FERNANDO RIBEIRO – Diário do Nordeste
A violência que atinge o Ceará não poupou as mulheres. Assassinatos tiveram alta de 12,5% em comparação a 2009
Desfecho trágico: bombeiros recolhem em um matagal no bairro Sapiranga o corpo da jovem Marilene Gomes dos Santos, 23, que foi sequestrada e assassinada pelo ex-namorado
FOTOS: MIGUEL PORTELA
Dor e revolta: familiares da garçonete entra em choque ao descobrir que ela havia sido morta pelo homem que a perseguia
Violência: no velório de uma das garotas assassinadas em Quixeramobim, revolta e indignação dos amigos
FOTO: ALEX PIMENTEL
10/1/2011
Josilene, Marlúcia, Floriza, Josilena, Vânia, Vancarla, Jennifer, Cícera Rejane, Ivânia, Sara Sandra, Lauricélia, Cecília, Francisca, Rochelle, Valéria, Cláudia, Liliane, Glauciane, Jéssica, Juliana, Marcela, Regina Maria, Sheyla, Maria Júlia, Talita, Lidiane, Ana, Josefa, Idelzuíte, Lara, Natânia, Lenira…
A lista é extensa e poderia se alongar mais ainda no começo desta reportagem. Mas não se trata de um resultado de concurso público ou de vestibular. Os nomes acima são de algumas das 153 mulheres assassinadas no ano passado no Ceará. A onda crescente da violência e da criminalidade que
se abateu sobre o Estado nos últimos quatro anos não poupou as mulheres.
Adolescentes, jovens, adultas, de meia idade e anciãs, elas também vêm sofrendo com o avanço do crime neste Estado, a bem da verdade, a maioria delas vítima de crimes passionais.
Em relação a 2009, quando 136 mulheres foram vítimas de homicídio no Ceará, a morte violenta de pessoas do sexo feminino, em crimes dolosos no ano passado, teve um aumento da ordem de 12,5 por cento.
Nos últimos sete anos, conforme levantamentos feitos pela Reportagem, nada menos que 858 mulheres foram assassinadas no Ceará, uma média de 122 crimes por ano. A estatística abrange os crimes perpetrados na Capital cearense, sua região metropolitana e no Interior, conforme o cruzamento de informações obtidas nos registros de órgãos oficiais como a Coordenadoria de Medicina Legal (Comel), da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce), Comando do Policiamento do Interior (CPI), e delegacias de defesa e proteção à mulher.
Passionais
Seguindo uma tendência registrada em todo o País, a intolerância masculina tem sido o maior motivador dos assassinatos de mulheres no Estado. A maioria, são crimes praticados ´intramuros´, isto é, ocorrem dentro de lares.
São delitos difíceis de serem combatidos, pois, muitas vezes, as vítimas passam por um histórico de agressões físicas e ameaças e preferem não denunciar o caso às autoridades. E o pior, quando denunciam não encontram uma resposta efetiva da Polícia nem da Justiça. São muitos os exemplos disto.
Foi o que aconteceu, por exemplo, em outubro de 2010, quando a garçonete Marilene Gomes dos Santos, 23, foi encontrada morta depois de sequestrada pelo ex-namorado, o marceneiro Flávio Cavalcanti da Silva, 42, que suicidou-se após cometer o crime.
Os corpos de Marilene e do seu algoz foram encontrados em meio a arbustos numa região de mata no bairro Sapiranga, nesta Capital, depois de dias de buscas à jovem.
A família denunciou que o ex-namorado perseguia a jovem. Desesperada, ela chegou a registrar três Boletins de Ocorrência (B.Os.) contra o marceneiro. De nada adiantou.
Estatísticas
Dos 153 registros de mortes violentas de mulheres no Ceará durante o ano de 2010, 78 casos deles aconteceram na Capital, outros 45 crimes ocorreram no Interior do Estado e 30 na Região Metropolitana de Fortaleza. Somente no Cariri, foram 15 mulheres assassinadas, sendo cinco em Juazeiro do Norte, três no Crato, duas em Missão Velha, duas em Campos Sales, uma em Caririaçu, outra em Ipaumirim, e uma em Aurora.
Já na Grande Fortaleza, além dos 78 homicídios ocorridos na Capital, também houve o registro de mortes de mulheres nos seguintes Municípios: Caucaia, com 14 assassinatos; quatro em Aquiraz, quatro em Itaitinga, três no Eusébio, dois em Maranguape, além de um crime em Pacajus, um em Horizonte e outro na cidade de São Gonçalo do Amarante.
