Por: Helena Werneck
Desde o início a vida deste blog, chamamos a atenção sobre a fragilidade da presença humana nas cidades na sua versão globalizada. Passando pelos graves problemas de São Paulo, comentamos sobre a necessiade de se voltar ao planejamento urbano, especialmente diante dos grandes desafios internacionais que nos circundam : a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Desta vez, o Oscar da Tragédia chega ao Rio de Janeiro, já despertando – como sempre – a procura pelos culpados. O desfile de especialistas é imenso, cada qual alertando para o atenimento de uma ou outra questão, quase sempre pertinente. No entanto é mais fácil do que parece encontrar os culpados ou o culpado, até porque cabe a ele o destino do coletivo urbano : a administração pública que deixou a população morar em locais impróprios. No entanto, escapando deste local comum, sempre é de bom alvitre o dar-se dois passos para trás e forma a possibilitar a visão mais ampla e, como consequência, o seu ent endimento.
É bem possível que nos próximos 50 anos a Região Metropolitana de São Paulo concentre uma população maior do que a de Tóquio (Japão), hoje com mais de 26 milhões de habitantes. Felizmente, é improvável que ela acompanhe o ritmo de crescimento populacional projetado pelas Nações Unidas para Lagos (Nigéria), Jacarta (Indonésia), Dhaka (Bangladesh), Karachi (Paquistão) ou Bombaim, Nova Deli e Calcutá, na Índia. Essas grandes concentrações humanas acolherão as maiores populações do século XXI, ultrapassando, além de Tóquio, a Cidade do México e Nova Iorque (EUA), posicionadas como as maiores aglomerações urbanas durante boa parte do século passado. Por outro lado, no encontro do Forum Urbano Mundial que aconteceu exatamente na semana passada no mesmo Rio de Janeiro, especialistas informam que os pobres não são estúpidos. Ao migrarem do campo para as cidades, tendência mundial que muitos analistas veem como irreversível, fazem isso após ava liarem suas condições de vida em áreas rurais e compararem com o que encontrarão nas cidades.
As estatísticas dão razão a eles. Por isso, a tentativa de interromper o fluxo migratório tende a ser inútil, e o melhor a fazer é preparar as cidades para receberem essa população . O alerta é de um dos maiores especialistas mundiais em favelas, o sul-africano William Cobbett, que foi um dos principais palestrantes do 5º Fórum Urbano Mundial, realizado na semana passada, no Rio. Juntando-se os dados levantados acima, poemos concluir que:
- a urbanização acelerada se dará – principalmente – nos países considerados em crescimento hoje;
- podemos assumir que esta urbanização continuará a se dar nos moldes já conhecidos;
- que, possivelmente,continuaremos a distribuir o “Oscar” das tragédias urbanas.
Uma questão que desliza mais do que encosta no debate sobre as cidades é sobre a sua natureza no Brasil – vivemos em cidades capitalistas. Estamos acostumados a ver e a ler notícias onde desponta o fato da distribuição de renda, ascensão social, entre outros fatores de qulificação eminentemente econômicos. Na verdade, após todos estes anos e após ainda inúmeros debates e a realização de inúmeros diplomas legais, não conseguimos modificar o principal componente da nossa realidade – a natureza capitalista da cidade. Isto significa que a habitação deixa de ser condição e direito da população para se tornar mercadoria – à disposição de quem pode pagar. Neste caso, quem não pode pagar se dirige para as áreas onde a população com renda não quer ir (por vários motivos) ou, ainda, para´as áreas onde ninguém pode morar, além dos passarinhos, borboletas e o restante da fauna e da flora. Nesta hora absurda se pro curam os culpados..Seria bom le mbrar que o “milagroso” programa “Minha casa, minha vida” não decola nas grandes metrópoles por uma simples questão – faltam áreas adequadas para a realização de habitações que sejam prouzidas no valor para quem será o seu beneficiário. São e saudosa memória os textos do David Harvey, que há quase vinte anos atrás falava em justiça social e cidade. Recentemente a arquiteta Raquel Rolnik escreveu no “Le Monde Diplomatique Brasil” que não se poderia fazer habitação SEM urbanização. Isto significa oferecer não só habitação, mas comida, diversão e arte, além de ,claro, saúde, educação, trasporte e emprego. Ufa! É muita culpa, mas a pior, sem dúvida vai para o sistema capitalista urbano.
Para ele o Oscar da tragédia.
fonte: http://mulheres.pps.org.br/portal/showData/193488