Revista Época
Mulheres pelo Mundo é Renata Neder, 30 anos, que trabalha para a ONG internacional Action Aid – de suas viagens a trabalho para outros países, ela sempre nos traz observações e descobertas pessoais.
Renata Neder
“Com o meu pai nunca tive problemas. Ele morreu cedo, morto no conflito armado no país. Ficamos só minha mãe, eu e minhas oito irmãs. Mas com meu compaheiro de vida, ah… com esse sim eu sofri. Ele sim me batia. E na época eu ainda não tinha me deselvolvido bem, não tinha aprendido nada, não sabia de muitas coisas… tive que aguentar. Ele me bateu várias vezes.”
Marta Lidia Campos é de El Salvador, na América Central, é trabalhadora rural e tem dois filhos, um menino e uma menina. Conheci a Marta em 2007, quando ela me deu um longo depoimento sobre sua história de vida. De lá pra cá, conheci muitas mulheres de diferentes países que sofrem diversas formas de violência. Nesses anos, aprendi que a violência contra a mulher não é uma exceção, um caso isolado. É um problema global, que ultrapassa fronteiras.
O dia 25 de novembro foi o Dia Internacional de Combate à Violência Contra a Mulher. Embora eu tivesse pensado em fazer o post deste sábado sobre um outro tema, mais leve, diante da data achei que deveria falar disso mesmo. Ainda mais já tendo ouvido tantos relatos e histórias de mulheres vítimas de violência em países tão diferentes.
Uma em cada três mulheres será estuprada, violentada ou espancada em algum momento da sua vida. 1 em cada 3. Algo em torno de 2 milhões de meninas entre 5 e 15 anos são “traficadas”, vendidas ou coagidas a se prostituir. Os dados chocam, não é?
Nos últimos anos, na África de Sul, uma nova onda de violência e preconceito emerge com casos sucessivos de “estupros corretivos”. Homens estupram mulheres gays com o objetivo de corrigir sua homossexualidade. Uma dupla violência, contra a integridade física da mulher e também contra sua opção sexual.
“Eles me ameaçam, dizendo que vão me estuprar e que depois que eles me violentarem eu vou me tornar uma mulher, que eu vou me tornar uma mulher hetero” diz Z. de 23 anos. O medo de Z. é real. Em 2007, duas mulheres foram violentadas, espancandas e mortas por serem lésbicas. Até hoje, ninguém foi punido.
Na Índia, a discriminação e a violência começam em uma fase bem precoce da vida da mulher: quando ela ainda é feto, na barriga da mãe, ou ainda recém-nascida. Filhas mulheres estão desaparecendo no país. A preferência por filhos homens é tão forte que as filhas mulheres muitas vezes são simplesmente descartadas. Quando não havia a possibilidade de descobrir o sexo do neném antes do nascimento, muitas eram abandonadas ao nascer. Agora, com tecnologia de ultrassom, a gravidez é interrompida. O problema é tão grave que já está gerando discrepâncias demográficas em algumas províncias do país e levou o governo a restringir a realização de exames que identificam o sexo do bebê.
R., de 25 anos, já tinha uma filha e ficou grávida novamente. Ao descobrir que era mais uma menina, ela fez um aborto. Por mais contraditório que pareça, ela mesma não queria ter filhas mulheres. “As mulheres sofrem violência em toda as esferas da vida. Sabendo o tipo de assédio e preconceito que minha filha sofreria depois de nascer, eu acho que é melhor não nascer”.
El Salvador, África do Sul e India. Três países, três continentes, uma realidade: discriminação e violência contra a mulher. Uma realidade que ultrapassa fronteiras, classes sociais, identidades culturais. Uma realidade global.
Que tal fazermos a nossa parte para mudar essa realidade pelo menos falando sobre o assunto, discutindo, debatendo e, acima de tudo dizendo NÃO para todas as formas de violência contra a mulher?