Pescadoras, trabalhadoras domésticas, camponesas, donas de casa e ativistas feministas de várias regiões do País reuniram-se nos dias 1 e 2 de dezembro, em Brasília, para o Fórum Itinerante das Mulheres em Defesa da Seguridade Social (FIPSS). O Fórum tem como objetivo a articulação entre movimentos de trabalhadoras do campo e da cidade na busca por direitos que garantam a proteção social, problematizando a informalidade entre as mulheres.
A importância do FIPPS é ressaltada pelas trabalhadoras que ganharam força na luta e na incidência política. Assim diz Cleusa Aparecida da Silva, da Articulação de Organizações de Mulheres Negras, que afirma que o FIPSS não é só um espaço de articulação política. Para além disso, ele seria o melhor produto criado ao longo desses 15 anos, pois congrega mulheres do campo e da cidade, com uma diversidade grande de movimentos sociais. É um espaço que propicia não só o fortalecimento das organizações como o intercâmbio e a ampliação do conhecimento, a vivência e experiência e isso melhora nossa incidência pública no Executivo, Legislativo e Judiciário.
A questão da desproteção do trabalho é o “calcanhar de Aquilis” do FIPSS, pois é grande o contingente de mulheres, sobretudo mulheres negras e indígenas, que estão desprovidas de qualquer direito previdenciário. Para Cleusa devemos fazer um esforço sobre-humano em dialogar com os Poderes e formular uma política pública que inclua essas mulheres no sistema. “Precisamos de um sistema universal, público e solidário – esse é o eixo central da nossa luta. Se conseguirmos avançar neste aspecto, vamos melhorar a vida dessas mulheres que vivem na informalidade”.
Eleutéria Amora da Silvia, da Casa da Mulher Trabalhadora do Rio de Janeiro, vê a informalidade de uma forma difícil para as mulheres que trabalham desde que nascem até morrer. “A informalidade perpassa a vida das mulheres, e no Rio de Janeiro a situação é de vulnerabilidade para as mulheres que estão na rua vendendo o que produzem ou o que compram sem nenhuma possibilidade de ter acesso aos benefícios da Previdência Social. As mulheres estão fora de qualquer direito trabalhista nesse País”, afirma.
Maria Eliene, da Articulação de Mulheres Pescadoras (AMP), diz que é muito difícil viver na informalidade e não ter o reconhecimento como mulher pescadora. Ela explica ainda que dentro da informalidade existe a burocracia do INSS que não respeita a mulher como pescadora. “Sempre que precisamos de um auxilio a doença não temos esse direito, e pagamos a colônia de pescadores e quando precisamos não temos o direito”, conta. Maria das Graças, da Associação das Donas de Casa e da campanha da aposentadoria das Donas de Casa, acredita que houve um avanço no reconhecimento da função, mas as reivindicações deixam a desejar. A dona de casa fala da necessidade de enfrentamento com os/as parlamentares para conseguir avanços, pois segundo ela é a categoria que tem menos avanços.
O governo também não dá assistência a essas mulheres quando o assunto é informalidade. Para Maria Eliene da AMP o governo também não tem muita disposição com os projetos que estão sendo apresentados no Legislativo. “Os parlamentares quando recebem a gente falam que vão fazer e acontecer e quando damos as costas eles engavetam as nossas sugestões”, afirma. Marta Geani, do Fórum de Mulheres da Amazônia-Paraense e da Articulação de Mulheres Brasileiras afirma que a situação das mulheres no mundo do trabalho informal é extremante cruel e só a mulher que passa por essa falta de benefício sabe da dificuldade que vive. E quando o assunto é a disposição do governo com relação a essas trabalhadoras, Marta diz que houve uma desmobilização do movimento social no governo Lula. Para ela, falta pressão para que o governo tenha mais disposição na hora de aprovar os projetos no Legislativo.
A categoria das trabalhadoras domésticas já conseguiu alguns avanços, mas a bandeira de luta da classe é pela equiparação de direitos. Maria Regina Semião, da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas – FENATRAD, conta que o Fundo de Garantia (FGTS) e auxílio-desemprego são exemplos de reivindicações das Trabalhadoras domésticas que ainda necessita de muita luta. Os parlamentares não olham o projeto com “o carinho” que precisamos, por isso a incidência no Congresso é importante”.
O fim do fator previdenciário é outra bandeira dessas mulheres. Portanto, as resistências ao Projeto de Lei que tramita no Congresso propondo o fim do fator, bem como as emendas ao mesmo, é um problema para as mulheres trabalhadoras. A proposta de uma nova fórmula que vem ganhando força política no Congresso (a chamada 85/95) é menos agressiva que a atual, mas não atende às demandas dos movimentos de colocar um fim ao fator previdenciário. Segundo Cleusa a preocupação é grande é ao saber que a proposta que acabamos de tomar conhecimento não é a mesma da qual reivindicamos – o fim do fator previdenciário. “A proposta faz um desenho que não afeta tanto a vida das mulheres, mas eles insistem ainda na ampliação da idade para a aposentadoria. Ele acaba sendo uma ‘faca de dois gumes’, e isso vai acabar sendo aprovado, mas temos que continuar lutando para que ele seja de fato eliminado”, conclui.
