Raquel Vitorelo lançou um documentário performático sobre a vivência de ser uma mulher que desenha. Em 10 minutos, Mulheres Desenhadas mostra experiências pessoais relacionadas com acontecimentos midiáticos e expõe os obstáculos de uma cultura que vê a mulher como objeto retratado, e não como sujeito que retrata. A maior parte das imagens que o compões são autorretratos de 59 artistas, enviados a partir de uma chamada pública feita pela artista.
A artista tem muitos trabalhos relacionados ao feminismo, como vocês podem conferir no site dela. Aproveitamos para conversar com ela sobre eles e o documentário:
1. Raquel, nós da Universidade Livre Feminista conhecemos você através do trabalho “Coisa de mulher”. Você poderia falar um pouco mais sobre esse trabalho e o que te inspirou a realizá-lo?
Através do “Coisa de Mulher” eu quis homenagear mulheres e seus feitos históricos através de retratos, pra mostrar que essa ideia machista de que existe coisa que cabe e não cabe à mulher precisa ser questionada.
A minha inspiração veio de uma vivência que acredito que toda mulher tem: de algum momento na vida alguém ter lhe falado que isso ou aquilo não era pra você, porque você não é capaz, simplesmente. Esse ataque que se dá por sutilezas (ou não) que te pressiona a desistir de um objetivo, de um sonho, porque supostamente você, enquanto mulher, não teria a competência natural pra isso…
A forma que encontrei de contra-atacar, foi mostrar que muitas mulheres construíram o mundo em que vivemos. Sabe-se que somos convenientemente apagadas da história, e este é outro motivo pra resgatar essas personagens. É um jeito de resgatar a nós mesmas.
2. E como ele se relaciona com esse documentário, o “Mulheres Desenhadas”?
Apesar das temáticas diferentes, o objetivo é o mesmo: explicitar nossa presença e atuação na sociedade. Uma presença social e até política, por que não? No documentário, coloco a pergunta: onde estão todas as mulheres que estão produzindo e estudando, qual o motivo de não aparecerem na mídia e, portanto, não terem reconhecimento? Acredito que isso esteja muito relacionado com o modo que a mulher é representada nos meios, frequentemente a partir do olhar masculino. E, admito, um olhar masculino que muitas vezes contagia a nós, autoras e artistas.
3. Você acha que hoje há mais espaço para as mulheres artistas do que havia há alguns anos?
Eu percebo que, ultimamente, muitas artistas estão falando abertamente sobre feminismo, e até tratando disso nos seus trabalhos. O feminismo nunca esteve tão acessível, apesar dos jornais terem medo de usar essa palavra proibida rs. E essa postura faz diferença, aos poucos nossa presença se faz necessária.
4. Ainda há muito machismo nesse meio artístico? Se sim, você poderia dar exemplos de machismos com os quais você tem que lidar?
Eu diria que em questão de conviver com as colegas de profissão, a coisa é mais sutil. Acho que o machismo é mais expressivo quando a mulher reconhece machismo na obra de um homem e ousa fazer uma crítica. É difícil encontrar um artista que lide com isso de forma construtiva, com seriedade. A mulher é então acusada de ser moralista, sem ética, incapaz de interpretação, e ainda corre o risco de ser exposta e ter seu trabalho boicotado…
5. Que recado você deixa para as meninas que desenham e que sonham um dia ser artistas?
Não parem de desenhar! NUNCA!!
Desenho tem muito a ver com confiança e acreditar no potencial de quem se dedica. A recompensa demora anos pra chegar, mas ninguém vai poder tirar isso de você.
Crescer menina implica em ouvir o tempo todo que você deve ficar quieta. Mas não fique. Desenhe, crie. Não tenha medo de dizer o que você pensa.