JANAYDE GONÇALVES – Diário do Nordeste (Ceará)
Seja para fins de exploração sexual ou trabalho escravo, moças e rapazes são aliciados no Estado
PERFIL DAS VÍTIMAS: os principais destinos das moças e rapazes, além das cidades do litoral cearense, são países estrangeiros, como Portugal, Itália e Holanda
JULIANA VASQUEZ (20/06/2007)
21/8/2010
Atraídos por promessas de emprego, falsas histórias de amor ou pelo simples interesse de viajar e conhecer grandes capitais, centenas de moças e rapazes naturais do Ceará, caem, com frequência, nas “garras” das redes especializadas em aliciamento de pessoas para fins de exploração. No último levantamento feito pela Escritório de Enfrentamento e Prevenção ao Tráfico de Seres Humanos e Assistência à Vítima (EEPTSH), da Secretaria da Justiça do Ceará, chega a 855 o número de pessoas que foram atendidas pelo órgão nos últimos três anos.
Esse dado refere-se àquelas moças e rapazes que contam com a sorte de familiares ou amigos que buscam ajuda. Partem deles as denúncias que levam a Sejus e outras entidades a realizarem as buscas, na tentativa de trazer de volta esses jovens para seus lares.
Na maioria das vezes, são garotas que saem de Fortaleza, Juazeiro do Norte, Aracati, Pindoretama, Quixadá, Caucaia e outros municípios na aventura de irem a lugares diferentes, ganhar dinheiro para fazer compras e, algumas vezes, ajudar a família. O perfil das vítimas, levantado pela Secretaria da Justiça do Ceará, aponta que os principais destinos dessas moças e rapazes, além das cidades do litoral cearense, são países estrangeiros, como Itália, Holanda e Portugal.
A idade, na maioria dos casos, varia entre 18 e 35 anos. No entanto, não deixam de surgir, repetidas vezes, adolescentes que são induzidas à exploração sexual. Um exemplo que chamou a atenção dos profissionais do Escritório de Enfrentamento ao Tráfico foi o das irmãs Talita e Taís (os nomes usados são fictícios), de 13 e 14 anos. A história de terror começou quando Talita foi seduzida por um policial. Quando descobriu a situação, a mãe tentou afastar a filha do homem, no entanto, as irmãs revoltaram-se contra ela e, em pouco tempo, já estavam numa casa de praia, no Pecém, sem conseguir retornar. Uma das amigas foi ao local e conseguiu fazer a denúncia para a mãe, que procurou a Sejus.
Até que o cativeiro fosse “estourado”, vários órgãos parceiros atuaram juntos – Polícias Militar e Civil, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Delegacia de Combate aos Crimes de Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). As meninas estavam, como outras, sendo exploradas sexualmente. Seis pessoas foram presas. Talita e Taís voltaram grávidas, com marcas de fortes agressões.
Mudança de vida
Hoje, após atendimento psicossocial e acompanhamento do Escritório de Enfrentamento e Prevenção ao Tráfico de Seres Humanos e Assistência à Vítima, as meninas tiveram seus filhos e trabalham com venda de produtos alimentícios
NÚMEROS DO CRIME
2008
Denúncias: 200
Nº de Atendimentos: 413
Prisões: 02 (Eusébio, Mauriti)
2009
Denúncias: 460
Nº de Atendimentos: 413
Prisões: 08 (Fortaleza, Pindoretama, Cascavel, Várzea Alegre, Juazeiro do Norte, Crato, Pecém, Canindé)
2010
Até 20 de agosto
Denúncias: 224 (até o momento)
Nº de atendimentos: 353
Prisões: nenhuma
Principais destinos:
Itália, Holanda, Juazeiro do Norte e Crato, Portugal (Fonte: Sejus-CE)
VIAJOU PARA ESTUDAR
Moça sumida por três anos
Nos últimos três anos, o número de denúncias de tráfico de pessoas tem aumentado significativamente no Ceará. De 2008 para 2009, os registros duplicaram e, neste ano, já chegam a 224 ocorrências.
Desde que começou o trabalho, em 2005, a coordenadora estadual do EEPTSH, Eline Marques, já concluiu vários atendimentos. Mas alguns permanecem abertos, aguardando novas informações da Polícia Internacional (Interpol). Um deles é o de Adriana (nome fictício). Sem enviar notícias à mãe e à irmã por mais de três anos, a moça saiu de casa ao 22 anos para estudar língua estrangeira. Neste mês, Eline Marques conseguiu fazer contato com a moça. Ela foi encontrada numa boate em Milão (Itália). Disse estar bem e trabalhando no hotel do esposo. De acordo com a coordenadores, muitas meninas viajam iludidas com a possibilidade de ganhar um bom salário e fazer turismo.
Quando se dão conta, já estão com o passaporte retido, sendo acompanhadas por seguranças e induzidas ao consumo de drogas ou a contrair dívidas que não podem pagar.
Aquelas que se envergonham da situação, acostumam-se ou sentem-se muito temerosas em procurar ajuda. De acordo com o Ministério da Justiça, a maioria dos casos, 92%, relacionam-se à exploração sexual de mulheres, sejam elas muito jovens ou mais maduras.
VISITA AO ESTADO
SNJ vem acompanhar aplicação de recurso
Em outubro deste ano, o Ceará deve receber a visita de representantes da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ). Com o objetivo de acompanhar a execução dos R$ 268.125,00 investidos no Estado para o combate ao crime de tráfico de pessoas, a visita também inclui a avaliação do trabalho de formação da rede de atendimento às vítimas.
De acordo com a coordenação do EEPTSH, Eline Marques, a verba proveniente do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) está sendo destinada ao aparelhamento do núcleo, à aquisição de transporte e à realização de campanhas. Estão previstos, ainda, quatro seminários estaduais a fim de mobilizar e sensibilizar as comunidades em relação ao tema, bem como fortalecer a aproximação dos atores sociais que compõem a rede de combate ao tráfico. Além dessa verba, o EEPTSH conta também com recursos da Secretaria de Políticas para as Mulheres.
JANAYDE GONÇALVES
REPÓRTER