"Se os homens engravidassem, o aborto seria um sacramento…"

Por Juliete Oliveira, do Blog In-di-gestão pública

francesca

“Se os homens engravidassem, o aborto seria um sacramento…”(Florynce Kennedy, advogada e feminista americana, revista Ms., Março 1973).

Ao ser questionada por um amigo português sobre as eleições no Brasil, no primeiro dia após o primeiro turno, disse-lhe que a minha candidata infelizmente não conseguiu votos suficientes que a levassem ao segundo turno, ele por sua vez, perguntou-me qual era, pois, a minha opção para o segundo turno. Respondi que a outra candidata que permanecia na disputa, por duas razões: primeiro por ser mulher e segundo, por ser a continuidade do governo atual. Ele se disse surpreso, por eu tão naturalmente verbalizar isso. Disse-me que em Portugal a questão da violência contra a mulher é uma rotina, é colocada como algo aceito e pouco ou quase nada discutido.

Temos no Brasil uma equivalência entre homens e mulheres, e em alguns casos uma superioridade de números em relação à mulher: já temos hoje, um número maior para elas nas universidades, no ensino médio, a ocupar algumas áreas do mercado de trabalho como é o caso da educação, e ainda, em alguns estados e municípios o número de eleitores dividido por gênero, o maior é para o sexo feminino.

Em compensação, ou melhor, operando na contramão temos: Em dez anos, dez mulheres foram assassinadas por dia no Brasil, média que fica acima do padrão internacional. A motivação geralmente é passional. Estes são alguns dos resultados do estudo intitulado Mapa da Violência no Brasil 2010, realizado pelo Instituto Sangari, com base no banco de dados do Sistema Único de Saúde (DataSUS).

Esses não são os únicos números a ilustrar o mapa da barbárie no Brasil. Há ainda uma considerável perda de vidas femininas por razões outras, como é o caso do aborto, que virou a vedete das campanhas eleitorais, tanto da situação, quanto da oposição. Ora vejamos uma questão que diz respeito unicamente à mulher e o seu corpo é colocada na berlinda como algo responsável por decidir a vida da nação. O que está implicado nisto são as condições dada à mulher para que ela tome essa decisão, cabe à gestão pública garantir condições a ela para que no caso de decidir por levar a gravidez ou não à diante, o faça com segurança.

Até que ponto é possível se fazer uma leitura de seriedade diante destes fatos? Os nobres candidatados perdem uma oportunidade impar de mostrar inteligência, conhecimento e de se solidificar como alguém sério e realmente comprometido com a gestão pública, entornam o caldo ao se envolverem com questões religiosas e de cunho machista, nesse caso nenhum dos dois estão defendendo as mulheres, não estão pensando em nenhum momento na segurança e bem estar do grupo, estão apenas se aliando ao que existe de mais atrasado e preconceituoso nesse país.

Luta-se hoje pelas mulheres no poder político, nos lugares de tomada de decisão por ser necessário usufruir de poder para mudar o que está em desequilíbrio, ou tão só porque as mulheres existem e têm o direito de lá estar. Com os homens, em paridade. A democracia paritária parte desta assunção. Quem aí viu algum dos candidatos lembrarem os números da violência contra a mulher? Ou ainda recordar, mesmo que a título de lembrança que estamos completando um século de luta pelos direitos femininos?

“Eu tô grávida / Grávida de um beija-flor / Grávida de terra / De um liquidificador / E vou parir / Um terremoto, uma bomba, uma cor / Uma locomotiva a vapor / Um corredor… “ (Analdo Antunes).

*Para conhecer o blog in-di-gestão pública acesse http://www.in-di-gestao.blogspot.com/.

FOTO
Crédito:
Francesca Woodman

(Envolverde/In-di-gestão pública)

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