Por Mantoe Phakathi, da IPS
Manzini, Suazilândia, 14/5/2010 – “A África não pode sobreviver sem nós”, diz o slogan do Movimento de Avós Africanas, criado para cobrar assistência estatal e defender seus direitos e sua contribuição na luta contra o HIV/aids. “Queremos independência econômica para ajudar nossas famílias”, disse Judith Simelane, de 90 anos, enquanto lia a chamada declaração de Manzini, que marcou o nascimento dessa organização.
Os cinco filhos de Freda Shabangu morreram e ela teve de cuidar de seus 12 netos. A mulher, de 70 anos, tem de atender as necessidades familiares com a magra ajuda que recebe do Estado, equivalente a US$ 80 a cada três meses. “Estou contente. Pela primeira vez as avós falam de seus problemas”, disse à IPS. Duas em cada três pessoas com o vírus da deficiência imunológica humana (HIV) no mundo vivem na África subsaariana. Os avós, especialmente as avós, se encarregam das crianças doentes e de criar os netos.
A maioria dos Estados africanos destina muito pouco, ou nenhum, recurso para que a assistência social atenda a situação dos portadores do HIV, causador da aids. As avós tampouco recebem reconhecimento por sua ajuda na luta contra a enfermidade. “Precisamos de recursos para saber como encabeçar famílias saudáveis e ajudarmos umas às outras”, disse Simelane. “Queremos mais capacitação em educação sobre HIV/aids, criação de crianças órfãs, atenção médica, alfabetização e gestão econômica”, acrescentou.
O primeiro Encontro de Avós Africanas aconteceu de 6 a 8 deste mês, com apoio da Fundação Stephen Lewis. Cerca de 500 pessoas de 14 países do continente e mais 42 do Canadá participaram da reunião em Manzini. Além disso, mais de três mil avós participaram da manifestação organizada no último dia do encontro, pedindo independência econômica para comprar alimentos, ter uma casa decente, educar os netos e melhorar sua qualidade de vida.
“As avós canadenses aqui representam outras milhares que não vieram e que são solidárias com a situação de suas irmãs africanas”, disse Elizabeth Rennie, da Grandmothers to Grandmothers Campaign (Campanha Avós para Avós). Além disso, “arrecadam fundos para implementar programas que melhorarão a vida de suas colegas africanas”, acrescentou Rennie.
A ideia do encontro surgiu na cidade canadense de Toronto em 2006, com a finalidade de responder à difícil situação em que vivem as avós da África subsaariana, disse Siphiwe Hlophe, diretora da Swaziland Positive Living (Swapol). A Fundação Stephen Lewis parte da ideia de que, se certas comunidades tiverem os recursos necessários para iniciar pequenas empresas, a situação pode mudar, explicou a diretora-executiva, Ilana Landsberg-Lewis “As avós reclamam melhores políticas para poder sobreviver em suas comunidades”, acrescentou.
A Fundação financia vários programas. A organização St. Francis, que trabalha desde 2007 com 120 avós ugandenses, as ajuda a criar uma empresa e a economizar. A maioria delas convive com o HIV/aids. “A cada avó damos US$ 100 para que inicie um negócio que considere mais apropriado”, explicou Angela Kirabo Ashaba, da St. Francis. A organização também evita que precisem ir ao banco e passem por outros trâmites aborrecidos para guardar suas economias. “Os bancos as intimidam, e o rendimento gerado pelos tradicionais fundos que movimentam o dinheiro regressa às avós. Não fica no banco nem nas instituições de microcrédito” , disse Anne Mwangi, da WEM Integrated Health Services (Wemihs). A organização também as ajuda a utilizar suas economias para cobrir suas necessidades como pagar escola e comprar comida.
No encontro também foram discutidas estratégias para lidar com HIV/aids, como criar grupos de apoio às avós, saber se seus netos são portadores do vírus, garantir assistência social e lutar contra a violência. Cada vez há mais avós violentadas, afirmou Ntombi Tfwala, a rainha-mãe de Suazilândia, na abertura oficial do encontro. “Ouvimos que os agressores que atacam e roubam as idosas levam tudo o que possuem. Aproveito esta oportunidade para repreender esses malfeitores que complicam a nossa vida”, acrescentou.
Bastou uma passada de olhos pelas participantes do encontro para observar as diferenças com imagens estereotipadas da avó ocidental de cabelo grisalho. É uma condição contextual, disse Aisha Camara-Drammeh, representante do Fundo de População das Nações Unidas na Suazilãndia. “Na África, especialmente na Suazilândia, a avó é a que tem netos, sem importar a idade ou se está, ou não, casada”, explicou. Também pode ser uma mulher sem filhos, mas que “seja avó porque faz parte de uma família grande”, acrescentou, o que faz variar o papel social e a carga da pessoa segundo sua situação concreta. IPS/Envolverde
FOTO
Crédito: Mantoe Phakathi/IPS
Legenda: Marcha de avós em Manzini.
(IPS/Envolverde)