Céli Regina Jardim Pinto*
Nunca se falou tanto na importância do voto da mulher como agora. De um momento para o outro, a mídia e os institutos de pesquisa acordaram para o fato de que mais da metade do eleitorado brasileiro é composto por mulheres, daí que o voto da mulher importa.
E isto realmente é uma novidade, pois até agora o voto da mulher não era levado em consideração pelos candidatos como uma variável fundamental. Também a própria ausência da mulher na vida política parlamentar não preocupava os formadores de opinião e principalmente os partidos políticos. Somos hoje um dos países de menor presença de mulheres no parlamento. O Brasil ocupa o lugar 148 no ranking de mulheres no parlamento, em um total de 180 países. Nossos índices se assemelham aos dos países muçulmanos, onde, como é sabido, as mulheres têm enormes restrições para participar do mundo público. Na Argentina, por exemplo, as mulheres são 40% dos parlamentares; no Brasil, 9%.
Aqui não é o espaço para discutir esta complexa questão, mas para levantar outro problema que tem vindo acoplado à “novidade” do voto da mulher, que é o fato aferido pelas pesquisas de opinião de que as mulheres votam menos em mulher do que os homens. São muitas as possibilidades de respostas, que transitam do preconceito das mulheres em relação às próprias mulheres na política até a ideia de um voto mais consciente e estudado e não definido muitos meses antes da eleição. Há inclusive estudiosos que apontam a íntima relação da mulher com a TV para afirmar que as eleitoras só definem o voto depois da propaganda eleitoral gratuita.
Tenho acompanhado as campanhas das candidatas mulheres a todos os cargos no Rio Grande do Sul e mesmo fora dele nos últimos anos, e minha conclusão é um pouco diversa. Analisando as campanhas das candidatas na TV, no rádio, na internet, em panfletos, penso que uma das mais fortes razões para as mulheres não votarem em mulheres é o fato de que as candidatas mulheres não se apresentam como tal. Daí não haver razão para que as mulheres considerem na sua decisão de voto o fato de que um candidato seja mulher.
Após 30 anos de feminismo e de importantes vitórias das mulheres, feministas ou não, tanto no campo dos direitos quanto no campo de comportamento, chega às raias do incompreensível o fato de as mulheres que se propõem a prefeitas, governadoras e presidente não falarem para as mulheres e para os homens como mulheres. Quando as candidatas tiverem consciência de que chegaram até onde chegaram não só pelos méritos individuais, que todas, evidentemente, têm, mas como resultado de uma luta de mais de 30 anos do movimento das mulheres pelo direito de existir plenamente como cidadã, certamente se apresentarão como candidatas mulheres. Neste momento, as mulheres começarão a votar nas mulheres.
* Professora do Departamento de História da UFRGS, doutora em Ciência Política e pesquisadora convidada na Universidade Livre de Berlim, Alemanha
Artigo publicado no jornal ZERO HORA em 6/5/2010
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