NOTA PÚBLICA
MNDH NÃO ACEITA AS ALTERAÇÕES AO PNDH-3
O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) rejeita o Decreto nº 7.177, assinado pelo Presidente Lula e pelo Ministro Paulo Vannuchi, publicado em 13/05/2009 no Diário Oficial da União. O Decreto altera vários pontos do Programa Nacional de Direitos Humanos (PMND-3), publicado em dezembro de 2009.
O MNDH reitera o posicionamento aprovado em seu XVI Encontro/Assembleia Nacional, realizada em Osasco, SP, de 22 a 25 de 2010, no qual se manifestou em defesa da integralidade do PNDH-3, pelo respeito ao processo participativo de construção do PNDH-3 e pela imediata implementação do PNDH-3.
Para o MNDH, as alterações introduzidas mostram que o governo federal fez uma escolha que atende às reações conservadoras que se opuseram ao PNDH-3 e desconhecem e desrespeitam as organizações da sociedade que democraticamente participaram do processo de construção do PNDH-3 e que saíram amplamente em sua defesa.
O MNDH conclama a sociedade brasileira, as organizações de direitos humanos, enfim, todos quantos defendem os avanços introduzidos pelo PNDH-3 a se manifestarem e a exigirem do governo federal que respeite os processos participativos e que avance na implementação da versão original do PNDH-3
Brasília, 13 de maio de 2010.
Conselho Nacional
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)
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PROGRAMA NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
Nota Pública
Mudanças no PNDH 3: Governo cede aos setores conservadores e recua na garantia dos direitos humanos no país A Plataforma Dhesca Brasil vem a público repudiar o Decreto nº 7.177, de 12 de maio de 2010, que altera e até mesmo revoga importantes ações previstas no 3º Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH. Trata-se de uma clara capitulação frente à pressão de setores conservadores da Igreja Católica, dos latifundiários, das poucas empresas que controlam a mídia e de setores anti-democráticos das forças armadas.
Para esses grupos, o Brasil deve continuar a ser um país de privilégios,
desigual, racista, homofóbico e sexista. Um país onde jovens negros são mortos aos milhares, camponeses são mortos e expulsos de suas terras, mulheres são criminalizadas por recorrerem à prática de aborto e morrem por falta de atendimento médico e onde os setores do Exército e da Igreja, fazendeiros e os “donos da mídia” continuam com suas relações privilegiadas com o poder político, usufruindo de recursos públicos e pautando a agenda nacional. Esses setores nunca se sentirão contentes. Logo cobrarão novas alterações. Só descansarão quando conseguirem desvirtuar por completo o Programa, até torná-lo ineficaz. Esses setores se alimentam da pobreza e da desinformação. Mantêm seus privilégios históricos, com base na desigualdade
social, que ainda é a marca de nossa sociedade.
O Programa é resultado de um processo plural de construção, que durou mais de dois anos e contou com a participação de milhares de pessoas e organizações em todo o Brasil, juntamente com representantes do poder público (poder legislativo, estados, municípios, ministério público, defensorias públicas). É triste ver um governo, que se diz de esquerda e que incentiva a participação popular, mas que cede tão rapidamente à pressão de
grupos contrários ao aprofundamento da democracia com direitos humanos para todas e todos em nosso país.
Não é de se estranhar a posição do DEM contra o PNDH, partido este que promove no STF ações contra políticas afirmativas para a população negra, contra a demarcação de terras indígenas e quilombolas (ADI 3239) e cujo Senador Demóstenes Torres distorce a história, defendendo posições racistas e escravocratas em pleno século XXI.
É lamentável ver a posição oportunista do PSDB, que em seu governo elaborou as duas primeiras edições do PNDH. Em nota pública conjunta com o DEM, condena a “versão particularíssima de direitos humanos que o governo federal impingiu à Nação”. Esta versão é a mesma que o então presidente FHC reafirmou em 2002 ao publicar o PNDH II e é o compromisso assumido desde 1993 pelo Brasil, em Genebra, junto a comunidade internacional.
A Plataforma Dhesca, em conjunto com outras organizações e redes de direitos humanos no Brasil, defendem a integralidade do Programa, reconhecendo neste um importante instrumento de democratização do poder e garantia de direitos no país. Apesar do recuo do governo, não deixaremos de lutar para que os pontos modificados sejam efetivamente reconhecidos pelo Estado e por toda a sociedade brasileira.
