Mulheres, vítimas na guerra e sem voz na paz

Por Suzanne Hoeksema, da IPS

Nações Unidas, 02/10/2009 – A Organização das Nações Unidas deve dar mais espaço às mulheres nos esforços de paz mundiais para, entre outras coisas, combater mais efetivamente a violência sexual em zonas de conflito, afirmaram ativistas. O Conselho de Segurança da ONU cobrou do secretário-geral, Ban Ki-moon, a designação de um representante especial para o problema dos sistemáticos ataques sexuais contra mulheres, meninos e meninas em situações de conflito.

Ao falar como atual presidente do Conselho, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, destacou que “a natureza desumana da violência não prejudica apenas um indivíduo ou somente uma família, uma só aldeia ou a apenas um grupo: destrói o que nos faz sermos seres humanos, coloca em risco as famílias e comunidades, corrói a estabilidade política e social e afeta o progresso econômico”.

A resolução para criar o novo cargo foi aprovada na quarta-feira e promovida por mais de 60 países, incluindo Bósnia, Croácia e Ruanda, onde a violação é usada de forma sistemática como arma de guerra. O representante especial deverá supervisionar a implementação de duas resoluções do Conselho de Segurança. Uma é a 1.325, aprovada em 2000, que exorta todas as partes em conflito a “respeitarem os direitos das mulheres e aumentarem sua participação em negociações de paz e processos de reconstrução pós-conflito”. A outra é a 1.820, aprovada em 2008, que “reafirma os objetivos estabelecidos na 1.325”.

O informe da Secretaria Geral sobre “Mulheres, paz e segurança”, apresentado esta semana, conclui que, apesar dos esforços para promover as duas resoluções – com exemplos positivos provenientes de Libéria e Ruanda – “o progresso em sua implementação está limitado e os conflitos armados continuam tendo um impacto devastador nas mulheres e adolescentes”. Uma preocupação particular é a gravidade e brutalidade dos crimes sexuais cometidos em Kivu do Norte e Kivu do Sul, províncias orientais da República Democrática do Congo (RDC) nas quais são denunciadas 1.100 violações por mês, com média diária de 36 casos. Mais de 10% são cometidos contra meninas de 10 anos ou menos.

A violência sexual agravou-se desde janeiro em áreas controladas tanto pelas insurgentes Forças Democráticas de Libertação de Ruanda quanto pelo ugandense Exercito de Resistência do Senhor, bem como nas zonas para onde foi enviado recentemente o exercito do congolês. Enquanto a RDC e a região sudanesa de Darfur talvez sejam os exemplos mais amplamente conhecidos, a violação também é uma tática de guerra usada na Bósnia, Birmânia, Burundi, Chade, Costa do Marfim, Ruanda, Serra Leoa, Sri Lanka e Timo Leste. “Em muitos países e em muitos casos, os responsáveis por essa violência não são castigados, e esta impunidade promove mais taques”, acrescentou Clinton.

Apesar de serem as principais vitimas e mesmo assim estarem quase sempre ausentes das mesas de negociações de paz, as mulheres lideram com sucesso movimentos de base em comunidades afetadas pela violência, desde Guatemala até a Irlanda do Norte. O Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) disse que as mulheres estão há muito tempo marginalizadas de postos de mediação e das delegações da ONU em países afetados por conflitos. Por exemplo, um grupo de mulheres ativistas do leste da RDC que procuravam participar das conversações de paz foi excluído do processo, denuncio o Unifem.

Desde a doação da resolução 1.325, grupos da sociedade civil criticam repetidamente o Conselho de Segurança e a administração da ONU por não agirem decisivamente para proteger as mulheres da violação sexual e por não implementaram mandatos de manutenção da paz que levem em conta a problemática desta população. Também afirmam que as Nações Unidas não dão lugar às mulheres nas negociações de paz. Há muito tempo, organizações internacionais da sociedade civil pedem a criação de um alto posto dentro da ONU para atender estas demandas.

“Enquanto as Nações Unidas gasta anos debatendo, milhares de adolescentes e mulheres em todo o mundo sofrem por terem suas vidas e seus corpos arruinados”, disse a ativista Marianne Mollman, da organização Human Rights Watch. A implementação das antigas resoluções não foi apenas lenta, mas inadequada, afirmam os ativistas. A resposta “tem sido circunstancial e ineficaz, apesar da crescente preocupação e dos cada vez maiores fundos destinados aos programas contra a violência sexual”, afirmou, por sua vez, Melanie Teff, da organização Refugees International.

O proposto representante especial deveria começar seu trabalho com a implementação das resoluções do Conselho de Segurança no terreno, porque as missões de paz carecem de conhecimento, capacidade e confiança sobre como tratar a violência sexual de forma adequada e sensível, dizem os ativistas. Se a ONU liderar com o exemplo, os Estados-membros poderão demonstrar mais disposição, afirmou Mollmann. Teff também sustentou que o novo representante “deve enviar rapidamente equipes de especialistas em situações de particular preocupação e garantir que estes obtenham o apoio necessário para desenvolver seu trabalho”. IPS/Envolverde

(Envolverde/IPS)

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