Por Cesar de Oliveira (3/8/2010) – Consultor Jurídico
O juiz substituto Luiz Carlos da Costa, de Cuiabá, autorizou o aborto de uma grávida de 32 semanas cujo feto tinha má-formação, com anomalia complexa da parede corporal e membros. De acordo com a decisão, o voto do ministro Carlos Ayres Britto, Supremo Tribunal Federal, sobre feto anencéfalo é “perfeitamente aplicável no caso analisado, porque a probabilidade de vida fora do útero se evidencia, a luz da ciência, ausente”. O voto do ministro se deu no julgamento em que o Plenário do Supremo cassou a liminar concedida na ADPF 54.
O quadro do feto, conforme a decisão, é um “anomalia complexa de parede corporal e membros (limb-body wall complex) compreendida por ausência de parede abdominal anterior, agenesia de coluna lombar e sacral, pé torto a esquerda, amputação da perna a direita com pé do mesmo lado malformado, tórax hipoplásico e artéria umbilical única”. Por conta disso, o juiz alegou que o problema é seguramente incompatível com a vida extra uterina. “Caso a gestação venha a prosseguir, todos os dados da literatura médica apontam para a morte do recém-nascido após o parto dentro de algumas horas ou dias de vida”, afirmou o juiz.
Na argumentação, ele questiona se o aborto deve ser autorizado somente nos casos de risco de vida para a gestante ou decorrente de estupro fixado limite temporal, conforme o Código Penal (artigo 128, I e II). Para ele, a resposta é não. A Constituição Federal não pode ser interpretada com a viseira da lei infraconstitucional.
O juiz entende que o princípio da dignidade humana garante o direito do não-sofrimento inútil. Diante disso, “obrigar uma mulher a levar a termo gravidez sem qualquer prognóstico de sobrevivência do feto é impor a ela fardo maior do que a sua capacidade de suportar, o que traduz em lancinante dor moral que tangencia à própria tortura”.
Diz ainda na decisão que “na hipótese de aborto autorizado pela legislação infraconstitucional não há limite temporal, por mais forte razão não se pode impor, quando ele decorre com base em fundamento constitucional”.
O pedido
A defesa da autora da ação alegou que “diante da gravíssima má-formação fetal incompatível com a vida extra uterina, estar-se-á diante de um ser considerado morto desde a constatação de sua anormalidade, a primeira argumentação, conclui-se que inexiste afronta ao direito à vida, pois apesar de o feto ser, nestes casos, biologicamente vivo, a verdade é que é juridicamente morto dada as condições apontadas pelos médicos. Não há que se falar em direito à vida do feto em contraposição aos direitos da gestante, já que ele não sobreviverá fora do útero materno”.
Outro argumento usado pela defesa é que se é possível a doação de órgãos de uma pessoa declarada encefalicamente morta, “por qual razão não haveria de permitir a antecipação do parto quando já se sabe que a vida do feto é inviável fora do útero?”.