Tatiana Félix *
Adital – Enquanto a mídia e a sociedade em geral aplaudem as operações militares e policiais na guerra contra o tráfico de drogas nas comunidades do Rio de Janeiro (RJ) desde a última semana, centenas de moradores sofrem violações, discriminações e tensão consequentes da guerrilha. A busca aos traficantes, o corre-corre, tiros e perseguições têm causado medo nos moradores e um verdadeiro clima de guerra nas ruas cariocas, chamado a atenção da mídia internacional para a cidade, cartão postal do Brasil.
Um comunicado oficial da Polícia Militar, divulgado no início da tarde desta segunda-feira (29), informou que entre os dias 22 e 28 já foram registradas 37 mortes, 118 prisões, 102 veículos queimados e 130 pessoas levadas para averiguação.
No entanto, de acordo com denúncias recebidas pela Rede Contra a Violência, em operação realizada na última quinta-feira (25) na comunidade do Jacarezinho, tiveram 8 mortes, mas, quase não houve prisões. “Em dois casos, ouvimos depoimentos de que foram execuções sumárias, sendo que em um deles um policial teria se aproximado de um jovem rendido e dito em tom debochado: “se tiver com cheiro de maconha na mão te mato”, cheirou a mão do detido e executou-o a tiros. Claro que as testemunhas não quiseram se identificar, mas o laudo cadavérico da vítima com certeza poderá confirmar ou não a execução com tiros a curta distância”, relatou.
Para a Rede, a presença da imprensa nacional e internacional, com foco em algumas comunidades, como no Complexo do Alemão, estaria inibindo violações à luz do dia. Mas, em comunidades como a do Jacarezinho e outras onde os serviços de água, luz e telefone estão cortados, a realidade é bem diferente. Segundo os moradores, os policiais estariam saqueando casas, em busca aos traficantes.
Isabel Cristina Ferreira, integrante da Rede contra a violência e defensora dos direitos humanos, disse que a grande ausência de direitos é uma permissão do Estado e da sociedade, que querem a situação assim. “Só aparecem na imprensa as pessoas que batem palma para o que está acontecendo, mas, não está aparecendo na mídia a violação e discriminação de negros e pobres, e das meninas que levam tapas na cara”, salientou.
Ela ressaltou que é preciso mudar a cultura e a forma de encarar estas operações violentas, para que pobres, negros e inocentes não sejam criminalizados e castigados por crimes que não cometeram. “Nunca vi tanta ausência de leis neste país. Mas como vamos reeducar o Sérgio Cabral [governador do estado], o presidente Lula e toda essa gente que tem o poder de decidir como vão acontecer as operações?”, questionou.
Para alcançar a mudança e a reeducação que mencionou, Isabel disse que a Rede contra a violência está fazendo um trabalho de sensibilização junto com outros movimentos sociais, para que todos possam fazer uma denúncia coletiva aos órgãos de direitos humanos, como Anistia Internacional, Organização dos Estados Americanos e à grande mídia internacional.
Ela sugeriu ainda que é preciso refletir sobre a questão da dignidade, valores, moradia e modo de vida da população, e que uma alternativa para deter o tráfico de drogas no Rio de Janeiro poderia ser encontrada conjuntamente por governantes e segmentos sociais, “para pensar nas mudanças que as comunidades querem e precisam”.
Quem quiser denunciar para a Rede contra a violência, basta entrar em contato através do e-mail: comunicação.rede@gmail.com ou pelo telefone (21) 2210-2906. A organização garante que é mantido o sigilo das fontes e que checa as informações das denúncias antes de divulgá-las.
* Jornalista da Adital