A extrema pobreza é feminina

O núcleo duro da pobreza urbana brasileira é feminino, afirma economista

Nas favelas e periferias brasileiras, a perversa combinação entre baixa escolaridade, desigualdade de renda, falta de acesso a serviços de saúde e educação, e precárias condições de habitação caracteriza o núcleo duro da extrema pobreza.

A partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD) de 2008, o economista André Urani, sócio-fundador do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS), desenvolveu uma análise comparativa sobre a evolução das condições de vida, entre 1993 e 2008, nas dez principais regiões metropolitanas do país: Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Recife, Fortaleza e Belém.

O resultado: em 1993, havia 6,3 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza nessas regiões, das quais 1,6 milhões vivia em famílias chefiadas por mulheres. Quinze anos depois, havia 3,5 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza nessas regiões, das quais 1,8 milhão vivia em famílias chefiadas por mulheres.

Embora o percentual de pessoas que vivem na indigência – com renda familiar per capita de até R$ 104,00 – tenha caído 44% no Brasil metropolitano, entre 1993 e 2008, essa queda não se refletiu, necessariamente, nas condições de vida de quem vive em famílias chefiadas por mulheres. Nem o crescimento econômico, com a melhoria e a expansão do mercado de trabalho, nem as políticas de transferência de renda contemplaram quase os 2 milhões de brasileiros e brasileiras que permanecem em condições de indigência.

O fenômeno registrado nas principais regiões metropolitanas se repete no Brasil como um todo, ainda que com menos intensidade. Em 1993, havia 32,4 milhões de pessoas vivendo em condições de extrema pobreza no país, das quais 5,5 milhões viviam em famílias chefiadas por mulheres. Em 2008, havia 15,8 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza no país, das quais 5,2 milhões eram pessoas vivendo em famílias chefiadas por mulheres. Ou seja, a redução da indigência no Brasil foi de apenas 1,7% entre famílias chefiadas por mulheres.

Por outro lado, a análise dos dados estatísticos permite concluir, também, que pode ter havido um aumento significativo no número de famílias monoparentais – com apenas um adulto responsável – e lares chefiados por mulheres.

Gênero e mobilidades

Para o economista André Urani, mulheres chefes de família são pouco sensíveis às melhorias no mercado de trabalho. Sobretudo, devido a uma combinação de fatores como falta de perspectiva de futuro, ausência de responsabilidade paterna, baixa escolaridade e falta de equipamentos públicos, como creches. “São problemas que os programas convencionais de transferência de renda, como o bolsa-família, não são capazes de resolver”, explica.

A economista Lena Lavinas entrevistou mais de 120 mil mulheres em Recife, no âmbito de uma pesquisa sobre as/os beneficiárias/os do Bolsa Família, e descobriu que mais da metade das pessoas que não recebem o benefício vivem em famílias chefiadas por mulheres, e que 60% das pessoas que não recebem, mesmo sendo elegíveis, são mulheres chefes de família.

Ela aponta a falta de mobilidade da mulher em famílias monoparentais, na condição de único adulto responsável pela renda familiar. E ressalta o fato de a renda feminina, em geral, ser menor do que aquela advinda de trabalho masculino equivalente ao feminino. Entre as famílias chefiadas por apenas um adulto, as chefiadas por mulheres com menos de 35 anos, responsáveis por crianças menores de seis anos, configuram essa situação de extrema pobreza identificada nos dados da PNAD 2008.

A dificuldade de atendimento pela rede social compromete a mobilidade das mulheres chefes de família, que não têm com quem deixar seus filhos para trabalhar. “Falta creche, falta escola em tempo integral, falta uma política habitacional, falta um conjunto de políticas na rede de assistência social que resolvam uma série de outros déficits, além da renda, que aparecem nas famílias monoparentais chefiadas por mulheres”, afirma Lena.

fonte: Observatório Brasil da Igualdade de Gênero

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