Rogéria Araújo *
Adital – As mulheres, os movimentos feministas, em geral, têm presença marcante no Fórum Social Mundial 10 anos, que está sendo realizado na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, no Brasil. Essa participação é resultado de muito protagonismo e diálogo em defesa da diversidade. A avaliação é de Lilián Celiberti, integrante da Articulação Feminista Mercosul, do Uruguai, que participa do evento.
Segundo a ativista feminista, os desafios que se propõem aos movimentos feministas só levam à conquista de mais espaços de afirmações de seus direitos. Celiberti destaca que a participação e o reconhecimento das demandas feministas aumentaram de Forum em Forum.
No entanto, a luta contra os fundamentalismos continua e representa ainda um dos principais desafios das mulheres organizadas. “Na realidade, as restrições fundamentalistas fazem parte de uma cultura de intolerância. Esse é um eixo que atravessa nossas ações”, afirmou em entrevista a ADITAL.
Adital – Como você avalia a articulação feminista nesse processo dos 10 anos do Forum Social Mundial?
Lilián Celiberti – Creio que houve crescimento significativo da presença e da visibilidade feminista porque as mulheres têm estado e estão sempre nos movimentos sociais. O que acontece é que quando são organizados esses tipos de eventos que têm painéis, debates, em geral, não são muito igualitários. Em princípio, nós tínhamos uma crítica muito forte em relação à presença e à participação de mulheres, sobretudo em temas de economia, de paz. Isso teve uma presença mais forte, que foi variando de Forum em Forum. Na Índia, por exemplo, o movimento de mulheres teve uma participação muito significativa e isso é evidente também nas temáticas.
Creio que, nesses dez anos, mudou muito. Mais, ainda faltam alguns outros pontos, nem tanto no Forum, mas no Forum como expressão do que é a realidade dos movimentos sociais, onde é notória a predominância masculina nas lideranças, com práticas que, de alguma maneira, levam às mulheres a buscarem seus próprios espaços, organizações para desenvolverem-se, crescerem, para atuar, para serem vistas. Então, creio que nesses dez anos mostrou-se essa disputa, essa luta, mas também que as temáticas feministas estão mais legitimadas e reconhecidas no conjunto de movimentos. Creio que isso seja produto do diálogo, do conhecimento, de romper estereótipos.
Adital – Nesse processo de globalização, como você vê a assimilação das demandas feministas na sociedade, fora de espaços como o FSM?
Lilián Celiberti – Há muitos desafios. É difícil responder uma coisa que é ampla. Nós temos um eixo como articulação que tem a ver com a luta contra os fundamentalismos. O pensamento fundamentalista é aquele que exclui, que parte da base daquilo que possui uma verdade única e que está colocado em várias correntes. Em geral, se pensa no fundamentalismo islâmico. Nós pensamos que há um fundamentalismo católico, laico…Na realidade, as restrições fundamentalistas fazem parte de uma cultura de intolerância. Esse é um eixo que atravessa nossas ações.
Outro ponto está nos direitos das mulheres migrantes. Parece-nos que é a expressão de um momento capitalista muito singular. As pessoas, seja por razões ambientais, econômicas ou culturais, têm o direito de deslocarem-se de seu país para outro. Entretanto, são desprotegidas totalmente, carentes de seus direitos. Esse ponto é importante para mostrar a diversidade e a desigualdade entre as mulheres.
Há muitos terrenos, em outros grandes eixos da luta feminista, como a liberdade de decidir, levar em conta o direito sexual e reprodutivo. Nesse sentido, pensamos que há uma radicalização nessa proposta, consideramos que, nós mulheres, somos adultas para decidir sobre nossa capacidade de reproduzir. Não precisamos do Estado, da Igreja, nem dos homens para dizer quantos filhos queremos ter. Além disso, socialmente somos quem cuidamos. É sobre isso que vou falar no painel.
Adital – Como funciona a Articulação Feminista Mercosul? Quais são seus objetivos?
Lilián Celiberti – Nós somos uma articulação que congrega organizações que atuam em âmbito nacional na Argentina, no Peru, na Bolívia, no Paraguai, na Colômbia, no Brasil e no Uruguai. É um espaço, uma rede de projetos, uma rede de ações políticas. Cada uma atua em seu país com sua iniciativa, com suas propostas. Mas temos uma conjunção para atuar em nível regional e global – como no Fórum – como uma corrente política feminista.
Temos equipes de trabalho e buscamos conectar o local com o global, que é sempre um desafio muito grande, sobretudo porque são iniciativas regionais que necessitam de recursos. Nem sempre temos dinheiro para juntarmo-nos fisicamente. É um processo de construção.
fonte: http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=44578