Direitos humanos significam uma vida com dignidade e sem opressão para todos e todas. Nascemos livres e iguais em dignidade e direitos. Para tanto, queremos cobrar do governo federal, ações concretas para que as diretrizes previstas no PNDH sejam efetivamente implementadas. Ações que promovam educação de qualidade, saúde, acesso à terra, segurança pública, moradia, democratizem a informação, que combata à discriminação e as desigualdades
existentes no país. Sonhamos com uma vida digna, com igualdade e liberdade, para todas/as. É para isso que lutamos e vamos sempre continuar lutando.
Plataforma Dhesca Brasil
Curitiba, 14 de maio de 2010.
Mais informações:
Plataforma Dhesca Brasil – Rede Nacional de Direitos Humanos
Contato para entrevistas: Alexandre Ciconello (61) 3212-0200/ Andressa
Caldas (21) 2544-2320/ Darci Frigo (41) 3232-4660.
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Alterações no Plano Nacional de Direitos Humanos ainda geram controvérsias
Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Brasília – As modificações feitas pelo governo federal na terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) não agradaram os que defendiam o texto apresentado em dezembro de 2009 e ainda são vistas com ressalvas pelos que faziam críticas ao documento. Publicado no Diário Oficial da União de ontem (13), o Decreto nº 7.177, que altera parte da redação do programa, acabou por provocar mais controvérsias e deve gerar novas disputas no Congresso Nacional.
“Não concordamos com esse novo texto e acho que devemos ir às ruas para tornar pública nossa discordância e para discutirmos com a sociedade, fazendo-a ver o que significam essas mudanças: um retrocesso”, disse Rogéria Peixinho, uma das coordenadoras da Articulação das Mulheres Brasileiras, para quem o novo plano é ilegítimo, já que contraria decisões aprovadas pelos participantes das diversas conferências nacionais realizadas nos últimos anos sobre vários temas.
Entre as revisões feitas pelo governo federal em resposta às críticas da Igreja Católica, de representantes do setor agropecuário – como o Ministério da Agricultura e a Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) – de militares e de donos de veículos de comunicação, estão as polêmicas questões sobre aborto, mediação de conflitos agrários, ação programática sobr
e os meios de comunicação e referências explícitas à ditadura militar (1964-1985).
Procurada pela reportagem, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) afirmou que a revisão de alguns pontos do programa demonstra a boa vontade do governo para o diálogo. Mesmo assim, manteve a posição manifestada em nota divulgada na última quarta-feira (12): a nova versão do plano contém “elementos de consenso que podem e devem ser implementados imediatamente”, mas a “linha de continuidade” que perpassa suas três versões (de 1996, 2002 e 2009) revelam uma “antropologia reducionista”. A CNBB promete mobilizar a comunidade cristã para acompanhar o trâmite das propostas de lei que forem apresentadas em função do PNDH 3.
Os veículos de comunicação, por meio da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) e Associação Nacional de Jornais (ANJ), informaram ter ficado satisfeitos com as modificações relativas à comunicação social. Entretanto, os órgãos patronais acreditam que há pontos que poderão ser aperfeiçoados pelo Congresso Nacional.
“As associações representativas dos meios de comunicação brasileiros consideram louvável a iniciativa do governo de suprimir pontos críticos que ameaçavam a liberdade de expressão”, dizem as entidades em nota conjunta divulgada esta tarde. “Esperamos que a definição do marco legal referente aos serviços de radiodifusão, expressa no novo texto do decreto, se paute pelo respeito aos princípios constitucionais da liberdade de expressão.”
Também em nota, a presidente da CNA, senadora Kátia Abreu, afirmou que a confederação continua preocupada “com as ameaças ao direito de propriedade e com a segurança jurídica no campo”. Para a senadora, além de encarar o agronegócio com preconceito, o novo texto mantém a proposta de mediação de conflitos coletivos agrários, “o que faz com que o produtor possa ser obrigado a negociar com aqueles que criminosamente invadem sua propriedade”. A reportagem tentou ouvir o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), mas até a publicação da matéria não teve resposta.
Composta por mais de 30 entidades sociais de todo o Brasil, a Plataforma Dhesca Brasil considera que o governo cedeu a setores conservadores, recuando na garantia dos direitos humanos. “Defendemos a integralidade do programa, resultado de um processo plural de construção, que durou mais de dois anos e contou com a participação de milhares de pessoas e organizações em todo o Brasil, juntamente com representantes do poder público. É triste ver um governo, que se diz de esquerda e que incentiva a participação popular, mas que cede tão rapidamente à pressão de grupos contrários ao aprofundamento da democracia.”
Edição: Lílian Beraldo
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O RECUO FOI DOÍDO,
MAS A LUTA CONTINUA
Celso Lungaretti (*)
O Carlos Lungarzo me contou que estava adiando, tanto quanto possível, a leitura das matérias publicadas na imprensa sobre alterações na terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, pois pressentia que elas lhe trariam grande decepção.
