Tatiana Félix *
Adital – Durante o “Curso para Formação de Agentes Multiplicadores no enfrentamento ao Tráfico de Pessoas“, que começou ontem (23), em Fortaleza, no Ceará, um dos temas debatidos foi “Compartilhando experiências: o enfrentamento ao tráfico de órgãos”.
Foi convidado para falar sobre o assunto, o Procurador da República em Fortaleza, Samuel Arruda. Ele iniciou sua palestra afirmando que “o tráfico ilegal de órgãos existe sim e não é ficção”. Mas, ele fez um esclarecimento: “nós devemos sempre diferenciar o tráfico de pessoas para fins de remoção e o tráfico de órgãos, que engloba apenas a venda de órgãos, e não necessariamente o tráfico de pessoas”.
Ele informou que nos casos de tráfico humano para retirada de órgãos, a pessoa é transportada para outro país, onde seu órgão é retirado com consentimento ou, nos casos mais graves, sem consentimento da vítima. Samuel afirmou que o “tráfico de pessoas para fins de remoção de órgãos é fruto do desenvolvimento da medicina”. Os casos mais comuns são de retirada de rins.
O Procurador da República citou um caso que teria acontecido em Recife, em Pernambuco. Segundo ele, em uma ocasião foi divulgada uma oferta para compra de rins e a procura de pessoas querendo vender os seus órgãos teria sido tão grande que logo o preço ofertado baixou.
“Isso demonstra o desespero das pessoas pobres em busca de uma renda extra e o desejo de entrar no mercado de consumo”, informou. De acordo com ele, existem, pelo menos, 20 mil pessoas traficadas para fins de remoção de órgãos, e a Índia é o país que aparece como o local que mais tem “doadores”.
Sobre as pessoas que se voluntariam para doar órgãos, Samuel alertou: “a doação de órgãos não pode ser comercializada. Só se admite doação estimulada por bondade e amor”. “É importante dizer que existem leis rigorosas contra o tráfico para fins de retirada de órgãos”, avisou.
Outros temas abordados ontem foram ‘Direitos Humanos e Tráfico de Pessoas’, e ‘Diversidade Sexual e o Tráfico de Pessoas’. Dimitri Sales, coordenador de Políticas para a Diversidade Sexual, da Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo, foi o convidado para falar sobre estes assuntos.
Segundo Dimitri, “direitos humanos é uma questão cultural”, pois, “para algumas pessoas, direitos humanos servem para proteger bandidos, já para outras, direitos humanos é proteção da vida”. Ele afirmou que a sociedade sempre está descobrindo novos direitos.
Um ponto bastante ressaltado pelo palestrante foi a questão da cultura machista, que define o papel de cada um na sociedade, e dá poder apenas ao homem. “Desde criança aprendemos que a mulher serve e o homem manda. Por exemplo, quando um casal heterossexual se casa, o que vemos é o pai levar a mulher pelo braço e entregá-la para o marido, é uma transferência de dominação”, esclareceu.
E é por causa desta dominação, que as mulheres e a população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros) sofrem explorações e violações de direitos, dentro de uma cultura baseada em órgãos sexuais, e não no caráter da pessoa.
O Curso de formação de agentes acontece até hoje (24), na sede do Banco do Nordeste (BNB), em Fortaleza. Cerca de 100 pessoas estão sendo capacitadas para atuar na prevenção ao tráfico de seres humanos na região. A iniciativa é do Instituto de Estudos de Direito e Cidadania (IEDC).
* Jornalista da Adital