IRÃ DAS MULHERES: Crueldade sem fim

Regime iraniano mantém atualmente 19 mulheres no corredor da morte, à espera da execução por apedrejamento. Ativistas que lutam contra a prática denunciam estupros, torturas e execuções secretas, sem que a família da condenada seja avisada





  • A noite que antecede a execução por apedrejamento no Irã costuma ser longa e solitária. A condenada se vê obrigada a enfrentar o medo da morte e a perspectiva de se despedir da vida com uma dor lancinante. Os algozes aconselham-na a passar as últimas horas em oração — uma forma de buscar a redenção, perante Alá, pelos crimes cometidos contra o islã. Está sozinha, isolada em uma cela de uma prisão qualquer, onde a tortura é prática comum. Abandonada, costuma ser morta sem que sua família nem sequer seja avisada. Quem descreve em detalhes os últimos rituais de uma sentenciada à lapidação é a iraniana Mina Ahadi, que transformou a execução do marido, em 1979, em um estímulo para lutar contra a pena capital no regime islâmico. “Antes de serem apedrejadas, as mulheres não têm direito de se despedirem dos familiares. Em 2001, quando a prisioneira Maryam Ayoubi ouviu dizer que era hora do apedrejamento, perdeu a consciência e foi levada de ambulância da prisão de Evin para o local da execução”, relata Mina, fundadora do Comitê Internacional contra o Apedrejamento (Icas, pela sigla em inglês). No Irã, os homens sentenciados à lapidação são enterrados até o pescoço; as mulheres, até as axilas. Segundo a tradição do islã, aqueles que conseguem sair do buraco durante o apedrejamento são imediatamente libertados. Desde 1980, cerca de 150 pessoas tiveram a sentença cumprida.
    Além da viúva Sakineh Mohammadi-Ashtiani, 18 mulheres e cinco homens aguardam a execução. Duas iranianas — Saba Abdali, 30 anos, e Zeinab Heidary, 38 — estão no corredor da morte há 15 anos. Os ativistas de direitos humanos temem que Maryam Ghorbanzadeh, 25 anos; Kobra Babaei; e Azar Bagheri, 19, sejam mortas a qualquer momento. “Azar tinha apenas 14 anos quando foi forçada a se casar com um homem bem mais velho. Aos 15, acusaram-na de adultério. Está há quatro anos em Tabriz, na mesma prisão de Sakineh”, diz Mina Ahadi. De acordo com ela, Maryam já sofria opressão de sua família quando as autoridades a detiveram por supostamente trair o marido. “O regime iraniano a fez abortar, com seis meses de gravidez, para que pudessem condená-la ao apedrejamento”, acusa a fundadora do Icas. “Kobra Babaei é uma mulher muito pobre. Ela amava Rahim, seu marido, e ambos viviam bem juntos, mas viu-se obrigada a se prostituir para ter dinheiro”, conta a ativista. Por ter permitido a infidelidade de Kobra, Rahim foi enforcado — oficialmente, o governo iraniano acusou-o do crime de sodomia. “O regime islâmico é misógino e especialmente brutal contra as mulheres”, critica Mina. Para a advogada Lily Mazahery, conhecida defensora dos sentenciados à lapidação no Irã, afirma que Kobra, Maryam, Zeinab e Sakineh são “vítimas de um sistema legal que lhes nega os direitos mais básicos e não mostra qualquer tipo de misericórdia”. “O governo que proibiu o aborto eliminou o feto de Maryam. A situação toda foge da compreensão humana”, desabafa. “A República Islâmica deveria ser responsabilizada por suas notáveis violações dos direitos individuais, por seu tratamento bárbaro à população e pelo completo desrespeito às normais e leis dos direitos humanos internacionais”, acrescenta. Lily tomou conhecimento sobre a realidade enfrentada pelas iranianas nas prisões do país por meio de uma cliente. “Delara Darabi era uma artista talentosa, pianista e poetisa, condenada aos 17 anos por um crime cuja autoria jamais foi comprovada. Quando eu me comuniquei com ela, soube que as prisões não atendem a nenhum padrão internacional. Descobri que os prisioneiros são rotineiramente abusados, drogados e sujeitos às condições mais devastadoras”, conta. Em 1º de maio de 2009, o regime enforcou Delara, secretamente, sem notificar seu advogado ou sua família. “Ela havia contado sua experiência na prisão em uma revista que pretendia me enviar, mas as autoridades carcerárias confiscaram a publicação. O Irã não quer que o mundo tenha qualquer informação sobre as atrocidades que ocorrem dentro dessas masmorras”, acrescenta. Ritual perverso Desde 1983, o sistema judiciário do Irã utiliza o apedrejamento (ou lapidação), instituído após a Revolução Islâmica de 1979 Tribunal
    O artigo 74 do Código Penal Iraniano determina que a pena de morte seja aplicada ao crime de adultério apenas se houver o testemunho de quatro homens justos ou de três homens justos e duas mulheres justas. As testemunhas precisam ter visto o ato sexual Preparação

    Com as mãos presas às costas, as mulheres são cobertas por um lençol branco, da cabeça aos pés, antes de serem enterradas até as axilas. Os homens ficam apenas com o pescoço de fora. Segundo a tradição islâmica, o condenado que conseguir sair do buraco ganha a liberdade imediata Escolha das pedras

    As pedras escolhidas são grandes o suficiente para infligir dor, mas não o bastante para matar o condenado imediatamente Morte

    A execução dura o tempo que o sentenciado permanecer vivo. As pedras são lançadas contra o peito e a cabeça. Em média, a execução dura entre 30 minutos e uma hora

    Depoimento
    Opressão às mulheres
    Lily Mazahery

    Arquivo pessoal
    lily-mazahery


    ]] >

    Deixe um comentário

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *