Marina Marquez – JORNAL DE BRASILIA
ENTREVISTA – OLGAMIR AMÂNCIA FERREIRA
Em 2010, 78,5% dos casos registrados criminalmente por mulheres foram de violência doméstica. Os números refletem a realidade dos últimos anos, nos quais o Distrito Federal tem sido recordista em ligações ao Disque-Denúncia para registrar casos de agressões em casa. A questão da violência doméstica contra a mulher na capital federal é uma das prioridades da recém-criada Secretaria da Mulher (SEM) do DF e será combatida com muito esforço e parcerias entre os espaços voltados para o tema, de acordo com a secretária da Mulher, Olgamir Amância Ferreira.
A secretária trabalha em projetos políticos voltados para as mulheres há mais de 20 anos, quando fundou a União Brasileira da Mulher. Olgamir é professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), doutora em políticas públicas e gestão da educação e secretária de Mulheres do seu partido, o PC do B. Investir da educação e profissionalização das mulheres também são projetos prioritários da pasta. “As mulheres hoje têm um nível de escolaridade maior que o dos homens no DF, mas isso não reflete no desenvolvimento profissional e nos salários. Vamos mudar esse quadro.”
Quais são os principais objetivos e prioridades da Secretaria da Mulher?
A secretaria foi criada pelo Governo do Distrito Federal com duas definições básicas. A primeira, é de formação e implementação de políticas públicas para as mulheres. A outra é a proteção e garantia dos direitos das mulheres, em diferentes frentes. E teremos várias parcerias nesses projetos. Com a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), os dez núcleos de atendimento jurídico nos Fóruns de várias cidades do DF, os centros de referência, que são os centros de atendimento à mulher, propriamente ditos, e a Casa Abrigo.
Apesar da escolaridade elevada, as mulheres no DF ainda ocupam menos cargos de direção e recebem salários menores. O que a secretaria pretende fazer para mudar esse cenário?
A ideia é trabalhar com um movimento combinado com outras secretarias. A Secretaria da Mulher terá o grande papel de fazer a interlocução e garantir que nas demais secretarias de governo o recorte de gênero seja abordado. Queremos ações concretas com a Secretaria de
Trabalho e outras de enfoque eco-nômico. Estamos criando, para isso, uma câmara técnica, de forma que tenhamos em várias secretarias representantes para fazer essa interlocução. Mas, além do investimento em capacitação e emprego, achamos muito importante fazer um investimento grande em educação. A mulher tem que ter acesso à educação em níveis diferentes de escolaridade. A nossa realidade já é positiva.
Como é essa realidade hoje?
Hoje, o nível de escolaridade da mulher tem crescido mais que o do homem, mas isso não se reflete profissionalmente. Em 2010, por exemplo, 83.233 mulheres cursavam o Ensino Superior na capital federal, enquanto 66.997 homens tinham a mesma escolaridade. No entanto, os postos de trabalho não são ocupados da mesma forma. O nível de desemprego entre as mulheres é quase o dobro do nível de desocupação entre homens. E ainda que tenhamos crescido o nível de escolaridade, há muitas mulheres sem acesso a essa escolarização. Vamos investir nisso, seja por meio das escolas técnicas, seja por cursos de formações específicos, direcio-nados para as demandas do mercado. Vamos aproveitar também o que o Governo Federal está anunciando de oferta de microcrédito, para que as mulheres possam desenvolver renda. Queremos uma educação na construção de um novo entendimento do que é ser mulher.
Como é esse novo entendimento da mulher?
Queremos trabalhar para ajudar a construir um novo entendimento sobre o papel da mulher e seu espaço na sociedade. Ainda hoje as escolas trabalham com um currículo voltado para uma sociedade machista, patriarcal. E o ser mulher é uma construção social. As tarefas vistas como “das mulheres” são construídas pela sociedade e a escola reproduz esse comportamento. Essa questão não é discutida no ambiente da escola. Queremos desmistificar essa questão dos gê-neros. E para mudar esse entendimento precisamos investir em cursos de pós-graduação desses professores, aprofundarmos pesquisas.
Existe algum projeto de governo para a questão da violência doméstica contra a mulher?
O GDF já evidencia sua preocupação, seriedade e sensibilidade com a violência doméstica ao criar a Secretaria da Mulher. Um outro elemento é a forma com que a secretaria nasce. Uma das nossas subsecretarias é de enfrentamento à violência, ou seja, temos um espaço maior de governo com essa tarefa primeira. E a partir disso, temos projetos no sentido de trabalhar fortemente a aplicação da Lei Maria da Penha. Precisamos que a lei seja aplicada efetivamente e criminalizar a violência doméstica, mostrando a essa mulher que existem medidas de apoio para que ela denuncie. Vamos dar um atendimento psicológico, porque uma mulher vítima de violência está fragilizada, além de atendimento da assistência social e bolsas vulnerabilidade, seja para garantir um local para ficar, e assistência jurídica e pedagógica, já que muitas vezes a mulher tem filhos e precisa de acompanhamento. Muitas vezes essa violência se refere apenas ao companheiro, mas a família, como um todo. Sem contar que muitas vezes a mulher sofre violência patrimonial, o que é comum, e nem sabe que isso é crime. São mulheres que perdem o controle de seus bens e até do salário. Trabalham e são obrigadas a entregar todo aquele dinheiro para o companheiro, ou mesmo filho.
A senhora falou em fortalecer a Casa Abrigo. Há projeto para ampliação da casa?
O governo já autorizou e vamos para outra casa. A Casa Abrigo é de extrema importância já que é uma forma de acolhimento para essas mulheres vítimas de violência e seus filhos. Vamos para uma casa maior, com melhores condições, que possa dar um atendimento mais digno para elas.
“Queremos trabalhar para ajudar a construir um novo entendimento sobre o papel da mulher e seu espaço na sociedade.”