Erundina consegue recursos para pagar condenação

Agência Estado

Erundina foi acusada por usar dinheiro público para financiar publicações em apoio à greve geral de 1989, e não cabe mais recurso da decisão. Ela recebeu apoio de simpatizantes, militantes sociais e políticos que organizaram jantares para arrecadar dinheiro


Agência Brasil A deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) conseguiu os R$ 352 mil necessários para pagar uma dívida com a Justiça, resultado de um processo aberto quando ainda era prefeita de São Paulo. Sem recursos para quitar o débito, a parlamentar recebeu apoio de políticos de todo o espectro partidário, da situação à oposição ao governo federal, que organizaram vários jantares para arrecadação de dinheiro. A causa também recebeu apoio da população, que depositou de R$ 2 a R$ 20 mil na conta aberta para ajudar a deputada.

– Recebemos hoje a confirmação de que atingimos o valor para pagar a dívida. Na verdade, os recursos ultrapassaram o montante necessário.

Os cerca de R$ 7 mil restantes irão para uma instituição de caridade, que ainda será escolhida por ela e amigos que ajudaram na campanha.

Erundina já autorizou a transferência do dinheiro para a respectiva conta da Justiça, mas seus bens só serão desbloqueados depois que o Judiciário voltar do recesso, em fevereiro. Foram interditados o apartamento em que ela vive em São Paulo, cujo valor é de cerca de R$ 100 mil, e dois carros. Além disso, desde abril deste ano, 10% da remuneração da parlamentar passou a ser recolhida automaticamente pela Justiça.

As maiores doações foram obtidas por meio de jantares organizados por parlamentares e amigos, segundo a deputada. O primeiro, realizado por amigos, rendeu R$ 30 mil. Outro, organizado pelos deputados estaduais tucanos Bruno Covas e Milton Flávio, ambos de São Paulo, apurou outros R$ 30 mil. Em João Pessoa (PB), um jantar organizado por seu partido, o PSB, juntou R$ 60 mil. Em Brasília, evento realizado por movimentos sociais rendeu R$ 20 mil. Mais R$ 50 mil foram apurados em jantar oferecido pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) e o PT de São Paulo.

Campanha

A deputada contou que no período da campanha pela arrecadação de recursos recebeu centenas de mensagens de apoio das mais variadas pessoas, inclusive de adversários políticos, que pretende publicar, talvez na internet.

– Estou muito emocionada com o apoio, com a pluralidade das pessoas que ajudaram.

A decisão judicial que condenou a deputada a pagar R$ 352 mil foi resultado de ação popular movida quando Erundina era prefeita pelo PT e veiculou anúncios em jornais em apoio à greve geral de 1989. A ação pedia a reposição aos cofres públicos do dinheiro utilizado pela prefeitura nas propagandas. A Justiça entendeu que os anúncios não atendiam ao interesse público.

Condenada em última instância pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2003, Erundina só teve seus bens penhorados no fim de 2008. Para a deputada, houve perseguição política na ação. Ela argumenta que os anúncios pelos quais foi condenada eram necessários para informar a população que serviços essenciais, como o transporte público, não estavam funcionando a contento.

Nas peças, a ex-prefeita também se posicionava a favor do movimento grevista.

Foto por Agência Brasil

Agradecimento por uma ação coletiva de solidariedade política

por Luiza Erundina

Fim de ano é tempo propício à reflexão sobre o que passou, sobre o caminho percorrido e as perspectivas para o futuro.

Entre os acontecimentos que marcaram o ano de 2009, destacaria um fato inusitado, de profundo significado político, que nos surpreendeu a todas e todos, sugerindo que algo novo e transformador começa a despontar na sociedade brasileira, relacionado à política. Refiro-me ao extraordinário e espontâneo movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas pelo país afora que, movidas por forte sentimento de justiça, se mobilizaram para reparar uma injustiça de que eu fui vítima. É incompreensível que exatamente quem sempre se comportou, como era do meu dever, de forma ética e absolutamente fiel aos meus compromissos com a população, esteja sendo punida com tanto rigor.

Suponho que, além do sentimento de justiça, um outro teria motivado tão amplo e plural movimento de solidariedade, que seria o de indignação diante de um fato insólito na história política brasileira, ou seja, minha condenação, pelo Poder Judiciário, a pagar uma dívida à Prefeitura de São Paulo de mais de R$350 mil reais, correspondentes ao valor reajustado, ao longo de vinte anos, da publicação, em alguns jornais, de uma nota informando à população sobre a posição do governo a respeito da greve geral dos trabalhadores, ocorrida em março de 1989.

Foi uma decisão de um governo eleito pelas e pelos trabalhadores e que tinha compromissos claros com eles e com os setores populares da sociedade.

Além disso, na época vivia-se uma conjuntura caracterizada por desemprego, arrocho salarial e inflação superior a 80%, exigindo, portanto, posicionamento claro a respeito de que lado se estava. Se do lado do governo federal, cuja política econômica impunha enormes sacrifícios aos trabalhadores, ou do lado destes, apoiando suas justas e legítimas reivindicações. E o nosso Governo optou por esta posição, pois tinha lado. Não era neutro, até porque a neutralidade não existe, pois ela sempre serve ao interesse de um dos lados em disputa.

Tenho refletido e procurado julgar a mim mesma sobre aquela decisão e cheguei à conclusão de que era exatamente a que deveríamos tomar. E mais do que isso estou convencida de que, em situação semelhante, assumiríamos a mesma posição, fossem quais fossem os riscos que tivéssemos que correr.

Aquela condenação provocou, como se viu, perplexidade e indignação em muita gente, resultando em um movimento de solidariedade política que envolveu milhares de pessoas, grupos, organizações populares, empresários, lideranças sindicais, parlamentares, dirigentes e militantes dos mais diversos partidos políticos; lideranças religiosas e de movimentos sociais e tantos outros que de forma anônima materializaram seu apoio depositando na “Conta:Luiza, apóio você” importâncias de dois, cinco, vinte, cinqüenta ou até valores de milhares de reais, o que possibilitou o “milagre” que só a solidariedade generosa e desinteressada é capaz de operar. O fato é que hoje, 4 de janeiro de 2010, já dispomos do montante suficiente para saldar essa dívida que a justiça me impôs.

Como explicar tão surpreendente reação? Senso de justiça? Afirmação e valorização da ética na política? Que lição tirar de tudo isso?

Gestos de tamanha generosidade e solidariedade, não só me comovem, profundamente, como também me dão a certeza de que a política é mais do que a organização de pessoas em torno de um projeto de poder que disputa com outros projetos de poder, mas, a política é também ação coletiva de sujeitos livres que, juntos, constroem a cidade de todas e todos, como espaço de convivência fraterna e democrática.

Finalmente, desejo expressar minha profunda gratidão a todas e todos que, de forma anônima e generosa, e muitos até com sacrifício, me ajudaram a sair da situação constrangedora em que me encontrava.

Com os meus cumprimentos de fim de ano, formulo votos para que 2010 seja pleno de paz e de grandes realizações.

Com abraços afetuosos.

Luiza Erundina

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