Mulheres se manifestam por mais igualdade no cinema, durante cerimônia do Oscar

Campanha ‪#‎AskHerMore‬

Algumas atrizes que foram ao Oscar ontem, dia 22 de fevereiro, aderiram a uma campanha contra a postura machista dos jornalistas na premiação. Cate Blanchett, Julianne Moore, Emma Stone, entre outras, se recusaram a falar apenas de suas roupas e/ou suas famílias, argumentando que seus colegas homens não respondem a esse tipo de perguntas, mas sim outras relacionadas às suas carreiras.

A comediante Amy Poehler, apresentadora da última edição do Globo de Ouro e estrela do seriado Parks and Recreation, foi a porta-voz da campanha que teve como slogan #AskHerMore (“pergunte mais a ela”). A campanha também foi usada em premiações recentes pelo site The Daily Share para estimular perguntas mais inteligentes vindas dos espectadores.

O grupo Representation Project, responsável pelo #AskHerMore, pediu que a hashtag seja usada pelo público para pressionar os entrevistadores do Oscar, alegando que “muitas vezes os repórteres focam mais na aparência feminina do que em suas conquistas”. Além disso, muitas mulheres têm aproveitado o momento para pedir mais representatividade feminina em papéis de destaque e mais reconhecimento nas cerimônias de premiação.

Já em 2014, Cate Blanchett (vencedora do Oscar de melhor atriz naquele ano) protagonizou um momento emblemático, quando interrompeu uma entrevista no tapete vermelho no momento em que um cinegrafista a filmava seu corpo para mostrar seu vestido. “Você faz a mesma coisa com os homens?”, perguntou ela ao cinegrafista, ao vivo.

Discurso de Patrícia Arquette

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Patricia Arquette, de 46 anos, fez um discurso bem feminista de agradecimento pelo Oscar de atriz coadjuvante que levou por sua atuação em “Boyhood” na noite deste domingo, dia 22, em Los Angeles.

Ao citar a defesa do direito de igualdade salarial entre homens e mulheres, ela incendiou o auditório e foi incentivada por Meryl Streep (sua concorrente no prêmio) e Jennifer Lopez, que gritaram palavras de apoio da plateia.

No discurso ela disse: “A todas as mulheres que deram à luz neste país, a todos que pagam impostos, nós temos que lutar por direitos iguais para todos. Está na hora de termos salários iguais de uma vez por todas e direitos iguais para as mulheres nos Estados Unidos.”

Representatividade das mulheres no cinema

A colunista Melissa Silverstein, da revista Forbes, já chama a edição deste ano da premiação de “Oscar do descontentamento” por conta das críticas que as indicações receberam desde que foram anunciadas em 15 de janeiro.

“Está difícil ficar animada com o Oscar porque não me sinto representada. Escrevo sobre as mulheres no mercado cinematográfico há mais de sete anos e, mesmo que já estejamos falando sobre o número de mulheres diretoras e de mulheres diante das câmeras, essa temporada de prêmios me lembra o ainda quanto falta para chegarmos lá”, disse.

Esta é a primeira vez desde 2006 que a premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas – cujos votantes são em sua maioria (77%) homens – não indica mulheres a nenhum dos grandes prêmios além da categoria de melhor atriz. Apenas uma das cinco atrizes indicadas neste ano está em um filme também indicado como melhor filme – Felicity Jones, que interpreta a primeira esposa de Stephen Hawking no filme A Teoria de Tudo. Todos os outros filmes cujas atrizes foram indicadas ao principal prêmio contam histórias exclusivamente de mulheres e receberam elogios da crítica, mas foram deixados de fora da premiação. É o menor índice desde 2003.

O argumento de Silverstein, ecoado por outros comentaristas americanos, tanto homens quanto mulheres, cita exemplos como Livre, filme baseado na biografia de Cheryl Strayed, que fez uma caminhada de mais de 1.600 km pelos Estados Unidos. O filme recebeu críticas favoráveis e o chamado “oscar buzz” (expectativa de muitas indicações ao Oscar), mas foi indicado em apenas duas categorias – melhor atriz e melhor atriz coadjuvante. E Ava DuVernay, viu seu filme Selma, sobre a caminhada intermunicipal pelos direitos civis dos negros liderada por Martin Luther King Jr., em 1965, receber duas indicações, entre elas a de melhor filme, mas deixou não foi mencionada no prêmio para melhor diretora.

A situação também é gritante se considerarmos que o sucesso midiático dos filmes depende cada vez mais das espectadoras. Segundo a empresa de pesquisa Nielsen, cerca de 61% da audiência televisiva do Oscar 2014, a edição mais vista desde 2000, foi de mulheres.

Teste de Bechdel

Não é de hoje que a indústria cinematográfica é alvo de críticas sobre a representação e reconhecimento das mulheres. O que é agora conhecido como o teste de Bechdel, por exemplo, vem se tornando um importante indicativo da lógica machista que estrutura esses espaços.

O teste foi formulado em uma história em quadrinhos – “Dykes to Watch Out For” de Alison Bechdel. Em uma tira de 1985 chamada “A regra” 6 7 , uma personagem feminina sem nome diz que ela só assiste a um filme se ele satisfazer os seguintes requisitos:

– Deve ter pelo menos duas mulheres;
– Elas conversam uma com a outra;
– Sobre alguma coisa que não seja um homem.

O teste não aponta se a trama é machista, apenas que as personagens femininas tem um papel relevante para a história. A autora creditou a ideia do teste a uma amiga e parceira de treinos de karate, Liz Wallace. Mais tarde ela escreveu que estava certa de que Wallace foi inspirada pelo ensaio “Um Teto Todo Seu” (1929) de Virginia Woolf, que diz:

Todas essas relações entre mulheres, pensei, recordando rapidamente a esplêndida galeria de personagens femininas, são simples demais. Muita coisa foi deixada de fora, sem ser experimentada. E tentei recordar-me de algum caso, no curso de minha leitura, em que duas mulheres fossem representadas como amigas. […] Vez por outra, são mães e filhas. Mas, quase sem exceção, elas são mostradas em suas relações com os homens. Era estranho pensar que todas as grandes mulheres da ficção, até a época de Jane Austen, eram não apenas vistas pelo outro sexo, como também vistas somente em relação ao outro sexo. E que parcela mínima da vida de uma mulher é isso!

O Instituto Geena Davis de Gênero na Mídia, fundado pela atriz Geena Davis, analisou a subrepresentação de mulheres no cinema para toda a família (cinema infantil). Foram 5,554 personagens analisados nos filmes da amostra, e 71% eram masculinos. Outro estudo, sobre representação de gênero em 855 dos filmes mais bem sucedidos financeiramente nos Estados Unidos de 1950 a 2006 mostrou que há, em média, dois personagens do sexo masculino para cada personagem do sexo feminino, uma relação que se manteve estável ao longo do tempo. Personagens femininas foram retratadas como estando envolvidas com sexo duas vezes mais frequentemente que personagens masculinos, e a proporção de cenas com conteúdo explicitamente sexual aumentou ao longo do tempo. A violência aumentou da mesma forma para personagens masculinos e femininos ao longo do tempo.

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