KÁTIA MELLO – Revista Época online
Um livro polêmico que une religião e sexo acaba de ser lançado nos Estados Unidos. God and Sex- What the Bible Really Says ( Deus e Sexo – O que realmente a Bíblia diz) de Michael Coogan, professor de religiões do Museu Semítico de Harvard e que fez pós-doutorado em Literatura pela Universidade de Harvard, discute a interpretação do sexo nos textos bíblicos. Coogan, que também é editor do livro New Oxford Annotated Bible, uma referência para os estudiosos de religião, diz que a Bíblia tem uma visão positiva sobre o sexo. Isso porque sexo estaria diretamente associado à reprodução. Em seu novo livro, o estudioso cita diversas passagens eróticas, como o Cântico dos Cânticos do rei Salomão.
Coogan discute o fato de os tradutores dos textos bíblicos terem imposto suas próprias visões e preconceitos quando traduziram do hebreu para outras línguas. Segundo o professor de Harvard, há palavras em hebreu que dão possibilidade para mais de uma interpretação, como mulher e esposa, que significam a mesma coisa. E seguindo essa teoria, o autor diz que não há como provar que Adão e Eva se casaram. Coogan ainda afirma que algumas religiões levam em consideração alguns capítulos do Livro Sagrado, enquanto menosprezam outras passagens que trazem uma diferente visão sobre o mesmo tema, como poligamia. Ele diz que nos escritos bíblicos em hebreu não há nada que nos assegure que devemos ser monogãmicos.
Ele também fala sobre o fato de não haver nenhuma passagem na Bíblia que condene o aborto. “Uma das coisas que eu acho mais interessantes é que no debate contemporâneo sobre o aborto, ambos lados citam e se apóiam na Bíblia como uma referência. Eles falam de versos em que não dizem nada sobre o aborto ”, disse Coogan em uma entrevista a revista Time.
Sobre a sexualidade de Deus, Coogan afirma que Ele é um ser sexual, mas no sentido metafórico e mítico. O estudioso também diz que quando a Bíblia foi escrita, no berço da civilização greco-romana, as pessoas eram menos puritanas. Uma das idéias que elas concebiam era o fato de um Deus vir a Terra e fazer sexo com um mortal.
Vou contar aqui uma pequena passagem da minha vida que tem muito a ver com essas diferentes interpretações bíblicas. Eu não tenho religião, mas venho de uma família bastante religiosa. A minha avó materna, aos 80 anos, um pouco antes de morrer, fundou uma nova igreja evangélica. Ela e um pequeno grupo deram uma nova interpretação à Bíblia em relação a como o Espírito Santo se comunica com os fiéis e, diante desta nova concepção, racharam com os líderes religiosos de sua comunidade. De longe, como espectadora, achei tudo muito curioso para uma mulher octogenária. Foram muitas as novas regras da igreja fundada pela minha avó. Entre as menores, porém não menos importantes, não era permitido nenhum objeto que representasse a natureza em sua forma artificial. Ou seja, minha avó deu fim a todas as toalhas floridas e vestidos estampados. Nunca entendi isso, mas sempre a respeitei. Minha amada avó se foi e sua igreja prosperou. E assim, com difrentes formas de interpretar o Livro Sagrado, se formaram novas religiões no Brasil e no mundo.
Em nosso país, assistimos a proliferação de muitas igrejas, principalmente, entre as neopentecostais. Portanto, acredito que as reflexões de Coogan são no mínimo inquietantes e oportunas. O estudioso deixa uma pergunta no ar, que a faço a vocês:
O que faz com que certas passagens bíblicas sejam relevantes, enquanto que outras que tratam do mesmo assunto sejam absolutamente desconsideradas? E, principalmente, como isso acontece com temas polêmicos, como aborto, homossexualidade e sexo?