Wangari Maathai*
Nairóbi, abril/2010 – Enquanto a normalização das relações diplomáticas entre Chade e Sudão, a assinatura do cessar-fogo e o contexto para as negociações de paz entre o governo de Cartum e um dos grupos rebeldes, o Movimento pela Justiça e a Igualdade (JEM), são anunciados como passos de importância vital para a paz em Darfur, na realidade existe um longo caminho até resolver a crise nesta região.
Há razões para ser cético quanto ao sucesso de um acordo de paz integral. O conflito em Darfur persiste há sete anos, com várias tentativas inúteis de alcançar a paz. Muitos analistas disseram que o Acordo de Paz de Darfur (DPA) de 2006, assinado pelo governo e apenas uma facção rebelde, estava morto mesmo antes de ser alcançado.
Sob a liderança de Djibril Bassolé, ex-ministro de Relações Exteriores de Burkina Fasso, as conversações concluídas recentemente em Doha procuraram remediar os erros do DPA e evitar outro fracasso, concretamente assegurando que o processo seja inclusivo e consultivo, em lugar de focá-lo em simples assinaturas de documentos em um contexto temporal reduzido. Porém, faltou uma peça indispensável, a participação das mulheres sudanesas neste processo.
Frequentemente, as mulheres são excluídas das negociações formais de paz. De modo alarmante, um estudo de 2009 do Fundo de Desenvolvimento para as Mulheres das Nações Unidas (Unifem) comprovou que menos de 3% dos signatários de acordos de paz desde 1992 são mulheres. O papel positivo que elas podem ter nos processos de paz na África é bem documentado, de Ruanda a Libéria e Uganda. Na Somália e em outros países as mulheres foram a única parte capaz de transmitir mensagens diplomáticas entre as facções em guerra. Em Uganda, a participação feminina levou à uma inclusão mais ampla das questões de educação e saúde nas negociações sobre desarmamento, desmobilização e reabilitação, uma área tradicionalmente vista como apenas masculina.
As mulheres trabalharam duramente nas instâncias laterais do processo de paz de Doha. Participaram do fórum da sociedade civil nos esforços de apoio no Sudão e no exterior, bem como na diáspora. Um grupo de sudanesas se organizou na diáspora para colaborar nas negociações a fim de apoiar suas irmãs. Embora não tenham sido convidadas para as negociações, elas se reuniram com Bassolé e com as facções rebeldes para chamar a atenção sobre a falta de representação feminina no processo e para estender pontes entre os grupos em enfrentamento.
À luz dos compromissos internacionais assumidos sob a Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a não participação feminina é uma séria omissão no processo de paz no Sudão.
Para as futuras negociações deveria haver um plano para garantir que a sociedade civil, incluindo as mulheres, tenha um papel mais direto. A paz não pode ser alcançada reunindo apenas as partes combatentes. Deve ser assegurado que sejam ouvidas as vozes do povo. Até agora, o governo sudanês e os grupos rebeldes de Darfur bloqueiam as tentativas para incluir a sociedade civil no processo.
Essa inclusão deve ser apoiada por todos os atores internacionais, incluindo Estados Unidos, União Europeia e Rússia. Uma visão compartilhada sobre a participação das mulheres nos processos de paz é um enfoque que foi apoiado pela União Africana e no informe do Painel de Alto Nível sobre Darfur, liderado pelo ex-presidente da África do Sul, Thabo Mbeki. Há pressão para que seja selado um acordo antes das eleições do próximo mês, o que é criticamente importante para Darfur. Contudo, fazer com que o processo seja inclusivo e integral é mais importante. Este é o momento para assegurar que a maioria da população do Sudão, as mulheres, tenham voz no desenho de seu próprio futuro. IPS/Envolverde
(*) Wangari Maathai, Prêmio Nobel da Paz 2004, é fundadora do Green Belt Movemensitet Initiative (www.greenbeltmovement.org) e cofundadora do Nobel Women’s Initiative (www.nobelwomeninitiative.org).
(IPS/Envolverde)