STJ de homens contra Lei Maria da Penha

STJ_visto_do_TST_02Edélcio Vigna, assessor político do Inesc

A Sexta Turma do STJ decide que processos que julgam violadores de direitos de mulherese podem ser suspensos por habeas corpus por um período de dois a quatro anos e a punibilidade pode ser extinta após esse período, caso o agressor não reincida em nenhuma outra falta. Assessor do INESC expõe sua opinião, em artigo, sobre o assunto.

A divulgação por parte do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que os indiciados na Lei Maria da Penha podem ter seus processos suspensos indignou as organizações defensoras dos direitos humanos, em especial aquelas que advogam contra a desigualdade de gênero nas diversas instâncias do Estado.

O STJ é composto de 30 magistrados/as ativos/as, sendo 29 brancos/as e um negro. Dentre os 30 juízes, há somente cinco mulheres brancas e nenhuma negra. Dessa forma, 83,3% do STJ é formado por homens. A desigualdade de gênero, raça e etnia nos mostra como a composição das instituições do Estado estão descoladas da representação social. Esta desigualdade ocorre, igualmente, no Legislativo e no Executivo.

Quando vulgarmente se diz que o Estado é o retrato da sociedade incorre-se não somente em um equívoco, mas contribui para mascarar o problema da desigualdade de representação que impacta na definição dos destinos nacionais. Fica evidente que somente a elite branca masculina é que incide de fato na formação da nação brasileira. Também fica exposto que o conceito de democracia racial, a nação pluriétnica e multirracial é uma construção ideológica que oculta a dominação de alguns setores da elite sobre todos os demais.

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Por isso, os processos que julgam violadores de direitos e agressores de mulheres podem ser suspensos por habeas corpus por um período de dois a quatro anos e a punibilidade pode ser extinta após esse período, caso não reincida em nenhuma outra falta. O habeas corpus é concedido quando alguém sofre ou se acha ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. A razão nos indica que um violador de direitos, que os fatos têm demonstrado que quando não é coibido resulta em morte da mulher, não tem o direito de recorrer a um instrumento que salvaguarda a dignidade cidadã.

Respeitamos o voto do relator Celso Limongi o qual defendeu que a Lei Maria da Penha não tem poder de suprimir todas as normas previstas na Lei dos Juizados Especiais, mas, não podemos deixar de contrariá-lo ao entender que a vida tem prevalência sobre qualquer direito que a coloque em risco. A violência contra as mulheres não é uma questão de patamar hierárquico entre as leis, mas um problema cultural que deve ser reprimido na sua origem.

Entendemos que a Lei Maria da Penha veio regulamentar o § 8º do art. 226, da Constituição Federal, que prescreve que “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. Neste sentido, a suspensão condicional não tem nenhum caráter pedagógico, como defendeu o relator, entretanto, sinaliza uma flexibilização perigosa à medida que uma vida estará em perigo constante enquanto o agressor não estiver detido.

Este tipo de disputa jurídica entre as diversas correntes de pensamento poderia não ocorrer caso a composição do STJ tivesse uma maior representação feminina. É necessário que o Estado comece a se preocupar em criar mecanismos que possam recepcionar em suas instituições os diversos setores sociais a fim de que a sociedade se identifique com os órgãos dos quais dependem suas vidas.

fonte: INESC

 

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Para STJ, processos envolvendo Lei Maria da Penha podem ser suspensos


Publicação: 21/01/2011 20:51 

Radioagência NP

Os processos envolvendo a Lei Maria da Penha poderão ser suspensos condicionalmente, em período de quatro anos, conforme determinação da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo a Corte, a suspensão do processo dependerá do comportamento do réu e da reparação dos danos causados, quando possível.

A mudança na interpretação da lei pelo STJ ocorreu em dezembro de 2010, mas só foi divulgada nesta semana. A Corte entendeu que a Lei Maria da Penha é compatível com a Lei de Juizados Especiais, que permite a suspensão de pena nos casos em que a condenação for de um período inferior a um ano.

Segundo o relator, Celso Limongi, a medida tem caráter pedagógico para o agressor, pois o processo pode voltar a correr em caso de reincidência. Em entrevista à Radioagência Nacional, a farmacêutica Maria da Penha, que empresta seu nome à Lei 11.340/06, discorda do desembargador. Ela ficou paralítica depois de sofrer inúmeras agressões e duas tentativas de homicídio por parte do marido.

“A cultura da nossa sociedade, infelizmente é muito machista e ainda vai me surpreender muito em relação à aplicabilidade da lei Maria da Penha. No momento em que um juiz, um desembargador, uma autoridade passa a mão na cabeça de um agressor, ele não conhece a realidade do que é a violência doméstica no país. Saiu uma pesquisa revelando que no país cerca de dez mulheres morrem diariamente em decorrência da violência doméstica”.

Dados da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República apontam que o serviço de atendimento às vítimas recebeu mais de 340 mil denúncias de violência doméstica de janeiro a julho de 2010.

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