agentes públicos que as atendem subestimam aquilo que elas falam, interpretam o caso como mais uma briga conjugal, desqualificando a vítima?
Temos muito ainda a avançar na realização dos direitos das mulheres. Muitos pré-conceitos a superar. Mas para isso é preciso também que o estado cumpra com o seu papel, propondo políticas publicas afirmativas e inclusivas objetivando reparar os prejuízos historicamente sofridos pelas mulheres.
[1] Bacharel em filosofia e secretária no Centro de Educação e Assessoramento Popular – CEAP