Em resposta ao trote homofóbico da semana passada de veteranos de engenharia contra calour@s de arquitetura, alun@s homossexuais fazem manifestação e dão novo colorido à universidade. A instituição deverá lançar cartilha contra o conflito entre gêneros
Monique Renne/CB/D.A Press |
Homens com homens, mulheres com mulheres e homens com mulheres. A formação dos casais não importava na passeata contra o preconceito aos homossexuais que tomou conta da UnB |
A Universidade de Brasília (UnB) ganhou um colorido diferente no início da tarde de ontem. O cinza do concreto deu espaço às cores do arco-íris, estampadas em bandeiras do movimento de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros (LGBTTT) e faixas de repúdio ao preconceito sexual. Com apitaço, batucada e gritos de guerra, centenas de estudantes de vários cursos fizeram uma passeata pelo câmpus da Asa Norte em protesto contra a homofobia e o machismo na instituição. A manifestação culminou com um beijaço na Faculdade de Tecnologia. Valeu tudo: homem com homem, mulher com mulher e homem com mulher. O ato foi uma resposta ao trote homofóbico realizado por alunos de engenharia civil contra colegas do curso de arquitetura e urbanismo na semana passada.
Segundo um dos organizadores da passeata, o estudante de arquitetura Luiz Eduardo Sarmento, 21 anos, o trote foi a gota d`água para mobilizar um grupo maior na luta contra a homofobia. Ele destaca que, apesar do seminário UnB Fora do armário, na última semana, a discussão não chegou às pessoas preconceituosas e muitas nunca tinham visto um beijo gay. “Queremos colocá-las em contato com o que não veem e tentam negar que exista”, explicou. Participante do beijaço, a estudante de ciências sociais Lívia Aquino, 20, acrescentou que é preciso mostrar que os gays estão por todo lado. “Não adianta ignorar ou achar ruim.”
A chegada à Faculdade de Tecnologia, onde se concentram os cursos de engenharia da UnB, foi barulhenta. Mas, como era no horário de almoço, a maioria das salas estava vazia. Os manifestantes fizeram uma parada estratégica em frente ao centro acadêmico de engenharia civil, bateram na porta e colaram adesivos com os dizeres “universidade sem homofobia”. Quem estava do lado de dentro não gostou. “Acho uma palhaçada. A gente tem a nossa opinião e eles têm a deles”, observou o estudante Gabriel Morais Roriz, 21 anos. O aluno de mecatrônica Diogo Nazzetta, 20, defendeu que a homofobia não pode ser generalizada. Ele apoia o movimento, porém condena a rixa entre os cursos de humanas e exatas.
Na passagem pelo câmpus, manifestantes picharam uma parada de ônibus com a frase “O Brasil é o país que mais mata LGBTTTs no mundo. Homofobia não é brincadeira”. As paredes do Minhocão ganharam rabiscos com dizeres como “Não à homofobia”. Espalhados em murais, cartazes de eventos da engenharia, como Eletrochurras e Unibeer, também receberam riscos de spray, sob o argumento de que são eventos machistas. O aluno de geografia Hugo Molina, 23 anos, criticou a atitude. “Eles têm todo o direito de se manifestar, mas têm que ser comedidos e não depredar o patrimônio alheio”, afirmou.
Os jovens do protesto se envolveram em uma discussão com alunos de agronomia, após colarem a bandeira do orgulho LGBTTT e vários adesivos na placa do centro acadêmico dos colegas, conhecidos por realizarem trotes humilhantes. “Acho uma falta de respeito fazerem isso. É um protesto ou um confronto?”, questionou o estudante F.S, que pediu para não ser identificado. Ele afirmou que não sofre preconceito na faculdade pela opção sexual.
Cartilha
A manifestação terminou no prédio da reitoria, onde os participantes cobraram uma postura institucional contra o preconceito. A decana de assuntos comunitários, Rachel Nunes, afirmou que a administração da universidade está fazendo sua parte. Na última quarta-feira, Rachel se reuniu com representantes do curso de engenharia civil para discutir o trote homofóbico(1) da semana passada. A decana firmou o compromisso de encaminhar uma cartilha de combate ao trote violento para divulgação em toda a Faculdade de Tecnologia. A ideia é também repassar o material a todos os centros acadêmicos da Universidade de Brasília.
Não foram só os homoafetivos que tiveram espaço na manifestação de ontem. Junto com alguns colegas, o estudante de estatística Pedro de Lima, 23 anos, improvisou um cartaz que dizia: “Orgulho hetero”. A frase foi exibida durante a concentração dos manifestantes no Minhocão Norte. “Faço isso para mostrar que tem pessoas que não são gays”, justificou. Para ele, o protesto foi uma bagunça. “Eles se colocam como se fossem politizados, mas o que querem não é ser tratados de forma igualitária, mas com privilégio”, afirmou. A posição de Pedro foi questionada por alunos homoafetivos.
Enquanto participava do protesto, uma estudante, que preferiu não se identificar, recebeu ameaças por telefone de um homem, cujo número era confidencial. Ele dizia saber que a jovem era lésbica e saber onde ela mora. Além de xingá-la, a pessoa afirmou que a estudante “morreria de tanto apanhar”. A ocorrência ainda não foi registrada em delegacias. Para Luiz Eduardo Sarmento, a ligação demonstra a violência com que os homossexuais são tratados na universidade e servirá para fortalecer a luta contra a homofobia.
1 – Excessos
No último dia 20, o trote dos calouros do curso de engenharia civil abusou de palavras de ordem ofensivas contra os colegas de arquitetura, sob a regência dos veteranos. O caso ocorreu na semana em que a UnB promoveu uma série de atos contra a homofobia e no dia seguinte à marcha nacional que defendeu a aprovação do Projeto de Lei nº 122, em tramitação na Câmara Federal, que prevê a criminalização da homofobia. A diretora de esporte, arte e cultura do DAC, Lucila Souto, garantiu uma posição mais ativa da universidade com relação às denúncias apresentadas à instituição
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