O Fórum Itinerante das Mulheres em Defesa da Seguridade Social trabalha para garantir melhores condições na vida das mulheres trabalhadoras. A incidência política no Congresso Nacional e no Executivo a partir da articulação dos movimentos de mulheres trabalhadoras do campo e da cidade, bem como sua movimentação e discussões itinerantes em diversos estados é um fator condicionante para que a ação do Fórum tenha bons resultados.
Veja a carta aberta do movimentos de mulheres em defesa da seguidade social pela proteção social ao trabalho das mulheres!
Nós, dos movimentos de mulheres trabalhadoras do campo e da cidade articulados no Fórum Itinerante das Mulheres pela Seguridade Social, tornamos público e reafirmamos nosso posicionamento em defesa dos direitos sociais e da política de Seguridade Social pública, universal, solidária e redistributiva.
Historicamente, o movimento de mulheres está em luta permanente em defesa da proteção social ao trabalho das mulheres, da população negra e dos segmentos hoje inseridos nos setores mais precários do mundo do trabalho e totalmente submetidos à mais absoluta desproteção social!
Temos denunciado desde o início o modelo neoliberal de Estado máximo para o capital e mínimo para os direitos sociais. Seguimos mobilizadas contra as políticas neoliberais que ameaçam os direitos sociais, aprofundam as desigualdades, ampliam a desproteção social e aprofundam a exploração do trabalho das mulheres. O modelo de privatização dos direitos sociais mundialmente se mostrou ineficaz na garantia dos direitos e acentuou as desigualdades sociais.
Seguimos mobilizadas contra a privatização, mercantilização e precarização da saúde e na defesa do sistema universal de saúde pública e de qualidade; defendemos o direito à assistência social para todas(os) que dele necessita, conforme estabelece a Constituição Cidadã de 1988. Lutamos por um sistema previdenciário universal, que garanta direitos e proteção social a todas as pessoas que trabalham, na pr
odução e na reprodução social, dentro e fora de casa.
Defendemos o reconhecimento do trabalho doméstico não-remunerado como trabalho e para fins de acesso à proteção social como uma questão de justiça para as mulheres que durante a vida inteira cuidaram de suas famílias e envelheceram sem direitos!
Seguimos em defesa do acesso e da garantia do direito à previdência social a todas as trabalhadoras rurais, camponesas, pescadoras, extrativistas e outras. O direito à aposentadoria, salário-maternidade, auxílio reclusão, auxílio acidente de trabalho, pensão para viúvas/os para as trabalhadoras e trabalhadores rurais, em condição de Seguradas/os Especiais, é uma das grandes conquistas das mulheres na Constituição de 1988 e uma das principais políticas de redistribuição de renda do país.
Lutamos pelo direito à proteção social para todas as trabalhadoras informais urbanas e rurais por meio de sistema especial de inclusão previdenciária.
Rechaçamos os projetos de lei e medidas de retração nos direitos das trabalhadoras domésticas! Exigimos que os/as parlamentares brasileiros/as atuem para a superação da injustiça histórica com as trabalhadoras domésticas e garantam a equiparação de direitos com as demais categorias de trabalhadores/as!
Seguimos em luta contra a política de superávit primário e a Desvinculação de Receitas da União – DRU que ano após ano retira bilhões do orçamento da Seguridade Social para o orçamento fiscal, ferindo os princípios constitucionais. Lutamos pela garantia da diversidade de fontes de financiamento da seguridade social, a taxação de grandes fortunas e o fim do fator previdenciário!
Exigimos do Estado Brasileiro uma reforma tributária que enfrente o problema da concentração de renda no País; defendemos que a riqueza gerada no País seja redistribuída por meio de políticas públicas que assegurem os direitos daquelas/es que a produzem!
Defendemos o debate amplo na sociedade sobre os rumos da Política de Seguridade Social no Brasil e o reconhecimento dos movimentos de mulheres como sujeitos políticos desta luta. Não aceitamos mudanças nas políticas de seguridade social sem a participação das mulheres!
Nós, dos movimentos de mulheres, seguimos na defesa de um Estado democrático, que assegure direitos, enfrente as desigualdades geradas pelo sistema patriarcal, pelo racismo e pela economia capitalista.
Defendemos o Sistema de Seguridade Social – a política de Saúde, Previdência e Assistência Social – como política integrada e ampla, que garanta o direito à proteção social para toda a classe trabalhadora do campo, da cidade e das florestas, e todas as mulheres!
Convocamos o poder executivo, parlamentares, movimentos sociais e setores organizados da sociedade a somar-se a nós em defesa da proteção social ao trabalho das mulheres e da política de Seguridade Social universal, pública, solidária e redistributiva!
Brasília, 02 de dezembro de 2009
Fórum Itinerante das Mulheres pela Seguridade Social:
Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB
Articulação de Mulheres Negras Brasileiras
Articulação Nacional de Pescadoras
Campanha Nacional pela Aposentadoria das Donas de Casa
Associação de Donas de Casa do Estado de Goiás
Federação das Donas de Casa do Estado da Bahia
Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas
Marcha Mundial de Mulheres
Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu
Movimento de Mulheres Camponesas
Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste
Catadoras de Material Reciclável (Ceará) e Trabalhadoras Ambulantes (Campinas-SP)
fonte: CFEMEA