Para além das eleições, a tropa de choque da direita contra as mulheres no Congresso Nacional tem se concentrado em três ações este ano: a votação do Estatuto do Nascituro, a discussão do Estatuto das Famílias, e a abertura da CPI do Aborto
No último dia 12, os dois Estatutos estiveram pautados na Câmara dos Deputados. Pela quinta vez este ano, os religiosos que dominam a Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) tentaram votar o projeto do chamado Estatuto do Nascituro. E o das Famílias foi tema de audiência pública na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Diante dessa estratégica ofensiva da direita faz-se necessário esclarecer o conteúdo e significado desses projetos. Especialmente o que tem sido mais debatido, o Estatuto do não nascido.
O projeto foi inicialmente apresentado em 2005, pelo então deputado Osmânio Pereira (PTB-MG). Ele foi resgatado em 2007 pelos deputados Luiz Bassuma (PV-BA) e Miguel Martini (PHS-MG), porque Osmânio foi acusado em 2006 de denvolvimento no esquema das sanguessugas, o que valeu o fim de seu mandato e não reeleição naquele ano.
A proposta apresentada por Bassuma e Martini, Projeto de Lei 478/07, foi relatado na CSSF pela deputada Solange Almeida (PMDB-RJ) que votou favoravelmente ao projeto que pretende entre outras coisas tornar o aborto crime hediondo, inclusive em casos de estupro. Portanto a mulher que engravidar após um estupro não poderá mais interromper a gestação.
Além disso, o projeto quer impedir o avanço tecnológico da medicina proibindo a manipulação, o congelamento, o descarte e o comércio de embriões humanos, de onde hoje são extraídas células tronco, fundamentais para estudos que podem significar a cura para diversas doenças hoje consideradas incuráveis.
“Prioridade ao nascituro”
Ao contrário do que apresenta os setores conservadores, o projeto não pretende “defender a vida”. Com base em dogmas e no entendimento filosófico de que a vida começa na concepção, pretendem realizar um enorme ataque contra os direitos democráticos das mulheres e de toda população.
Ao defender que: “Art. 4º É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar ao nascituro, com absoluta prioridade, a expectativa do direito à vida, à saúde, à alimentação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”, o Estatuto ignora que o sujeito de todos esses direitos não existe sem a mulher. Se, se pretende estabelecer políticas públicas para o feto, é necessário antes de tudo, garantir às mulheres seu direito de decidir, garantir suas necessidades materiais etc.
Estabelecer o feto como ser mais digno de direitos que uma mulher é ferir princípios fundamentais.
Apenas se a mulher tiver atendimento e acompanhamento médico adequado, boas condições emocionais, psicológicas, econômicas, e de saúde para levar adiante essa gestação, será possível o “seu desenvolvimento sadio e harmonioso”. É impossível garantir “condições dignas de existência” para o feto, se a mulher que o está gerando está sendo obrigada a manter uma gestação contra a sua vontade ou se sua vida corre risco, por exemplo.
O desejo de retirar das mulheres seus direitos é tamanho que o Estatuto pretender outorgar ao feto uma espécie de tutor, mesmo estando dentro da barriga da mulher, em detrimento das decisões que poderiam ser tomadas por ela ou pela família.
Não há respaldo para tal proposta nem na Constituição Federal ou no Código Civil que não reconhecem a personalidade civil do feto.
“A criança não pode pagar pelo erro dos pais”
Para justificar o retrocesso na legislação, no que tange ao aborto legal, por gravicez resultante de estupro, Solange Almeida argumenta que “a criança não pode pagar pelo erro dos pais”. Erro dos pais? Qual foi o erro da mulher? Ela por acaso merece ser punida? Não é mais vítima, mas cúmplice do estuprador?
A relatora, aliás, faz questão de não apenas concordar com o projeto, como aprimorar o caráter obscurantista do texto, ao propor a “substituição da expressão ‘expectativa de direito’ por ‘direito’… enfatizando que, independente da discussão acerca do momento do início da personalidade jurídica, deve ser conferida proteção atual e efetiva ao nascituro”.
Nesta semana, a Comissão de Seguridade Social e Família deve colocar novamente o projeto de criação do Estatuto do Nascituro. E a tropa de choque da direita reunida na Comissão vai fazer todo o esforço necessário para aprovar o projeto.
Esses mesmos senhores que hoje chegam ao extremo de propor que a mulher vítima de estupro seja considerada tão criminosa quanto o estuprador, que ignoram os direitos e a vida da mulher constituída em detrimento do feto, que condenam à morte mulheres com gestações de risco, de fetos com anomalias incompatíveis com a vida, como no caso da mulher do Rio Grande do Norte que no início do mês morreu durante o parto de um feto que nasceu morto, porque não conseguiu na justiça autorização para o aborto, o fazem em nome da cínica “defesa da vida”. No entanto, como se vê, a última coisa com a qual esses senhores se preocupam é com uma verdadeira “defesa da vida”.
É necessário denunciar em todos os espaços o absurdo dessa proposta, e realizar uma ampla campanha em defesa dos direitos das mulheres, contra a fúria conservadora e os ataques da direita organizada dentro e fora do Congresso Nacional.
fonte: Coletivo de Mulheres Rosa Luxemburgo, da página do PCO na interntet.
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