Os crimes vitimaram, pelo menos, 16 adolescentes. Foram elas: Maria Vancarla Nascimento da Silva, 15; Jennifer Almeida, 15; Jéssica Naiara Pereira de Souza, 16; Lidiane de Oliveira Barbosa, 16; Natânia Ribeiro do Vale, 17; Leilivânia Barbosa dos Santos, 16; Gleiciane Nascimento de Sousa, 13; Dayane Alves de Sousa, 17; Priscila Santos de Queiroz, 17; Maria Rosivânia da Silva, 16; Elizângela Gomes da Silva, 13; Roberlane de Sousa Nascimento, 17; Francisca Adenísia Porfírio da Silva, 14; Marliene Albuquerque da Silva, 15; Jennifer da Silva Pedrosa, 14; Ana Carolina Lopes, 14, e, ainda, uma adolescente cujo corpo, sem identificação, permanece numa geladeira da Coordenadoria de Medicina Legal (CML), em Fortaleza, desde a manhã do dia 30 de dezembro último, quando foi resgatado pelo Corpo de Bombeiros em uma área de mangue na Praia de Iparana, Município de Caucaia.
O cadáver já estava em putrefação e, segundo peritos, há a suspeita de que a garota tenha sido violentada, estrangulada e o corpo jogado no mangue para ocultação. Até ontem, ninguém havia reconhecido a garota.
Sangue derramado
78 mulheres foram vítimas de homicídio na Capital, em 2010. No interior ocorreram 45 crimes de morte e outros 30 nos demais municípios que compõem a Região Metropolitana de Fortaleza
15 adolescentes estão entre as vítimas da violência. Muitas delas foram atacadas, sofreram violência sexual e, logo depois, mortas. Uma delas permanece sem identificação em Fortaleza
DÍVIDAS DE DROGAS
Jovens fuziladas na Capital por ordem dos traficantes
Além dos crimes passionais, praticados por ex-maridos, ex-namorados e ex-companheiros, as mulheres, especialmente as adolescentes e jovens, também vêm sendo vítimas de execuções sumárias determinadas pelo tráfico de drogas.
As dívidas não quitadas são pagas com a própria vida. Em vários crimes que vitimaram mulheres em 2010 a motivação foi exatamente esta. Um dos casos ocorreu na zona oeste de Fortaleza, exatamente na tarde do dia 12 de dezembro último, quando uma garota de corpo franzino, usando roupas esportivas e calçando sandálias, foi fuzilada por ocupantes de um automóvel preto. O crime ocorreu na Barra do Ceará.
Quando a Polícia Militar chegou ao local do crime, encontrou uma forte cena. O rosto da vítima estava completamente desfigurado em consequência dos tiros de pistola calibre Ponto 40 (de uso restrito da Polícia) disparados pelos assassinos a queima-roupa. O cadáver da garota foi recolhido do local sem que ninguém a reconhecesse.
Somente no dia seguinte, a jovem era identificada na Coordenadoria de Medicina Legal. Tratava-se de Fabiana Santos Bezerra, que tinha 23 anos e morava não muito distante do local onde foi fuzilada.
Drogas
Coube à mãe da garota a dolorosa tarefa de fazer o reconhecimento do corpo da filha. Sem esconder sua tristeza, ela contou à Reportagem que a filha estavam envolvida no consumo de drogas, mas preferiu não comentar quem teria assassinado Fabiana ou quem seria o mandante do homicídio. Mortas
O duplo homicídio ocorreu por volta de 22 horas do dia 19 outubro último, quando uma casa situada na Rua Valdênia Soares, na Granja Lisboa, foi invadida por vários traficantes armados com revólveres e pistolas. Eles dispararam suas armas e mataram a dona-de-casa Antônia Pereira da Silva, 47; e a filha, Yara Pereira da Silva, 21, por conta de dívida drogas.
PERVERSIDADE
Crimes chocaram no Interior do Estado
Até hoje os moradores da localidade denominada Sossego, na zona rural do Município de Quixeramobim (a 206Km de Fortaleza), mostram-se indignados e chocados com uma cena trágica na estrada que dá acesso ao lugar. Na manhã do dia 10 de setembro, os corpos das adolescentes Roberlane de Sousa Nascimento, 17; e Francisca Aldenísia Porfírio da Silva, 14, foram encontrados no matagal.
A Polícia foi chamada ao local e passou a investigar o crime. Os corpos das duas garotas apresentavam vários golpes de faca. Somente Roberlane foi golpeada 23 vezes. A amiga dela foi esfaqueada no pescoço. Além disso, houve a suspeita de que a primeira sofreu violência sexual, pois estava semidespida.
As duas haviam ido a um comício na noite anterior e do local da manifestação política desapareceram, sendo encontradas mortas na manhã seguinte. Dias depois, a Polícia conseguiu pistas do suspeito do crime.
Seis dias depois, mais uma mulher foi vítima da violência no mesmo Município. Era a dona-de-casa Francisca Cleide saraiva de Oliveira, 30, que foi assassinada, com vários golpes de faca pelo marido, o agricultor Paulo Acésio Gomes.
Outro caso
Na Região do Cariri, um crime revoltou a população, quando a aposentada Maria Gertrudes da Silva Oliveira, 63, foi morta, a tiro, na zona rural de Campos Sales, durante um assalto. Os assassinos mataram a mulher para roubar R$ 100,00.
FERNANDO RIBEIRO
EDITOR DE POLÍCIA