“Todo mundo sofre quando a democracia fracassa”

André Rodrigues/Gazeta do Povo

André Rodrigues/Gazeta do Povo / Kimberly trabalha para evitar futuros atos de genocídio como os cometidos no passado
Kimberly Mann, diretora do Programa de Holocausto da Organização das Nações Unidas Kimberly trabalha para evitar futuros atos de genocídio como os cometidos no passado

HOLOCAUSTO

 DIEGO ANTONELLI – Gazeta do Povo (Curitiba) – 3/8/2013

Um dos piores massacres da humanidade, que resultou no assassinato de aproximadamente 6 milhões de pessoas, não pode cair no esquecimento. Para Kimberly Mann, diretora do Programa de Holocausto da Organização das Nações Unidas (ONU) desde 2006, o holocausto – termo usado para descrever a tentativa de extermínio dos judeus na Europa nazista – ainda traz muitas lições ao mundo.
Segundo ela, uma democracia fragilizada impacta diretamente no desrespeito aos direitos humanos. O preconceito, o ódio e a falta de liberdade podem ganhar espaço e provocar tragédias inimagináveis. “Quando não há democracia todo mundo sai perdendo”, afirma Kimberly, que esteve nesta semana em Curitiba, onde proferiu palestras sobre o holocausto para a comunidade judaica.

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André Rodrigues/Gazeta do Povo / Programa da ONU aposta na educação para criar uma sociedade mais tolerante

Kimberly vê na educação uma das únicas armas para que a sociedade seja mais tolerante. É exatamente nisso que o programa da ONU trabalha.

Como surgiu e qual o objetivo do programa de Holocausto das Na­ções Unidas?
O programa foi adotado por uma resolução aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2005. A ideia é manter a lembrança das vítimas do holocausto e proporcionar o ensino para os jovens para evitarmos futuros atos de genocídio.

intolerânciaHá um material educa­ti­vo preparado pelo pro­grama?
Produzimos materiais didáticos para todos os níveis. Para os mais jovens temos um DVD, com um documentário que conta a história através de um sapato de criança que encontraram em Auschwitz. Para os alunos maiores, com mais de 13 anos, produzimos um DVD sobre a vida de Petr Ginz, um jovem que passou dois anos em campo concentração e morreu em Auschwitz. Tudo o que produzimos foi em seis idiomas: francês, árabe, chinês, inglês, espanhol e russo.

E teremos um material em português?
Em breve, espero que sim. Produzimos agora mesmo uma guia em português para uma conferência que houve em São Paulo. Temos outro guia sobre o holocausto que aborda como os crimes aconteceram com as mulheres. Para universitários e professores, temos um jornal com artigos escrito por educadores, pesquisadores e historiadores.

Por que a necessidade de manter a memória sobre o holocausto viva?
Para os alunos parece que é mais uma história. Temos que fazer compreender que é uma questão de direitos humanos, de combate à discriminação e ao preconceito. É uma questão de respeitar um ao outro.

Como evitar novos crimes de exterminação em massa?
A única maneira de prevenir e de impedir isso é através da educação. Os jovens têm que aprender o que aconteceu no passado. O perigo que é isso. O que é a consequência do ódio e do preconceito. Os jovens têm que aprender e compreender que devem celebrar a diferença em vez de ter medo das diferenças. Isso deve ser feito na escola, na igreja, nos templos, nas sinagogas e em casa.

memória

Como a senhora avalia as novas práticas que tentam resgatar o nazismo? Por que surgem esse grupos?
Realmente não sei. Sei que devemos ficar vigilantes e educá-los. Através de programas como esse, procuramos fazer trabalhos junto a organizações não governamentais (ONGs) e atrair grupos que se envolveram com o holocausto, como, por exemplo, a Justiça. Um dos que já organizei abordou o impacto das leis internacionais após o holocausto, como o Tribunal de Nuremberg. Também discutimos a responsabilidade do governo de proteger os cidadãos em vez de persegui-los.

Há sempre novos fatos a serem descobertos sobre o holocausto?
Incrível como sempre se tem coisa a descobrir. São histórias de coragem. Eu não posso imaginar como eles sobreviveram naquelas condições. É uma vontade de viver e de continuar. E não apenas sobreviveram, mas tiveram sucesso na vida e constituíram família. Era a intenção dos nazistas de matar e terminar com um povo, ferindo toda a cultura judaica. Fico contente em saber que eles não venceram e que ainda existe essa cultura muita rica.

Quais as lições que a hu­­manidade pode tirar do holocausto?
Muitas. As consequências do ódio e do preconceito e o perigo da intolerância. Também sobre a importância da democracia. Quando há um fracasso na democracia, todo mundo sofre, inclusive os direitos humanos. Hitler foi um ditador e com isso todas as pessoas, não somente os judeus, perderam os seus direitos.

O mundo está melhorando na questão dos direitos humanosAcredito que sim. Temos organizações como a ONU, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A própria ONU foi fundada depois dessa tragédia [em 1945], principalmente para proteger os direitos humanos. As ONGs são mais ativas e nas escolas todo mundo compreende que tem que defender os direitos humanos. Todos têm direito à liberdade de crença. Todos têm direito à vida.

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