Alteração na forma ou função de hormônios podem causar diversos problemas

Carolina Vicentin – Correio Braziliense

Eles têm o tamanho de moléculas, mas são capazes de derrubar um adulto. Não, não se trata de bactérias ou vírus, mas de estruturas muito menores que regulam o funcionamento do corpo. Os hormônios são a gasolina do organismo, responsáveis por coisas tão diversas como a vontade de sair da cama de manhã e a produção do leite materno. O menor desequilíbrio na produção dessas substâncias provoca sintomas desconfortáveis, como queda de cabelo, ganho de peso, fraqueza e irritação. E o pior, o sistema endócrino, como é chamado, é todo interligado — qualquer problema em uma das partes pode afetar o funcionamento das outras.

Tudo começa no cérebro. É de lá que surgem as primeiras instruções para a liberação dos hormônios. O hipotálamo é uma espécie de gerente da rede, comunica-se com o sistema nervoso e avisa para os produtores de hormônios qual é a quantidade necessária para garantir o funcionamento da “fábrica”. “O hipotálamo é o centro regulador que cuida do equilíbrio do corpo. Ele capta informações dos órgãos e do ambiente externo para orientar toda a atividade metabólica da pessoa”, explica o endocrinologista Neuton Dornelas Gomes, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia no Distrito Federal.

É graças ao trabalho do hipotálamo que as pessoas ficam com frio na barriga ao andar de montanha-russa, por exemplo. O sistema nervoso processa o estímulo externo, comunica-se com o hipotálamo, que, por sua vez, incentiva a produção de um hormônio relacionado a essa sensação de prazer e euforia, a adrenalina. Processo semelhante ocorre quando o indivíduo come. Para quebrar a glicose dos alimentos, o pâncreas libera a insulina, um hormônio tão essencial que a falha na sua produção provoca o diabetes.

 

Depois que os cabelos de Roberta começaram a cair, ela descobriu ter hipotireoidismo (Bruno Peres/CB/D.A Press )  
Depois que os cabelos de Roberta começaram a cair, ela descobriu ter hipotireoidismo

Grosso modo, problemas hormonais podem ocorrer por dois motivos: alteração na forma ou na função das glândulas endócrinas (veja arte). Na hipófise, por exemplo, surge o hormônio do crescimento. Se, por algum motivo, a glândula não fizer o dever de casa, o adolescente cresce menos do que o normal. Outra possibilidade é a hipófise liberar muito hormônio do crescimento, o que provoca o gigantismo. “Em alguns casos, a disfunção nessa glândula é provocada pelo aparecimento de nódulos ou tumores. A pessoa, então, pode desenvolver a acromegalia, que é o crescimento exagerado das extremidades do corpo”, detalha o médico Neuton Dornelas.

 

O gerente comercial Kennedy Siqueira, 47 anos, convive há três com um disfunção na hipófise. “Comecei a sentir caroços na região da mama e a engordar rapidamente em algumas partes do corpo, como o púbis”, conta. Os exames mostraram que Kennedy estava com uma microlesão nessa glândula, o que causou a liberação excessiva de prolactina. Nas mulheres, esse hormônio estimula o aparecimento do leite materno, mas homens também o possuem em menor quantidade. O problema acabou afetando outras glândulas do sistema endócrino de Kennedy. Hoje, ele faz reposição hormonal a cada 21 dias. “É uma coisa meio constrangedora, porque esse remédio é um anabolizante que regula os níveis de testosterona no meu organismo. Toda vez que eu troco de farmácia, as pessoas me olham desconfiadas”, conta.

Kennedy também se queixa dos efeitos colaterais da medicação. “Nos primeiros cinco dias após a aplicação, o corpo fica mais aquecido do que o normal, eu me sinto inchado”, enumera. Além disso, o gerente não conseguiu reverter o ganho de peso que teve até descobrir a doença. A reclamação também é compartilhada pela projetista Patrícia Santiago, 35 anos. Há quase dois anos, o médico encontrou um tumor benigno de 2,5cm próximo à hipófise de Patrícia. “Eu estava pesando 120kg, vivia com dores de cabeça, estressada”, lembra. Assim como Kennedy, ela teve a produção de prolactina acentuada e, com isso, produziu leite mesmo sem estar grávida. Com o tratamento, a projetista perdeu 24kg e a expectativa é que o tumor diminua muito nos próximos três anos.

As disfunções também podem aparecer em outras glândulas. Nas gônadas — ovários nas mulheres e testículos nos homens — surgem os problemas de infertilidade, caso a produção de hormônios não esteja equilibrada conforme o sexo da pessoa. Nas suprarrenais, há a liberação do cortisol (que regula a resposta ao estresse, por exemplo) e de substâncias que controlam o nível de sais e potássio. Para se ter uma ideia de como o sistema é delicado, uma pessoa pode desenvolver hipertensão por conta de um problema hormonal. 

Problema feminino

Há uma glândula, porém, que costuma ser a principal “culpada” das visitas aos consultórios. A tireoide — que fica no pescoço e tem formato de borboleta — participa do metabolismo do corpo inteiro. “Todos os órgãos precisam dos hormônios liberados pela tireoide. É ela que dá condições ideais de crescimento aos fios de cabelo”, exemplifica Neuton. O funcionamento da glândula também interfere no ganho de peso, na textura da pele, na pressão arterial, na resistência das unhas, no ciclo menstrual das mulheres e por aí vai.

Elas são, inclusive, as mais afetadas pelas disfunções da tireoide. “Os problemas nessa glândula são de 10 a 12 vezes mais comuns na população feminina. Além disso, como as doenças são autoimunes, o fator genético é muito preponderante”, afirma o médico Mário Sérgio Almeida, chefe do setor de endocrinologia do Hospital de Base. Foi isso que levou a gerente de eventos Roberta Viana, 28 anos, a procurar um especialista. “Quando eu tinha 18 anos, meu cabelo começou a enfraquecer e cair. Também tinha uma indisposição enorme, muita preguiça”, lembra Roberta, que recebeu o diagnóstico de hipotireoidismo, assim como aconteceu com sua mãe, tias e avó.

O hipotireoidismo ocorre quando a glândula produz pouca quantidade de hormônios (veja quadro). “A doença faz a pessoa inchar, reter líquidos, ter queda de cabelo”, destaca Mário Sérgio. O endocrinologista ressalta, porém, que muita gente credita todos os quilos a mais na balança à disfunção. “Uma vez que a pessoa está sendo tratada, ela pode perder o peso que ganhou”, diz. No caso de Roberta, o problema estava bastante grave na época do diagnóstico e piorou com o tempo. “Eu comecei tomando um comprimido de 25mm por dia. Hoje, a dose já é de 150mm”, conta. “Mas nunca deixei de fazer nada por causa da doença, embora meu cabelo não tenha voltado a ser o mesmo, forte e brilhante.”

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