Papel da mulher na eleição alcança centro do debate político no Brasil

Thiago Guimarães e Maria Angélica Oliveira – Do G1, em São Paulo

Candidatas competitivas e predomínio do voto feminino marcam pleito. Dianteira de José Serra entre eleitoras movimenta campanha petista.

Quase 80 anos após as brasileiras conquistarem o direito ao voto, a mulher está no centro do debate político da eleição presidencial deste ano.

Pela primeira vez, duas mulheres – a ex-ministra Dilma Rousseff (PT) e a senadora Marina Silva (PV) – estão entre os três principais candidatos. Pela última pesquisa do Ibope, ambas somam 46% das intenções totais de voto.

Mas até agora o preferido das eleitoras é José Serra (PSDB). O ex-governador alcança, segundo o Ibope, 38% dos votos entre as mulheres, contra 33% de Dilma e 10% de Marina.

 

 

Maioria do eleitorado brasileiro desde as eleições de 2000, as mulheres representam hoje 51,8% dos votantes no país. São 69,4 milhões de votos femininos e 64,4 milhões de eleitores homens (48% do total).

A vantagem atual de Serra entre as mulheres alimenta o debate sobre questões de gênero na eleição e movimenta as campanhas, que reforçam a busca ao voto feminino.

Militantes do PTMilitantes do PT na convenção que lançou Dilma
Rousseff à Presidência (Foto: Reprodução)

Exemplo dessa aposta ocorreu na convenção do PT que oficializou a candidatura de Dilma à Presidência. A mulher foi o tema do encontro de 13 de junho, que exibiu vídeo com brasileiras que marcaram época, como a compositora Chiquinha Gonzaga (1847-1935).

“O Brasil do Lula será governado com a alma e o coração de uma mulher”, disse Dilma na ocasião. Como parte da estratégia, a candidata cita a filha e o futuro neto em entrevistas e já até cozinhou omelete na TV.

Para o cientista político Antonio Lavareda, filiado ao PSDB e especialista em campanhas eleitorais, a ênfase na mulher é uma “escolha inteligente do PT”.

“É uma forma de mobilizar a emoção para a campanha da Dilma, que é uma candidata sem muito carisma”, afirma.

Hipóteses para baixo rendimento
Lavareda enumera duas possíveis razões para o “gap” [disparidade] de gênero na performance de Dilma.

Uma delas é o suposto desconhecimento de Dilma – e de sua condição de candidata de Lula – entre as eleitoras mais pobres. Na última pesquisa Datafolha, 71% dos entrevistados citaram a ex-ministra como o nome apoiado pelo presidente.

Outra possível razão é a “herança” de Lula. Considerando as pesquisas mais próximas da votação, o presidente sempre teve menos votos entre as mulheres nas cinco eleições majoritárias que disputou.

O voto por gênero nas últimas eleições presidenciais (em %):

Ano Candidato Homens Mulheres
1989 Fernando Collor (2o turno) 55 52
1994 Fernando Henrique Cardoso (1o turno) 54 55
1998 Fernando Henrique Cardoso (1o turno) 61 58
2002 Lula (2o turno) 59 69
2006 Lula (2o turno) 57 63


Fonte: livro “Emoções Ocultas e Estratégias Eleitorais”, de Antônio Lavareda

O consultor em marketing político Chico Santa Rita aposta na primeira hipótese como motivo das dificuldades de Dilma e minimiza o peso do gênero na votação. Diz que a votação de homens e mulheres nos candidatos tende a se equilibrar no decorrer da campanha.

“A questão de gênero não existe na eleição”, afirma.

Em busca do voto feminino
O presidente do PT, José Eduardo Dutra, também diz acreditar na tendência de equilíbrio dos votos ate a reta final da campanha. Reconhece, contudo, que as eleitoras demandam  “mais cuidado” para serem conquistadas.

“A mulher demora mais a se definir, é mais desconfiada, quer mais informação. Pesquisas mostram que há mais indecisas do que indecisos”, afirma Dutra, para quem esse dado explica a diferença atual entre Dilma e Serra no eleitorado feminino.

“Quando se faz pesquisa perto da eleição há uma apr

oximação muito grande dos votos de homens e mulheres para o mesmo candidato. Não acho que tenha essa definição de voto diferente, de mulheres e de homens”, diz.

Militantes do PVApoiadoras do PV em Nova Iguaçu (RJ) durante
lançamento de Marina Silva (Foto: Divulgação)

De olho nos votos das mulheres, o PV prepara nova rodada de pesquisas qualitativas para definir estratégias para aproximar Marina Silva das eleitoras.

O coordenador da campanha verde, João Paulo Capobianco, diz que há uma identificação de Marina – que teve infância pobre no Acre e foi analfabeta até os 16 anos – com mulheres pobres e excluídas.

“Há uma identidade muito forte entre esses grupos de mulheres pobres que têm uma preocupação grande com o futuro e que querem buscar caminhos diferentes”, afirma.

Capobianco diz que a pressão pela ampliação do espaço das mulheres na política e a grande população mestiça no país abrem uma “janela de oportunidade” para a candidatura. Na convenção do PV, Marina reuniu os dois componentes para afirmar que quer ser a primeira presidente negra do país.

PSDB aposta em atuação de Serra na Saúde
Vice-presidente do PSDB e responsável pela coordenação da agenda de Serra, a senadora Marisa Serrano (MS) relaciona a dianteira do tucano entre o eleitorado feminino com a atuação do ex-governador como ministro da Saúde no governo Fernando Henrique Cardoso, cargo que ocupou de 1998 a 2002.

Militante do PSDBSimpatizante do PSDB concede entrevista em
encontro do partido (Foto: Reprodução)

“As mulheres são muito tocadas por essa questão [saúde]. Geralmente, elas veem isso como uma questão prioritária”, diz.

Na quinta-feira (17), o programa partidário do PSDB destacou o currículo de Serra, sobretudo seu período na Saúde.

O tucano foi citado como o homem que enfrentou laboratórios para implantar os genéricos, como idealizador da campanha de vacinação de idosos contra a gripe e de mutirões de detecção de doenças.

Ex-vereadora, deputada e vice-prefeita, a senadora diz nunca ter usado o apelo de gênero em campanhas e critica o discurso de Dilma. “Eleição não é questão de gênero, como não é  questão de etnia, de raça, de credo religioso. A escolha deve ser feita em cima da competência, do comprometimento e da seriedade.”

Agendas diferentes
Embora divirjam sobre a existência ou não de um “voto feminino”, analistas consultados pelo G1 destacam que homens e mulheres tendem a priorizar assuntos diferentes ao votar.

“A mulher decide a partir de temas relacionados à experiência cotidiana, como saúde e educação”, afirma o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília.

Já os homens, afirmam Fleischer e o cientista político Antonio Lavareda, são mais afeitos a assuntos de economia e política.

“A experiência no abastecimento de bens e serviços da casa e as relações interpessoais, mais frequentes nesse gênero [feminino], suprem muito da informação que os homens só conseguem nos noticiários”, afirma Lavareda.

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