O fato de o aborto legal ainda ser muito restrito no País empurra as mulheres para uma situação de vulnerabilidade.
Carla Guedes – odiario.com Maringá – 26/6/2010
Margareth Arilha >> pesquisadora do Núcleo de Estudos de População da Unicamp
Por que a Comissão de Cidadania e Reprodução defende a descriminalização do aborto no Brasil?
Deveríamos ter uma lei aberta que permitisse que o aborto fosse feito no serviço de saúde e não mais de forma clandestina, evitando, assim, que as mulheres tivessem de se submeter a situações de risco à própria vida. .
A lei do aborto leva as mulheres para a clandestinidade?
O fato de o aborto legal ainda ser muito restrito no País empurra as mulheres para uma situação de vulnerabilidade. Elas vão tomar a decisão correndo riscos. Teríamos de encontrar um jeito em que fazer um aborto fosse legal para todo mundo, que não colocasse o profissional de saúde em situação constrangedora e que tratasse com mais humanidade a mulher. A lei do aborto no Brasil não serve para nada. Não contempla as mulheres, que hoje abortam mal e com pouca informação. A descriminalização do aborto humanizaria a situação. A mulher precisa ser tratada de forma igualitária, justa e digna. Não é bacana a sociedade conviver com a mulher que aborta no meio da rua e que larga o feto em qualquer lugar. A sociedade também tem de considerar que a mesma mulher que é mãe é a mulher que aborta. Não existe essa separação. Temos de parar com discriminação que a lei produz. Os nossos parlamentares estão sendo cúmplices em criar uma situação que obrigue o País a tratar as mulheres de maneira indigna.
Os conservadores, contra o aborto, defendem a prevenção da gravidez para enfrentar o problema...
Os mais conservadores apontam que deveríamos trabalhar na prevenção, promovendo acesso aos métodos contraceptivos, mas o Brasil já está fazendo isso. E a experiência de outros países mostrou que é insuficiente. Uma pesquisa mostrou que o uso de contraceptivos no País entre mulheres de 15 a 44 anos cresceu. Passou de 77,9% em 1999 para 81,6% em 2006. Mesmo assim, os contraceptivos falham ou as mulheres sofrem com a falta de dinheiro para comprá-los, caso não existam no serviço público de saúde. Essas situações levam a uma gravidez inoportuna e aí a mulher se pergunta: Eu quero ou não ter esse filho?. Ela vai abortar se não desejar aquela gravidez. E o fará em situação de desamparo.
Onildo Luiz Gorla Júnior >> padre e assessor da Pastoral Familiar, responde
Por que a Igreja Católica proíbe o aborto?
A Igreja Católica é contra a prática do aborto porque entende que a vida humana é um valor inviolável. Entende que a vida precisa ser tutelada, especialmente a vida dos que estão em situação de dependência de outros. Para a Igreja Católica, o ser humano começa a existir a partir da fecundação do óvulo, fato este atestado pelas ciências. Portanto, interromper esta etapa voluntariamente é inaceitável. Dificilmente os motivos para o aborto levam em consideração a vida do abortado. Sempre são motivos que visam o bem-estar dos adultos envolvidos no caso: a mulher – geralmente muito jovem – que engravidou sem desejar; o rapaz, também muito jovem, que não quer assumir a paternidade; as famílias envolvidas na gravidez; em alguns poucos casos uma gravidez de risco ou por causa de violência sexual. Com isso, não se quer dizer que a igreja é insensível em relação ao sofrimento de muitas mulheres e famílias que passam por problemas como este. A igreja tem muitas pessoas atuando em pastorais, movimentos e instituições que procuram acolher e ajudar as pessoas em situações como esta.
Qual a punição da igreja?
A igreja propõe sempre um ato de reparação. O aborto é considerado pecado grave contra o amor de Deus e ao próximo. Quem pratica um ato assim se coloca na situação de separado da comunidade eclesial. É a chamada ex-comunhão. E a pessoa assim permanecerá até que queira se reconciliar com Deus e com os irmãos e irmãs contra os quais cometeu seu erro. Através do sacramento da reconciliação ela é reintegrada na comunhão da igreja.
O que a legalização do aborto acarretaria no Brasil?
Um dos motivos para a legalização do aborto é a proteção à mulher. Alega-se que uma das causas de mortes entre as mulheres são os abortos clandestinos, nos quais a mulher tem pouca assistência adequada. No entanto, por trás destas afirmações está um movimento ideológico pró-legalização do aborto. Estudo publicado recentemente pela revista médica britânica The Lancet mostra que nos países onde há legislação permissiva o número de mulheres que morreram em decorrência desta prática aumentou, mas sobre dados como estes poucos querem falar. Legalizar o aborto é uma forma irresponsável de adiar a solução de problemas.