Mais diálogo social para despenalizar a prostituição

Por Dennis Engbarth, da IPS

Taipei, Taiwan, 24/11/2010 – A intenção do governo de Taiwan de despenalizar parte do comércio sexual gerou profunda divisão social entre os que são a favor da legalização da atividade e os que temem que a iniciativa favoreça o tráfico de pessoas e a prostituição infantil. Após anos de debate, o Tribunal Constitucional declarou, no dia 6, a inconstitucionalidade de um artigo da Lei de Manutenção da Ordem Social que pune quem vende favores sexuais, mas não o comprador.

Ao considerar que a lei viola o princípio de que “todos os cidadãos são iguais perante a lei”, o Tribunal pediu que fosse eliminada ou reformada antes do dia 6 de novembro de 2011. O governo do Partido Nacionalista, Kuomintang (KMT), está obrigado a, pelo menos, resolver o espinhoso assunto da despenalização do comércio sexual. Em Taiwan existem mais de 80 mil prostitutas e centenas de milhares de empregos vinculados ao setor, segundo ativistas.

O ministro do Interior, Jiang Yi-huah, anunciou em 13 de outubro que organismos do Estado e especialistas concordaram, em duas audiências públicas e em dois seminários a portas fechadas, com a “eliminação do castigo” para as transações sexuais consensuais entre adultos, e que “não seria apropriado comercializar ou converter a atividade em uma indústria”.

Quase todo mundo esteve contra a restrição ao comércio sexual a “áreas exclusivas”, mas preferiram que os governos locais o regulassem em zonas que “não afetem o desenvolvimento infantil e de menores de idade”, afirmou Jiang. É possível que seja permitido às trabalhadoras sexuais operar “em cooperativas de três a cinco pessoas”, afirmou. A maioria pensa que criar “empresas” do sexo seria “inapropriado”, acrescentou.

O Ministério fará um estudo sobre suas propostas e organizará outro seminário entre órgãos do Estado e especialistas para negociar um pacote normativo, que será apresentado à comissão assessora do governo em matéria de direitos humanos no final deste ano, disse Jiang. O governo prevê mandar ao parlamento as emendas à lei no começo de 2011.

O KMT tem dois terços da assembleia nacional, mas não está assegurada a aprovação da reforma devido às profundas divisões entre legisladores e organizações que defendem os direitos das mulheres. A Aliança contra a Exploração das Mulheres, integrada por 14 organizações defensoras dos direitos de meninos, meninas e mulheres, condenou os planos do Ministério do Interior em uma declaração divulgada no mês passado.

A Aliança disse que a proposta inicial do Ministério não atendeu o pedido do Tribunal Constitucional para que as agências governamentais “usem a formação profissional, orientação sobre possibilidades de emprego e outras medidas educativas para melhorar as capacidades e a situação econômica das trabalhadoras sexuais para que não tenham que recorrer a essa atividade para sobreviver”. Sem um consenso claro, “o governo não deve se apressar em definir uma política até o final deste ano”, disse uma porta-voz da organização.

Com a despenalização, será mais difícil impedir a prostituição de menores e o tráfico de pessoas, disse à IPS Ingrid Liao Pi-jing, representante para Ásia Pacífico da ECPAT Internacional (End Child Prostitution Child Pornography and Trafficking of Children for Sexual Purposes). A ECPAT é uma organização dedicada à luta contra a exploração sexual comercial de crianças e adolescentes. “Como farão as autoridades para determinar se uma transação é realmente consensual ou se a trabalhadora sexual é menor de idade?”, questionou.

O primeiro-ministro, Wu Den-yih, garantiu que o governo não pretende “desenvolver o comércio sexual como uma atividade normal”. Seria melhor “um mundo sem prostituição”, acrescentou, mas “o governo deve enfrentar a realidade de forma pragmática”, disse. As pessoas contrárias à despenalização consideram que a proposta do governo é muito radical e quem defende os direitos das trabalhadoras dizem que é muito acomodatícia. A sociedade de Taiwan deve regular o comércio sexual, em lugar de reprimi-lo, disse Chung Chun-chu, secretário-geral do Coletivo de Trabalhadores Sexuais e Partidários.

“Esperamos que as transações sexuais sejam despenalizadas totalmente e que a atividade se converta em uma ocupação normal, mas na primeira fase é preciso se concentrar em como devolver o poder às trabalhadoras sexuais”, disse Chung. As prostituas não podem buscar clientes porque é ilegal. “A maioria não tem saída a não ser depender de terceiros para isso e para que as proteja da polícia”, explicou.

“Apenas 10% das prostitutas trabalham sozinhas, sejam garotas de programa de alta classe ou trabalhando nas ruas”, disse Chung. Se pudessem formar pequenas cooperativas seriam capazes de se proteger de “maus” clientes e de “reverter a relação de poder e contratar seus próprios motoristas e seguranças”.

“As modificações na Lei de Manutenção da Ordem Social apenas afetarão as transações sexuais consentidas”, disse à IPS a presidente da Awakening Foundation, Yang Wan-ying. “Continuam proibidas as relações não consentidas, com menores e a prostituição infantil, bem com o tráfico de pessoas, que devem ser punidos firmemente”, disse Yang. Os partidários da despenalização e os opositores concordam que é preciso maior consenso.

“O Ministério do Interior basicamente fixou sua política”, disse Chung. “Muita gente tem preocupações concretas e duas audiências públicas e dois seminários fechados não são suficiente diálogo social”, acrescentou. “É preciso uma discussão pública aberta sobre o assunto e suas alternativas”, disse, por sua vez, o legislador do opositor Partido Democrático Progressista Yeh Yi-chin, que em princípio está a favor de despenalizar a prostituição. Envolverde/IPS

(IPS/Envolverde)

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