Discriminação contra mulheres comerciantes

Servaas van den Bosch, da IPS
Windhoek, Namíbia, 17/8/2010 – “Os africanos não acreditam que as mulheres possam ser grandes empresárias”, disse, com ar de enfado, a comerciante zambiana Angelica Rumsey. As comerciantes da África austral costumam ser hostilizadas por funcionários na fronteira, afirmou. Porém, a discriminação também se reflete no tipo de produtos expostos na Feira Comercial da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), que terminará amanhã.

A mostra é dominada por diversos artesanatos, joias baratas, túnicas e outros artigos tipicamente africanos, cosméticos e produtos para o cabelo. “O objetivo é que as comerciantes não fiquem em produtos tradicionalmente femininos como roupas e joias”, disse Sirkka Ausiku, secretária permanente do Ministério de Igualdade de Gênero e Bem-Estar Infantil da Namíbia, onde começou ontem e termina hoje a 30ª Cúpula da SADC. “Uma das organizações participantes é a Mulheres da SADC em Mineração, dedicada a defender os direitos femininos no setor. Nos próximos anos, gostaríamos que houvesse mais”, afirmou.

“As pequenas empresas têm possibilidades de crescer”, disse a zimbabuense Gugu Usumani, membro dessa organização. “Não é só para os homens”, acrescentou. “As mineradoras do Zimbábue sofrem as políticas estatais. É difícil retirar diamantes do país. Também há problemas para conseguir máquinas perfuradoras, cortadoras e polidoras. Mas é uma boa atividade para as mulheres, especialmente porque muitas são de áreas rurais com poucas oportunidades”, explicou. A Feira Comercial da SADC e o fórum sobre investimentos que houve antes ajudam as empresárias, disse Gugu. “As mulheres têm uma grande exposição”, afirmou.

Cerca de 300 mulheres dos 14 Estados da SADC – Madagascar continua suspenso – reuniram-se na capital da Namíbia para mostrar seu trabalho e realizar cursos de capacitação nesses três dias. “Abriu nossos olhos para muitas coisas”, disse Angelica no fórum. “As mulheres costumam sair perdendo porque não conhecem bem as normas. Por exemplo, é comum pagarem impostos que não deveriam pagar”, acrescentou.

Elas desejam fazer negócios, disse Angelica à IPS, mas há muitos impedimentos, especialmente no comércio transfronteiriço, dominado por mulheres. “Há muitas barreiras, os funcionários da aduana, que procuram encontrar falhas onde não existem, hostilizam mesmo quando os papeis estão em ordem. Tem muito a ver com nossa cultura”, explicou.

O subsecretário de Finanças da Namíbia, Calle Schlettwein, reconheceu na inauguração do fórum sobre investimento que a implementação do protocolo comercial da SADC deve ter uma perspectiva de gênero. Aumenta a quantidade de mulheres e elas fortalecem sua presença no setor formal, mas “a maioria das atividades comerciais que realizam continua sendo informal e de pequena escala”, ressaltou.

“É preciso analisar nossos instrumentos legais para garantirmos que tenham uma perspectiva de gênero. O maior objetivo deve ser a igualdade de oportunidades comerciais”, disse Calle. A eliminação das barreiras comerciais é um assunto importante, disse Mercy Timbe, que trabalha com apicultoras do Malauí. “Por que para mim é tão difícil vender meus produtos em uma loja de Maurício?”, perguntou. Também sugeriu a criação de uma base de dados, ou diretório regional, de empresárias para estender pontes. “Tem de haver câmaras de comércio de mulheres. Os homens são maioria nas estruturas atuais”, acrescentou.

“Apenas três países enviaram representantes ao fórum de investimentos. De Zâmbia, só participaram comerciantes. Onde estão nossos funcionários?”, questionou Angelica, referindo-se ao fato de os governos precisarem redobrar seus esforços na matéria. “Onde estão as políticas da SADC para favorecer as comerciantes?”, insistiu.

“É sabido que as mulheres são a coluna vertebral de muitas economias africanas e também que têm papel principal na economia dos Estados-membros da SADC”, disse a ministra de Equidade de Gênero e Bem-Estar Social da Namíbia, Doreen Sioka. A independência econômica das mulheres é crucial “porque se contrapõe à exploração, à feminização da pobreza, à discriminação e ao descuido por seus interesses”, destacou. “As mulheres destinam uma proporção maior de sua renda para alimentar e educar os filhos, o que repercute no bem-estar de suas famílias”, acrescentou Doreen. Envolverde/IPS

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Crédito:
Servaas van den Bosch/IPS
Legenda: Comerciante zambiana Angelica Rumsey.

(IPS/Envolverde)

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