28/06/2010
Fonte: Agência Brasil
Por Lisiane Wandscheer – Enviada Especial
Porto Alegre – Receber pela primeira vez a conta de luz na porta de casa fez com que Heloísa Monteiro Baraci, 55 anos, se sentisse parte da sociedade. Há 12 anos, ela foi morar sozinha depois de deixar o Hospital Psiquiátrico São Pedro, na capital gaúcha.“Quando vi a conta de luz fiquei muito feliz, não sabia se ria ou se chorava. Eu olhei bem se era pra mim e vi meu nome escrito na conta. É uma responsabilidade, né? Naquele dia eu era como outra pessoa da sociedade”, afirma.
A vida de Heloísa é parecida com a de outras pessoas que, em função de uma história pessoal marcada pela pobreza e pelos maus-tratos, ficaram isoladas por muitos anos em um hospital psiquiátrico. Aos 12 anos, Heloísa fugiu de casa e foi morar na rua porque era maltratada pela madrasta, com quem seu pai teve 11 filhos.
“Minha madrasta batia em mim, eu me tratava no posto de saúde e voltava pra casa. Até que eles acharam que não adiantava mais me tratarem para depois eu apanhar em casa de novo e me internaram no São Pedro”, conta.
Heloísa diz que superou as duas décadas de internação e conta que foi preparada para sair do hospital, mas alguns médicos eram contrários e diziam que ela não tinha condições.
“No dia em que saí, eu chorei. Eles diziam que eu não ia conseguir. ‘Não dou dois dias para você voltar para o São Pedro’, falavam, mas eu lutei e consegui. Tem muita gente lá dentro que podia estar aqui fora também”, destaca.
Heloísa retornou ao hospital, mas não para ser internada. Hoje, ela trabalha no local onde faz cafezinho e entrega medicamentos nas unidades médicas. Ela ganha R$ 250, além do benefício do programa de Volta pra Casa no valor de R$ 320 e de uma pensão, que divide com a madrasta, do pai que era policial militar. O dinheiro é administrado por uma tutora que a cada semana lhe repassa uma parte.
Ela paga R$ 22 mensais de prestação da casa própria, adquirida por meio de um programa habitacional da prefeitura de Porto Alegre. No quarto dela, há uma grande janela por onde entra muita luz. “Quando cheguei a minha casa a primeira coisa que fiz foi abrir a janela do meu quarto. No hospital não tem janelas para a gente abrir”, lembra.
Edição: Juliana Andrade e Lílian Beraldo
#Personagens da Loucura:
Histórias de pessoas que lutaram contra o estigma da doença, superaram o preconceito e conquistaram seu espaço
Essa matéria faz parte da série de reportagens especiais “Retratos da Loucura” produzida pela Agência Brasil
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