Dia das Mães é fonte de estresse para quem quer engravidar e não consegue

Tatiana Pronin
Editora do UOL Ciência e Saúde

Mamães bonitas e sorridentes, emocionadas ao abrir o presente que o filho carinhoso traz no colo do pai. Em época de Dia das Mães, essa é uma das cenas mais repetidas nos anúncios publicitários. Para quem tenta ter um filho e não consegue, essa overdose de referências ao universo materno invariavelmente se transforma em fonte de frustração.

 

Sandra Aparecida Paulino, que tem 42 anos e passou 11 deles tentando engravidar, sabe bem o que é isso. “A ansiedade já faz você ver barrigas de grávida em todo lugar e nessa época fica ainda mais difícil”, relata. Por causa de aderências causadas por uma cirurgia de apendicite e uma endometriose, ela e o marido, Luciano, tiveram que recorrer à reprodução assistida.

Foram sete tentativas frustradas. Além do desgaste físico, emocional e financeiro gerado pelos tratamentos, a cada exame negativo o casal enfrentava um verdadeiro luto. “Muitas amigas partiram para a adoção depois de duas ou três tentativas, por não aguentarem o processo, mas eu nunca desisti”, diz. A irmã chegou a emprestar o útero em uma das fertilizações, sem êxito. Com ajuda de empréstimos e de acompanhamento psicológico especializado, o casal seguia em frente.

No caso de Sandra e Luciano, a persistência valeu a pena: a gravidez ocorreu na oitava tentativa. Feliz da vida, a nova mamãe vai passar este domingo (9) em casa, com a filha Ariadne, ambas recém-chegadas da Maternidade São Luís, em São Paulo. “É uma paz, uma alegria que não dá para explicar”, comemora, com a voz embargada.

Histórias como a de Sandra servem de estímulo para as milhares de mulheres que procuram clínicas de reprodução assistida todos os anos – de 12% a 20% dos casais brasileiros têm dificuldade para ter filhos. Mas reforçam a noção de que, embora as técnicas tenham evoluído muito, o sucesso nem sempre ocorre nas primeiras tentativas e a adoção não deve ser descartada.

Emoções

Controlar a ansiedade para ter um filho não é fácil, especialmente quando é preciso fazer relações sexuais com hora marcada, tomar hormônios e discutir questões como o que fazer com embriões que não foram implantados. Tanto que todo especialista em reprodução humana conhece algum caso em que os casal faz várias tentativas, desiste e a mulher acaba engravidando naturalmente após adotar uma criança.

O primeiro passo, segundo especialistas, é saber dosar as expectativas em relação ao tratamento. A psicóloga Rose Marie Melamed, da clínica Fertility, acredita que o fato de muita gente admitir, na mídia, que teve um filho graças à reprodução assistida tem feito o assunto deixar de ser tabu. Porém, ela observa que nem sempre as pessoas contam como foi todo o processo, o que gera uma falsa impressão de que o resultado é rápido. “Quando não dá certo, o casal chega a sentir vergonha porque não conseguiu engravidar ‘nem com tratamento’”, comenta.

Expectativas

A psicóloga coordenou uma pesquisa com 299 casais atendidos na clínica, entre 2003 e 2003, sobre as expectativas em relação à fertilização assistida. Mesmo depois de exaustivamente informados pela equipe sobre a probabilidade de engravidar com o procedimento – que em geral é de aproximadamente 30% na primeira tentativa, a maioria dos casais (58%) afirmava esperar 100% de sucesso logo de cara.

A ansiedade e a depressão podem interferir nas chances de engravidar, pois dificultam a aderência ao tratamento e à meta de cuidar bem do próprio corpo para gerar um filho saudável. O ginecologista e obstetra José Bento de Souza, que atua nos hospitais Albert Einstein e São Luís, explica que o estresse aumenta o nível de cortisol, o que interfere na reação do organismo à insulina. “A pessoa come mais, engorda e isso altera a quantidade de hormônio”, descreve.

Lição de casa

O médico, que acaba de lançar o livro “Engravidar – Sim, é possível” (Ed. Alaúde, com apoio da Bayer Schering Pharma) lembra que os casais precisam saber que não existe um remédio mágico para ter logo um filho. Afinal, mesmo sem qualquer problema as chances são de apenas 20%. “É preciso fazer a lição de casa, o que inclui mudar hábitos, praticar atividade física, cuidar da alimentação, deixar de fumar e beber e, eventualmente, procurar ajuda psicológica”, aconselha.

Cuidar do relacionamento com o parceiro também é fundamental durante o processo, já que o tratamento pode interferir na vida sexual. “Alguns casais começam a ter relações apenas para procriar”, ilustra. Nessas horas, é preciso retomar as carícias e a espontaneidade.

Sobre a vida a dois, o ginecologista e especialista em reprodução assistida Marcelo Afonso Gonçalves, do Laboratório Femme, em São Paulo, também chama a atenção para outro aspecto que pode colocar o relacionamento em risco: “É preciso tomar cuidado para não cair na tentação de culpar o parceiro, ou se culpar, pois a infertilidade não é um problema da pessoa, mas do casal”.

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