Néstor Marín
Nova Delhi (PL) – A Índia está a ponto de se converter no primeiro país do mundo onde as mulheres terão garantido, por lei, um terço dos assentos em todos os órgãos legislativos do país.
O projeto de lei conseguiu vencer um primeiro obstáculo em princípios de março, ao obter a aprovação do Senado (Rajya Sabha), e, embora ainda deva ser aprovado pela Lok Sabha ou Câmara baixa, seus defensores já cantam vitória.
E não é para menos, pois para eles se trata de um marco na história de uma sociedade secularmente machista, como o demonstram os 14 anos que demorou a proposta para abrir passo no emaranhado legislativo, antes de chegar a ser submetida a votação.
Ainda que desta vez também houve polêmicas, discussões acaloradas e até rinhas na Câmara alta, no final se impuseram os dotes negociadores da presidenta do governante Partido do Congresso, Sonia Gandhi.
A viúva do assassinado primeiro-ministro Rajiv Ghandi se conta entre as poucas mulheres que ocupam altos cargos políticos na Índia, onde as fêmeas representam a metade dos cerca de 1 bilhão 200 milhões de habitantes do país, e 40% de seus eleitores.
Além de Sonia, a curta lista inclui a presidenta Pratibha Patil e a líder da Câmara baixa, Meira Kumar, enquanto que em nível estadual se destaca a chefa de governo do estado de Uttar Pradesh, Kumari Mayawati.
A precursora de todas elas foi Indira Gandhi, primeira e única mulher a ocupar o posto de primeiro-ministro na Índia, e não uma, mas duas vezes (1966-1977 e 1980-1984).
Só 58 dos 545 assentos da Câmara baixa, e 21 dos 250 da Rajya Sabha são ocupados hoje em dia por mulheres, o que vem a corroborar a discriminação política sofrida pelo mal chamado sexo frágil no país sul-asiático.
Em nivel social, a desigualdade é galopante, como admitiu o primeiro-ministro Manmohan Singh no calor dos debates sobre o projeto de lei de quotas parlamentares.
Segundo o chefe de governo, ainda resta muito a fazer num país onde o índice de mortalidade materna é extremamente alto como resultado do pobre acesso que têm as grávidas aos serviços de saúde.
Cifras manejadas por organismos internacionais falam inclusive de 300 mortes maternas por cada 100 mil nascimentos vivos.
O analfabetismo feminino é 20% maior, comparado com o dos homens, enquanto que na esfera laboral a participação da mulher é de tão só 25%, acrescentou.
É por isso que para Singh, a recente votação na Câmara alta representou um passo histórico para a emancipação das mulheres indias.
A senadora pelo Partido Comunista (marxista) da Índia Brinda Karat considera, por sua parte, que a reserva de quotas parlamentares contribuirá para mudar a cultura de um país onde as mulheres, disse, são prisioneiras da cultura.
Em nome da tradição, se nos impõem estereótipos contra os quais devemos lutar todos os dias, afirmou a parlamentar.
Quiçá sem querer ser a nota discordante, mas, sim, mais pragmática, a melhor conclusão a oferece a escritora Rupa Gulab, para quem um assento no Parlamento não necessariamente outorga mais poder à mulher, algo que em contrapartida, sim, se logra, salienta, com um maior acesso à educação.
Néstor Marín é correspondente de Prensa Latina na Índia.
fonte: Fundação Lauro Campos