Jovem que ficou sequestrada por 8 anos vai destruir parte da casa que serviu de cativeiro

Fantástico

Natascha Kampusch conta em livro os momentos de terror que viveu em poder de Wolfgang Priklopil, um homem que a matinha presa dentro de um porão de uma casa na Áustria.

Mais de oito anos, mais de 3 mil dias em cativeiro. Chega ao Brasil o livro escrito pela austríaca Natascha Kampusch – que foi sequestrada aos dez anos de idade. Natascha conversou com o repórter Pedro Bassan e revelou o que vai fazer com a casa que serviu de cativeiro. 

Strasshof é um lugar sem cara e nem coração. Uma cidade dormitório no subúrbio de Viena. Os moradores passam o dia longe de casa e os vizinhos não se conhecem. 

Uma casa como outra qualquer. Os entregadores iam, apertavam a campainha, os correios deixavam as cartas normalmente. Até a polícia esteve lá e nunca desconfiou de nada. No térreo e no primeiro andar, vivia um homem solitário. No porão, ele mantinha uma escrava que era espancada, torturada física e mentalmente. Em uma cela de concreto, Natascha Kampusch resistiu por 3.096 dias. 

Aos 22 anos, só a beleza se destaca em um rosto que não traz marcas do sofrimento. Mas as cicatrizes do cativeiro são reveladas num livro que Natascha só teve forças para escrever agora, quatro anos depois de ter conseguido fugir. 

Natascha era prisioneira de Wolfgang Priklopil: um desequilibrado que castigava sua vítima diariamente. 

Trecho do livro: “23 de agosto de 2005: pelo menos 60 tapas no rosto. De 10 a 15 socos na cabeça que me deixaram com náusea”. 

A Áustria se comoveu com a história desde o desaparecimento da menina, em 1998. Quando completou 10 anos de idade, Natascha estava muito feliz. Ela tinha conquistado o direito de ir sozinha para a escola. Não parecia haver perigo: uma caminhada de uns 15 minutos por ruas tranquilas. Mas, no primeiro dia em que fazia esse trajeto, o caminho de Natascha foi interrompido. Ela foi abordada por um estranho e jogada dentro de uma van. 

A polícia cometeu erros na investigação. Chegou a suspeitar do homem certo, visitou a casa, mas não encontrou o cativeiro. Ficava embaixo da garagem, fechado por uma porta de concreto de 150 quilos. Um espaço de 5 metros quadrados sem luz natural com um vaso sanitário e uma pia, onde Natascha tomava banho. 

Ela diz que não sofreu violência sexual, mas muitas vezes era obrigada a dormir algemada, abraçada ao sequestrador. Limpava e ajudava a reformar a casa, semi-nua, e quase sem ter o que comer. 

Trecho do livro: “Cheguei a pesar 38 quilos, quando eu tinha 16 anos e 1,75 m de altura”. 

Com o tempo, o sequestrador permitiu que a menina ajudasse a cuidar do jardim, um lugar cercado e protegido dos olhares curiosos. Ela aproveitou a oportunidade. 

A casa está abandonada desde 23 de agosto de 2006. Naquele dia, depois de oito anos e meio, o sequestrador se distraiu pela primeira vez e Natascha escapou pela rua. 

No primeiro contato com o mundo exterior, um novo choque: 

Trecho do livro: “Avistei uma senhora através de uma janela aberta em uma das casas. ‘Chame a polícia, fui sequestrada. Meu nome é Natascha Kampusch’. 
A mulher respondeu: ‘por que você veio justamente na minha casa? Espere na cerca viva e não pise no gramado!’” 

Desde então, Natascha percebeu que não seria fácil viver do lado de fora. É natural que ela desconfie de estranhos. E o repórter é um deles. No primeiro contato, simpatia sim, mas coberta por camadas de formalidade. 

Ela coloca o microfone e quando volta pede para diminuir a luz, que incomoda. Caprichos de uma estrela? Claro que não. Manter a luz acesa nos olhos de Natascha era uma das formas de castigo que o sequestrador usava. E o aviso de mantenha distância também vale para as palavras. Aos 22 anos, ela pede para ser chamada de senhora. 

Repórter: O afeto ainda tem espaço na vida da senhora? 

Natascha: É muito difícil, porque a maior parte das pessoas não sabe como me tratar. Elas têm medo de me machucar, não me entendem. Eu também preciso trabalhar em cima disso, aceitar mais as outras pessoas. 

Mesmo em liberdade, ela não encontrou a vida que levava antes. Se dá bem com a mãe, mas há dois anos não fala com o pai. Mora sozinha em um apartamento, em Viena, e ganhou na Justiça a casa em que ficou presa. Ela diz que tomou essa decisão para evitar que o lugar se transformasse em um museu macabro. 

Natascha: A cela subterrânea vai ser fechada com terra. Em relação ao resto, ainda não sei o que farei. Certamente não voltarei a morar lá. 

Wolfang se matou no dia em que Natascha fugiu. A polícia diz que ela chorou muito ao saber da morte do sequestrador. 

Natascha: Só ao escrever o livro me dei conta de como era horrível e absurda a situação em que ele me colocou. Hoje tenho uma imagem pior do sequestrador do que no dia em que fugi. 

A entrevista chega ao fim em um sorriso. Nessa hora, nós lembramos que a senhora Kampusch foi uma menina que em um dia qualquer perdeu a infância de repente. E tão de repente ela reaparece. Em um simples autógrafo em forma de flor.

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