Desirèe Luíse – Portal Aprendiz
De acordo com a ouvidora da Secretaria para as Mulheres, Ana Paula Gonçalves, a agressão contra a mulher durante uma briga de casal ainda é considerada algo comum pela maioria das pessoas. Há a naturalização da violência doméstica. “Por trás disso tem uma questão cultural. O homem tem o sentimento de posse com relação à mulher, que se manifesta por meio da violência”, afirma.
“Também por uma questão cultural observamos que a mulher traz para si a culpa. Na maioria dos casos, a mulher justifica dizendo ‘eu provoquei’ ou afirma que ele estava bêbado, que está desempregado ou que estava nervoso. Ao contrário, quando você sofre violência no âmbito público, não vai justificar com nada. A própria sociedade coloca o crime da violência doméstica como se pudesse justificá-lo citando causas”, completa.
De janeiro a junho, a Central de Atendimento à Mulher registrou 343.063 atendimentos, o que representa um aumento de 112% na comparação com o mesmo período de 2009 (161.774). Entre os crimes relatados estão violência física, moral, sexual, patrimonial e psicológica. Metade das mulheres afirma correr risco de morte.
A procura pelo Ligue 180 é espontânea, por isso o volume de ligações não se relaciona diretamente com a incidência de crimes ou violência. De acordo com a Secretaria para as Mulheres, a busca pela Central reflete uma maior divulgação do serviço. “Elas se sentem mais encorajadas. Algo importante é que não precisam se identificar”, diz Ana Paula.
Das pessoas que entraram em contato com o serviço, 14,7% disseram que a violência sofrida era exercida por ex-namorado ou ex-companheiro, 57,9% estão casadas ou em união estável e em 72,1% dos casos as mulheres relatam que vivem junto com o agressor.
Quatro em cada dez mulheres que recorrem ao Ligue 180 são vítimas de agressão desde o início do relacionamento. A violência é diária em 57% dos casos.
Os números também mostram que 68,1% dos filhos presenciam a violência e 16,2% sofrem violência junto com a mãe.
Violência por estado
Em números absolutos, São Paulo lidera o ranking com 47.107 atendimentos, seguido pela Bahia com 32.358. Em terceiro lugar aparece o Rio de Janeiro com 25.274 dos registros.
Quando considerada a quantidade de atendimentos relativos à população feminina de cada estado, o Distrito Federal é a unidade da federação que mais entrou em contato com a Central, com 267 atendimentos para cada 50 mil mulheres. Em segundo lugar, aparece o Tocantins com 245 e em terceiro, o Pará com 237.
Mais denúncias
Ana Paula acredita que diversos fatores contribuem para impedir que aumente a busca por ajuda. Além de ser necessário ampliar o acesso à informação, também é preciso proporcionar condições de acesso à justiça, “porque sem ser acompanhada, a mulher se sente insegura, já que não sabe o que vai acontecer com ela”.
O primeiro e único Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher completou em julho um ano e meio de funcionamento. “É preciso atendimento especializado. Porque no caso da mulher que não denuncia na primeira agressão, quando vai fazer isso, passaram-se dez anos e o profissional que ouve aquilo considera irrelevante. É importante que haja um olhar mais específico para uma visão complexa”, ressalta a ouvidora.
Nos quatro anos de funcionamento da Central da Mulher, foram registrados 1,2 milhão de atendimentos. O Ligue 180 atende 24 horas por dia, de segunda-feira a domingo, inclusive feridos. A ligação é gratuita e o serviço é de âmbito nacional.
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