Regina Navarro Lins: “Embora a moral sexual tenha sofrido grandes transformações, os antigos tabus ainda persistem”

fonte: www.delas.ig.com.br

Selecionei quatro e-mails – de três mulheres e um homem – dos muitos que recebo comentando sobre a diferença de idade no amor:

1. “Tenho 40 anos e observo cada vez mais que os homens mais novos estão deixando de lado as encanações e demonstrando seu interesse por mulheres mais velhas – e não só na internet. Atualmente saio com um cara de 26 anos e não vejo grilo algum em relação a isso. Da parte dele é até o contrário: ele parece se sentir orgulhoso disso, e comenta quando recebemos olhares masculinos que os caras devem estar morrendo de inveja dele. Curiosamente, o maior preconceito que constato é por parte das próprias mulheres. Amigas solteiras dizem que não querem envolvimento com caras mais novos, porque têm medo de serem usadas, exploradas ou outras bobagens do gênero, como se mau caráter fosse uma questão de faixa etária. Às senhoras que acham “ridículo”, só um comentário: elas não sabem o que estão perdendo.”

2. “Tenho 34 anos e namoro um rapaz de 19. Temos um ótimo relacionamento, mas, no fundo, fico constrangida quando saímos pra jantar ou tomar um chope. As pessoas nos olham com ar de reprovação, principalmente as mulheres. Mas isso não vai me fazer desistir do nosso amor. Pretendo viver isso até o fim, independente da aprovação alheia ou não. Simplesmente estamos apaixonados.” 

3.“Precisamos acabar com os preconceitos que limitam nossas vidas, estou amando um homem mais jovem que eu e no começo tive medo do que os amigos dele fossem dizer e também de que ele tivesse vergonha de mim. Mas ele é jovem, não é imaturo, e temos vivido bem juntos. Ele está comigo porque quer, porque gosta de mim e me valoriza, não porque precisa do meu dinheiro que, aliás, não tenho.”

4. “Creio que o preconceito na união de uma mulher mais velha com um homem jovem se deva ao fato da insegurança e baixa autoestima próprias da mulher com idade além dos 40. Nessa idade ela costuma se achar velha e começa a querer valorizar demais o seu estado de espírito, se tornando às vezes extravagante com medo de ver seu grande amor roubado por garotas mais jovens. Digo isso por experiência própria, pois vivi com uma pessoa mais velha que eu e ela me sufocava, me impedia até de ir trabalhar por achar que eu tinha um caso na rua e podia deixá-la. Esse medo da perda é comum. Em todos os casos eu tive conhecimento por meio de relatos de pessoas que viveram este tipo de relacionamento.”

Diante desses relatos não é difícil imaginar os problemas que enfrenta uma mulher para se relacionar com um homem mais jovem. A repressão sexual é um conjunto de interdições, permissões, valores, regras estabelecidas pelo social para controlar o exercício da sexualidade. E não é apenas algo que vem de fora, submetendo as pessoas. As proibições e interdições externas são interiorizadas e se convertem em proibições e interdições internas, vividas sob a forma de vergonha e culpa.

A questão é que quando a repressão é bem-sucedida, já não é sentida como tal e a aceitação ou recusa por um determinado tipo de comportamento é vivido como se fosse uma escolha livre da própria pessoa. Isso acontece muitas vezes quando a mulher se recrimina por desejar um homem que, como diriam os guardiões dos “bons costumes”, tem idade para ser seu filho. O curioso é que as mesmas pessoas que consideram inadmissível a relação amorosa de uma mulher de 40 com um homem de 20 não acham nada estranho quando o homem tem 30 anos mais do que a mulher.

Embora a moral sexual tenha sofrido grandes transformações, no inconsciente os antigos tabus ainda persistem. A mulher mais velha que o homem é um deles. A partir do surgimento do sistema patriarcal, há cinco mil anos, a mulher foi considerada uma mercadoria que podia ser comprada, vendida ou trocada. Era comum um acordo comercial entre o pai de uma moça e o homem que desejasse comprá-la para ter como esposa. Sua principal função era dar ao marido o maior número possível de filhos, para que estes o ajudassem futuramente no trabalho. Como a mulher tem um período limitado de procriação, só as muito jovens podiam ter tantos filhos. Mais uma vez, na história da humanidade, os interesses econômicos condicionaram o modo de pensar das pessoas, que passaram a enxergar como
verdade absoluta a necessidade de o homem ter mais idade do que a mulher.

Para Freud, o sofrimento humano tem três origens: a força superior da natureza; a fragilidade dos nossos corpos; e a inadequação das normas que regulam as relações mútuas dos indivíduos na família, no Estado e na sociedade. A doutrina de que há no sexo algo pecaminoso é totalmente inadequada, causando sofrimentos que se iniciam na infância e continuam pela vida afora. O filósofo inglês Bertrand Russel acreditava que mantendo numa prisão o amor sexual, a moral convencional concorreu para aprisionar todas as outras formas de sentimento amistoso, e para tornar os homens menos generosos, menos bondosos, mais arrogantes e mais cruéis.

Afinal, o que haverá de errado no prazer sexual se as pessoas chegarem ao trabalho na hora, obedecerem aos sinais de trânsito e não abusarem do bem-estar e da dignidade alheia? O psicoterapeuta e escritor José Ângelo Gaiarsa diz que uma das explicações possíveis para tanto controle da sexualidade alheia reside no fato de que, quanto mais o indivíduo amplia, aprofunda e diversifica sua vida sexual — e isso significa transgredir —, mais coragem ganha para fazer outras coisas, questionar outros valores. Começa a viver com maior vontade e decisão. Pode começar a se tornar perigoso. Ele conclui que não deve ser à toa nem por acaso que as forças repressoras de todas as épocas se voltaram tão sistemática e precisamente contra a sexualidade humana.

Hoje, com o questionamento do sistema patriarcal por homens e mulheres, começam a despontar novas formas de viver a sexualidade. Cada vez um número maior de pessoas busca o prazer por meio de relações sexuais mais livres, respeitando o próprio desejo e o modo mais satisfatório para os envolvidos sem se preocupar com os preconceitos, que afinal já deviam ter sido abolidos.

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