Religião define eleição no Brasil e acaba com Estado Laico

Ivonio Barros
Nas eleições de 2010 o fator que mais interferiu no debate político foi a religião. Especialmente uma vertente conservadora e fundamentalista presente nas correntes carismática da igreja católica e neopentecostal da igrejas evangélicas que mais crescem no Brasil.

 

Em meio a um terreno infértil de uma campanha sem debate políticos, germinou a semente do fundamentalismo religioso. Moral, comportamento e crenças manifestaram-se constantemente, fazendo com que candidatos comunistas passassem a freqüentar cultos e missas e se manifestassem devotos de alguma manifestação de Maria. Quase tod@s @s candidat@s apareceram na mídia freqüentando igrejas e realizando reuniões ruidosas com líderes religiosos conservadores. Nenhuma liderança religiosa progressista foi permitida (pelos marketeiros) aparecer com candidat@s.

Essa é a segunda característica forte dessas eleições: o domínio total dos marketeiros e da imagem fabricada. Os eleitores e as eleitoras entenderam isso. O que reforçou a despolitização das eleições. O que, por sua vez, foi sentida na falta de empolgação da cidadania.

A despolitização, como estratégia das elites, parece que deu certo para manter o poder da ordem (não mudar nada significativo e, ao mesmo tempo, fingir que muda tudo). Foram afastadas todas as possibilidades de debate de alternativas e de mudanças. Uma estratégia que poderá gerar conseqüências muito negativas para a democracia.

Para a democracia de mais da metade da população, as mulheres, já está trazendo conseqüências. Ao centrar-se no reforço de um fundamentalismo religioso, falso-moralista , o debate eleitoral “escolheu” um inimigo ou melhor uma inimiga: a mulher. Direitos sexuais e reprodutivos, nem pensar. Liberdade e autonomia da mulher, causa de todos os males … Assim foi vista a mulher nas eleições. Foi reforçado o papel da maternidade obrigatória e mais uma vez invizibilizado o trabalho das mulheres (dupla ou tripa jornada de trabalho não remunerado).

Além do mais, a eleição “ficha limpa” começou desrespeitando a legislação que determina uma cota mínima para cada um dos sexos na formação das candidaturas. Desrespeito que foi acompanhado pelo Poder Judiciário, que viu a lei como muito dura!

Para salvar as mulheres dessa situação que, se levada adiante, as fará prisioneiras do fundamentalismo religioso. Para salvar a democracia, dessa crescente vertente que quer subordinar o Estado Laico aos preceitos religiosos. É necessária a política. É fundamental fazer política. É preciso tirar a política dos templos e igrejas, levá-la às ruas. Debater a partir das necessidades reais das pessoas, construir programas de superação dos problemas e empurrar o limite do impossível a luta por liberdade.

Quem assistiu o “debate” eleitoral acaba tendo a impressão que no Brasil não há negr@s, que aqui não existem indígenas e tampouco crianças vivendo em situação de rua. Parece que o Brasil é um canteiro de obras e só tem indústria de ponta. Ainda mais, que o agronegócio é o grande “salvador da pátria” (elogiado até pela candidata ambientalista!).

Além de esquecer de tratar do racismo, do machismo, da homofobia e lesbofobia, do genocídio indígena e dos assassinatos de mulheres, a campanha eleitoral ignorou os confltos socioambientais, a marginalização da juventude, os assassinatos de jovens negros, a exploração sexual, a violência contra a população pobre e tudo o mais que faz parte da realidade … aquela realidade que o marketing político esconde, mas que a gente sente na pele. A realidade dos ônibus lotados, do salário baixo, do desemprego, da superexploração da mulher …

Ao findar o primeiro turno eleitoral, comemoramos a eleição de algumas valorosas mulheres. Mas não se pode deixar que a comemoração esconda o fato de que são poucas, muito poucas ainda as mulheres nos espaços de poder. Precisamos multiplicar esse número.

Os que vão agora para o segundo turno fazem seus balanços de campanha. No caso da coordenação da campanha da Dilma Rousseff, alardeiam que o resultado abaixo do esperado deve-se principalmente a emails e filmetes distribuídos pela internet, onde se afirmava que ela defenderia o aborto. Se alguém acreditar nisso, o fará por suas próprias crenças no sobrenatural, será uma questão de pura fé, já que não há nada mais falso ou sem comprometimento com a verdade. Essa mentira foi usada para reforçar a proximidade da campanha com líderes fundamentalistas de direita. Mas na hora de fazer balanço, sem câmeras por perto, insistir em mistérios da fé, não é um bom instrumento de análise.

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