Tudo bem, ele costuma mesmo se manifestar alguns dias depois dos acontecimentos, superado o momento da emoção e chegado o da reflexão, para esgotá-los com suas análises tão extensas quanto brilhantes.
Eu, não. Meu estilo sempre foi o de responder de batepronto, no calor das batalhas de opinião.
Questão de temperamento e, principalmente, de formação profissional. Embora nossos ideais sejam basicamente os mesmos, os textos do Lungarzo refletem suas muitas décadas de atuação no meio acadêmico; e os meus, na imprensa.
Quem, portanto, não cumpriu desta vez o papel habitual fui eu: tomei conhecimento imediato das mudanças no PNDH-3, mas não encontrei, de pronto, nada para dizer.
O recuo não precisava ser constatado, qualquer um percebia. Possibilidade de reverter o quadro não existia mais, a decisão tinha sido tomada.
Então, pensei, para que escrever? Para fornecer catarse, ajudando os companheiros a desabafarem, como se discursos contundentes contrabalançassem derrotas reais?
Também por temperamento, nunca fui dado ao chororô e ao jus esperneandi. Todas as vezes em que os acontecimentos me atiraram na lona, levantei e continuei lutando. O nocaute só vem com a morte — e, nas lutas políticas e sociais, ao contrário dos ringues, o exemplo que deixamos ainda pode inspirar seguidores a assegurarem nossa vitória póstuma.
É o que já me sinto forte para fazer também desta vez, superado o primeiro momento de frustração e lassidão. Tenho (temos) de juntar os cacos e começar a reagir.
Quanto à recapitulação do que ocorreu, para não perder tempo chovendo no molhado, vou aproveitar o resumo que a jornalista Eliane Cantanhêde fez para a Folha On Line. As informações dela costumam ser boas, ao contrário das interpretações e opiniões.
“A versão final do plano recua:
1) na defesa do aborto, na retirada de símbolos religiosos de órgãos públicos;
2) na investigação de tortura na ditadura militar (até a referência à data, de 1964 a 1985, foi retirada);
3) no veto ao uso de nomes de presidentes-generais em ruas e praças públicas;
4) na identificação de prédios (como quartéis e outras instalações militares) onde houve tortura;
5) na criação de um ‘ranking’ para definir as TVs e rádios que são boas ou não, com previsão de penalidades, desde multas até cassação de concessão;
6) nas mudanças em duas áreas de disputa entre os sem-terra e o agronegócio: mediação de conflitos e reintegração de posse na área rural. Ficou para o Congresso decidir…”
Os itens 1, 5 e 6 são bandeiras não tradicionalmente englobadas no campo dos direitos humanos, mas sim no dos direitos civis. Não devem ser abandonadas, mas redirecionadas para outros caminhos. Dispersar tanto assim o foco do PNDH-3 só serviu para unificar as forças inimigas, facilitando sua reação.
Quanto aos outros três itens, a batalha se travará agora no âmbito da Comissão Nacional da Verdade, mas devemos mobilizar intensamente a sociedade, para que o clamor por justiça se faça ouvir com força total em Brasília.
Ainda que os poderosos consigam assegurar de vez a impunidade dos indiscutíveis culpados por genocídios e atrocidades, não podemos desistir da luta para que a versão definitiva do Estado brasileiro sobre a ditadura militar seja a correta: tudo que decorreu da usurpação do poder pelos golpistas de 1964 se tipifica como exercício da tirania x resistência à tirania, de forma que qualquer tentativa de igualar ou equiparar os dois campos não passa da mais grotesca falácia.
Dar a logradouros públicos o nome dos déspotas e seus esbirros só nos expõe ao ridículo universal.
A verdade histórica tem de ser resgatada, o destino das vítimas informado a seus parentes e os restos mortais localizados para que recebam sepultura digna. Isto é inegociável.
E se as Forças Armadas não tiveram pejo de utilizar quartéis como centros de tortura, nada podem reclamar da apuração e divulgação do que neles ocorreu.
De resto, a esquerda tem de dar a mais incisiva resposta ao que a Cantanhêde lhe jogou na cara:
“A reação [dos militares, da Igreja, dos empresários rurais e de comunicação] contra a versão original do 3º PNDH foi virulenta, mas a reação contra o resultado final tem sido pífia, desmilinguida. A turma derrotada engoliu e digeriu bem as mudanças. Cu
rioso? Nem tanto”.
Só que não basta esbravejar contra a colunista e o PIG, isto seria fácil demais.
Tem é de provar, na prática, que não engoliu a derrota.
Lutando.